ENGOLINDO EM SECO

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MARÍLIA

Passei por Maraísa assim que entramos na mesma sala que Julia me levou mais cedo, e ela ficou um pouco mais atrás enquanto fechava a porta.

A olhei vasculhar uma bolsa Chanel, onde de dentro ela retirou um aparelho telefônico e uma pequena pasta. Se aproximou de mim em passos curtos e notei que seu olhar se tornou severo, mas no fundo havia um pouco de desconforto.

-Confesso que demorei um pouco pra fazer isso... - ela disse paciente.

Me mantive em silêncio e estática, ela colocou os objetos sobre a mesa e evitou me olhar nos olhos.

-O que foi? - questionei baixo me aproximando dela outra vez.

-Henrique fez o que pedi a um mês atrás. Você esta livre. - ela disse atenciosa, ainda evitando me olhar. - O aparelho telefônico é descartável então eu recomendo que o use apenas uma vez. Tem o contato da sua mãe... na pasta estão seus documentos necessários e... uma quantia em dinheiro, pra caso queira ir embora.

Ela me analisou enquanto eu observava tudo sobre a mesa.

-Caso eu "queira" ir embora?

Ela suspirou pesado, assentindo. A observei engolir em seco, seu maxilar travar e ela ficar aparentemente impaciente.

-E se eu quiser ir agora? - questionei e a vi fechar os olhos por alguns segundos. -parecia buscar palavras.

-Então... - ela me olhou de relance. - Liga pra sua mãe, e avisa que vai voltar pra casa. Meus homens levarão você ao aeroporto mais próximos e de forma indireta garantirão que esteja bem durante todo o percurso. -Você não pode voltar a Colômbia, ao menos não agora.

Assenti em silêncio, ela queria se aproximar mais relutava em fazer. Me aproximei dos objetos enquanto sentia seu olhar incendiar minha pele com tamanha intensidade.

Busquei a lista de contatos no aparelho telefônico e lá estava apenas um número. "Ruth Mendonça." Maraísa engoliu em seco outra vez e vi ela desviar o olhar, escutei sua respiração um pouco mais pesada. Coloquei em chamada e elevei o aparelho até o ouvido, escutei chamar e aguardei...

LIGAÇÃO ON:

Alô.. - seu timbre doce soou paciente e singelo. - Quem é? - ela questionou ao receber meu silêncio.

- Mãe... -eu disse falho.

Maraísa se afastou um pouco, sentindo os olhos marejarem involuntariamente.

Busquei Maraísa com o olhar e a vi virada de costas para mim, ela caminhou em direção a porta, dando indícios de que sairia e me deixaria a sós.

-Onde você esteve? Esta tudo bem? Liguei pro seu consultório na Colômbia depois de não ter notícias e me disseram que você havia faltado muitos dias, depois avisado por meio de um e-mail que fechassem o local. - ela questionava preocupada.

-Eu viajei... e... - eu disse falha, deixei o orgulho de lado e impedi Maraísa. - Decidi tirar um tempo pra mim.

Com a mão livre segurei sua cintura a trazendo pra mim. Ela me olhou nos olhos e seus lábios rosados se entre abriram enquanto eu notava sua respiração pouco descompassada.

-Senti saudades... - assumi depois do seu silêncio continuo.

-Podia passar um período no Brasil com nossa família. - ela disse paciente. -Você sempre soube que te queremos aqui. Existem oportunidades ótimas, esquece isso de trabalho fora do país.

Maraísa me encarava com atenção enquanto seu rosto estava a poucos centímetros do meu. Eu podia observar cada detalhe da insegurança estampada em seu rosto.

-Não posso mamãe. - eu disse paciente. - Fiz descobertas inigualáveis durante esse período... descobri coisas que eu nunca imaginei sobre mim.

-Como assim, filha? - ela questionou confusa.

-Me apaixonei.. - saiu em um fio de voz e os olhos de Maraísa brilharam. Era a primeira vez que eu confessava isso em voz alta, na sua frente. - Me apaixonei por uma mulher.

Minha mãe ficou em silêncio por alguns minutos.

-Uma... mulher? - questionou desacreditada.

-Uma mulher incrível, mãe. - eu respirei aliviada em poder dizer. - Foi inevitável. Eu não queria dizer assim, mas preciso.

-Como ela é? - minha mãe questionou curiosa e Maraísa se mantinha estática, me analisando.

-Um pouco mais velha, tende a usar preto... - senti a mão de Maraísa tocar meu pescoço fazendo um carinho lento na região. - Tem uma péssima reputação e costuma ter hábitos insaciáveis.

-Marilia...

-Mamãe ela... é linda. - a interrompi. - E acho que já não me importo com o quanto vá dizer que isso aparenta ser perigoso... estar em um lugar desconhecido por você, com uma pessoa nunca vista por você.

-Você é adulta e tenho certeza de que fará boas escolhas. Mas... e quanto a voltar pra casa? -Pode trazer essa moça pra nos conhecer... estamos com saudades, Meu amor.

-Não vou voltar pra casa, não agora. - eu disse convicta e minha mãe compreendeu. - ainda tenho algumas coisas pra resolver e... são minhas prioridades agora. Mas prometo que volto assim que puder, desculpa.

-Está tudo bem, eu entendo. - ela disse paciente e compreensiva.

Minha mãe ficou em silêncio por um tempo.

-Ao menos mantenha contato. - ela mais mandou do que pediu, e eu concordei. - Você sabe... sempre estou ocupada e bem, esse momento é um deles.

(...)

Depois de mais alguns assuntos nos despedimos e ela desligou. A notifiquei de que estava bem e ficaria bem. Maraísa ainda me olhava atenciosa.

Um sorriso lindo surgiu em seus lábios e logo eles se colaram aos meus em um beijo calmo, terno e carinhoso.

Maraísa era minha morte ou meu paraíso?

Nos separamos e ela sorriu outra vez. Notei em seu sorriso o quando doeria se um dia eu a perdesse.

-Nem se eu quisesse, conseguiria ir embora. - afundei o rosto na curva do seu pescoço e ela me abraçou, envolvendo-me em seus braços.

LÁ MARFIA -MALILAOnde histórias criam vida. Descubra agora