ALGO DIFERENTE

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MARÍLIA

Eu mexia no celular ao mesmo tempo em que observava Maraísa assistir algo na televisão. Ela já estava mais calma e agora até dispersa. Deitada sozinha na cama, enrolada entre os edredons e vestida em uma blusa minha. Seus cabelos pretos espalhados pelo travesseiro e um olhar atencioso direcionado a televisão.

-Por que não larga esse celular e vem ficar aqui comigo? - ela questionou com a voz delicada e talvez até meiga demais. - Quero ficar com você.

A olhei de relance e ela sorriu carinhosa.

-Poxa - ela resmungou após minha visão retornar a tela telefônica.

-Estou quase terminando. - eu disse dispersa me perdendo no que via.

A escola pública de Ohio havia recebido muitos alunos através de bolsas de estudos facilitada pelo esporte. Boxe era incluído entre eles, na lista de alunos pude ler o nome de Maraísa. Naquela época ela tinha 16 anos, e de acordo com o que havia me dito, havia sido expulsa de casa com a mesma idade. Ela havia passado por algo doloroso sozinha?

Nas fotos disponibilizadas do campeonato estadual dos alunos inscritos, busquei a de Maraísa e analisando pacientemente pude ver seu olhar quebrado, pude me perder no castanho escuro e escutar o quando ele pedia por socorro.

-Vida... - Ela me chamou outra vez.

Me senti culpada por deixá-la ali esperando, coloquei o celular de lado e me juntei a ela. Rapidamente senti seu corpo quente colar-se ao meu e em uma posição confortável ela deitou a cabeça em meu peito, ainda assim podendo assistir o que passava na tela a nossa frente.

-Já que a Maiara vai levar as crianças hoje, porque trouxemos elas no dia em que ela as levaria, o que acha de fazermos algo diferente? - questionou baixo enquanto acariciava meu abdômen por baixo da blusa.

-O que você quer fazer? - questionei enquanto a via pensativa.

-Qualquer lugar, desde que possamos sair de casa um pouco. - ela respondeu baixo.

-Sabe que tem a mídia lá fora... - eu relembrei.

-É eu sei... mas incomodaria você de alguma forma? Posso tentar reservar uma mesa privada em algum restaurante, mas não posso garantir que não nos filmem.

-Por mim tudo bem, só pensei que seria um incômodo pra você. - ressaltei.

(...)

Como pedido por ela, fizemos algo diferente. Jantamos em um restaurante luxuoso de Xangai com uma diversificação imensa, abrangendo a típica comida da cultura chinesa e complementando com de outros países. A vista era tremendamente linda, era possível ver do ponto alto todos os focos de luz lá embaixo.

-Eu costumava vir aqui quando estava em Xangai a trabalho. - ela disse baixo enquanto segurava minha mão sobre a mesa e brincava com as joias em meus dedos.

-Sozinha? - questionei afastando alguns fios de cabelo que insistiam em cair em seu rosto. Ela respondeu que sim e um sorriso bobo escapou involuntariamente.

Ela ergueu o rosto, que momentos antes estava abaixado. Me olhou nos olhos por alguns segundos e me vi completamente apaixonada por cada mínimo detalhe nela, desde a fisionomia, expressões, personalidade e genuinidade. Seu toque leve me deixava cada vez mais boba por tudo aquilo, e nada no mundo me parecia mais lindo do que aquela mulher em específico.

-Para de me olhar assim... - ela disse patentemente tímida.

Maraísa estava bem mais leve e bem mais carinhosa.

MARAÍSA

Seu olhar paciente se tornou intimidador quando mudou de foco. A sobremesa foi entregue e notei o olhar ciumento de Marília direcionado ao garçom que desde que entramos tentava me chamar atenção.

-Que foi? - ela questionou sorrindo disperso assim que o homem saiu e eu a observei. - Só estou cuidando do que é meu.

(...)

Pagamos a conta e caminhamos em direção ao elevador, a mão de Marília se entrelaçou a minha e por estar de salto ela se tornava mais alta. Já dentro do elevador, seu braço envolveu meu pescoço me mantendo ao seu lado e um beijo foi deixado em meu rosto de forma sútil. Passamos pelo vallet que de forma educada e gentil entregou as chaves do carro, nos dando liberdade para adentrar o estacionamento já que optamos por sair de forma discreta.

-Tem algum lugar mais reservado que possamos ir? - ela questionou enquanto destravava o carro já que era ela quem estava dirigindo.

Eu disse que sabia um e enquanto ela dava ré para retirar a McLaren da vaga, sua mão repousou sobre minha coxa.

-Seus pais pediram pra me conhecer no fim de semana. - eu disse depois de um tempo, ela me olhou de relance e focou novamente o olhar na estrada.

-Como assim no fim de semana? - ela questionou surpresa.

-Eu disse que estávamos livres no fim de semana e que tínhamos completa disponibilidade de nós locomovermos até lá. 

-Assim, do nada? - ela sorriu.

-Se não quiser, podemos não ir.

-Não, vida. Não é sobre ir, e sim sobre a mentira que eu não vou conseguir sustentar. - ela sorriu de forma involuntária e foi impossível não rir também. - Eu disse que te conheci em uma exposição de arte e eu nem sei como funciona uma exposição de arte.

Depois de algum tempo ela parou de sorrir e me olhou de forma desajeitada.

Ela diminuiu a velocidade e parou o carro para aguardarmos o semáforo. Seu olhar buscou o meu e de forma rápida ela deixou um beijo em meus lábios.

-Você é tão linda. - ela sussurrou arranhando a parte interna da minha coxa. - Eu pareço uma idiota apaixonada, não é? - questionou com um sorriso idiota e eu assenti.

-Somos ambas idiotas apaixonadas. - afirmei enquanto a via acelerar outra vez.

(...)

Marília estacionou o carro e através do vidro podíamos ver os barcos turísticos navegarem.

- Senta aqui... - ela pediu baixo, afastando o banco um pouco para trás e me dando espaço para ir pro seu colo.

De forma desajeitada sentei sobre ela, suas mãos repousaram sobre minha bunda ao mesmo tempo em que ela me olhava com devolução.

-Eu te amo tanto, sabia? - eu disse baixo assim que senti uma de suas mãos tocarem meu rosto com delicadeza.

MARÍLIA

O castanho que me prendia todas as vezes através do olhar me deixava agora ainda mais inebriada pela forma que me buscava. Seu toque em minha nuca, acompanhado nos arranhões feitos levemente com as unhas me arrepiava por inteira. Sua voz doce me deixava ainda mais apaixonada pelo momento, pela sincronia entre nós e pelo que conseguíamos ser quando estávamos juntas.

-Não procura sobre meu passado... tenho medo de que passe a sentir nojo de mim como eu senti. E eu te amo demais pra pensar na hipótese de que um dia me deixe.

LÁ MARFIA -MALILAOnde histórias criam vida. Descubra agora