Capítulo LXXII

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- Him and I; Halsey

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POV Marjorie Cerrado

- Você não vai trabalhar hoje? - Sentada no banco do passageiro, pergunto, enquanto observo a paisagem urbana pela janela.

- Não. - Roberto continua olhando para frente, dirigindo.

- Você nunca tira folgas. - Dou de ombros, apoiando a cabeça na janela fechada.

- Isso foi antes... - Roberto é um homem corajoso, em grande parte do tempo, mas desde o que aconteceu comigo, ele fica cada dia mais receoso em falar qualquer coisa. Parece que ele tem medo de que qualquer coisa me faça surtar, e bom, talvez faça. - Você pretende voltar a trabalhar? - Em parte, eu entendo a pergunta dele, mas achei meio idiota. Eu não posso me dar o luxo de não trabalhar, mas também não vai ser na defensoria. Não posso entrar naquele estacionamento e não lembrar da minha amiga. Não consigo entrar naquela sala e não surtar por lembrar de tudo aquilo e lembrar que não pude fazer nada.

- Eu não consigo voltar lá. - Abaixo a cabeça, brincando com o punho do meu cardigan cor de creme. Minha calça cargo preta é tão folgada que ainda consigo usá-la. Como diria Victoria: eu estou com uma vibe maravilhosa de mãe jovem e atualizada.

Acho engraçado que, em muitos momentos, me esqueço do que aconteceu e de Lud. É assim que funciona o luto? Toda vez que você está quieta e tranquila, você se lembra da pessoa e sente vontade de chorar novamente?

Me tirando da melancolia, Roberto fala.

- Não precisa voltar lá. - Ao ouvi-lo, o encaro como confusão. Ao notar minha reação, ele prossegue. - Você pode ficar em casa, com nosso filho e eu cuido de vocês.

- Você enlouqueceu de vez! - Começo a gargalhar escandalosamente, dando batidas na minha própria coxa. Eu sei que ele está falando sério, e essa é a graça.

- Eu ficaria mais tranquilo sabendo que você está em casa.

- Roberto, não vamos passar o resto da vida juntos só por causa disso. Nós não temos mais nada e a única obrigação que você tem é com essa criança. - Passo a mão pelo rosto, secando as lágrimas que saíram. Essa foi a primeira vez que eu ri de verdade, desde o ocorrido.

- Marjorie, não vamos discutir isso agora.

- Não vamos porque não há nada para ser discutido. - Volto a encara-lo, mas com uma incredulidade expressa. Como ele ousa achar que ainda temos alguma chance juntos?

- Como não?

- Você lembra do que você me chamou? Lembra das coisas que me disse? O nojo passou? - Arqueio a sobrancelha, o desafiando a falar. Nós nao conversamos sobre isso e eu quero que ele fale. Quero que fale tudo o que está preso aí dentro. Ele me perdoou só porque eu fui sequestrada ou ele queria mesmo me perdoar? Porque, se for a primeira opção, ele não me ama de verdade e está apenas sentindo culpa. E eu não quero estar com alguém só porque ele sente culpa.

Roberto apenas suspira, se dando por vencido temporariamente.

Por sorte, o clima tenso tão palpável que estava entre nós se esvai assim que estacionamos no hospital. Viemos fazer a ultrassom para ver se nosso bebê já está melhorando e qual o sexo. Eu tô ansiosa. Dizem que mãe sente essas coisas, mas eu não sinto nada. Bom, eu acho que é um menino simplesmente porque sim. Sem nenhum critério. Isso é o "sentir" que tanto falam? Achei muito incerto.

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- Você sabe que, graças ao que passaram, você precisa ser acompanhada corriqueiramente, não sabe? - Dr. Rodrigo parece um pouco arisco hoje. Caiu da cama, querido?

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