16 ANOS

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MARÍLIA

Depois que Maraísa desligou o celular, caminhei até ela e o aparelho me foi entregue. Ela apenas se manteve em silêncio e sua expressão era confortável. Ela disse que precisava falar com as filhas e eu compreendi, um beijo foi deixado em minha testa e em seguida ela saiu do meu campo de visão.

(...)

No seu escritório, sozinha, eu tinha acesso ao que queria. Eu sabia bem pouco sobre seu passado, conhecia apenas o que ela me permitia saber. Maraísa não tinha amigos, seus irmãos costumavam brigar e seu apego maior era Maiara. Foi criada com a ajuda de Henrique após a sentença de morte do pai... e isso era tudo que eu sabia.

Analisando aquele cenário melancólico até mesmo na paleta de cores intercalada nas paredes e nos pequenos detalhes, pude perceber o quanto Maraísa se escondia de si mesma. Era tudo muito suave, contraditório a sua personalidade e formas impulsivas de agir. Suas fotos como em Minnesota já não eram mais visíveis pelas paredes, colocadas em molduras. Era estranho.

Caminhei até a estante de livros no canto direito do cômodo. Dedilhei algumas obras e em uma gaveta encontrei um álbum. Nele havia fotos dela, o que ela parecia esconder...

Na primeira foto ela parecia feliz, ao lado dos pais em um gramado imenso, próximo a um lago... o céu era azul e as nuvens bem superficiais. Seus cabelos castanhos estavam meio bagunçados, aparentemente pela ventania. Os olhos castanhos estavam escuros e suas pequenas mãozinhas abraçavam Marco.

Sentei-me no sofá enquanto analisava as fotos do seu passado oculto. Observei a comemoração do seu aniversário de 15 anos, foi algo bem simples, entre família. Me assustava o fato dela ser sempre bem solitária, e as únicas presenças próximas a si era ambos irmãos.

Mas no fim do álbum, tinha algo que me surpreendeu de maneira dolorosa.

A última foto me relatava o quando aquilo era uma enganação. Uma distorção da realidade de um passado sombrio, seu olhar me demostrava vazio e seu desconforto naquela foto era indescritível. O sorriso já não mais existia, o que tinha ali era apenas uma garota com a adolescência arruinada.

-O que está fazendo? - ouvi sua voz.

Sua postura tensa diante de mim não omitia ou manipulava meus questionamentos.

-Você fez boxe? - questionei atenciosa tentando tornar aquilo menos desconfortável para ela.

Ela apenas assentiu, sentando-se ao meu lado.

-Eu odeio essa foto. - ela olhou de relance para a imagem. - Podemos queimar ela? - questionou baixo.

Eu me vi confusa, buscando motivos no seu olhar.

-Se a odeia, por que ainda guarda?

Maraísa engoliu em seco e eu sussurrei um pedido de desculpas, em seguida dizendo a ela que pode poderíamos queimar. Na foto ela estava ao lado da equipe de boxe de uma escola americana situado em Ohio. Vestida em um top preto e um shorts esportivo no mesmo tom. Abraçado pelo treinador e ao seu lado algumas outras meninas, mas em excessão, somente ela tinha aquela expressão dolorosa.

-Quer falar sobre isso? - questionei enquanto ela segurava o isqueiro, analisando a chama se alastar pelo papel da foto.

-Não

-Está te consumindo... - sussurrei segurando sua mão após ela jogar a imagem dentro da lareira e mencionar em ações tentar sair do cômodo.

-Consegui chegar até aqui, não consegui? - ela me olhou nos olhos de forma sútil, como se questionasse a si mesma. - Não precisamos falar sobre isso. Eu estou bem.

-Está? - questionei outra vez e ela assentiu milimetricamente.

-Eu era só uma garota, ok? - ela disse séria. - Adolescentes tem problemas, e eu tive também.

Ela estava nervosa, era confuso. Toquei seu rosto, o acariciando ao mesmo tempo em que a puxava para mim. Sentamos em sintonia no sofá outra vez e a abracei de lado.

-Sabe que pode me contar qualquer coisa, não sabe? - questionei. - Não precisa ficar nervosa, não sou sua inimiga.

-"Eu sei" - Ela sussurrou.

Não havia outras fotos durante seus dezesseis anos, nem mesmo dos dezessete. E devido ao meu extinto em trabalhar na psicologia a anos, era estranhamente curioso o fato.

(...)

Resolvi deixar o assunto de lado após ver seu desconforto. Ela me contou sobre como as meninas não haviam se adaptado ao lugar, como haviam voltado chateadas da escola e como tudo aquilo estava sendo um porre.

-Podemos voltar pra casa?

-Se quer, então vamos. - me aproximei a abraçando por trás. - Faremos o que você quiser, ok?

Maraísa virou-se para mim, envolvendo me em seus braços e com a ponta do dedo, ergueu meu rosto para olha-lá.

-Me desculpa por ter bagunçado sua vida. - ela pediu com um sorriso fraco, sincero.

-Você não bagunçou minha vida, me recolocou no eixo e me fez entender meu verdadeiro eu.

-É só que... nos arrastamos de um lado pro outro e sempre há problemas, e inegavelmente eles sempre partem de mim.

-Problemas são normais, fazem parte de tudo.

-Eu prometo que tudo vai se acalmar e não vamos mais ter que nos submeter a mudanças repentinas, ok? Vou resolver tudo isso. - ela disse tímida, cansada. - Em Minnesota é bem mais fácil, as crianças tem baba de confiança, os seguranças já são de conhecimento e a língua nativa nos facilita bem mais. E... tenho a Maiara.

-Se sente falta de casa, então vamos pra casa. - sussurrei e ela sorriu de canto.

LÁ MARFIA -MALILAOnde histórias criam vida. Descubra agora