Capítulo 77

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"Ele nunca precisou de permissão para me tornar a mulher dele."

YOLANDA

O som abafado dos pneus contra o asfalto sinalizou que havíamos chegado. Cassandra e eu descemos do táxi em silêncio, o ar pesado entre nós. Minha irmã segurava a bolsa com os documentos da clínica, uma expressão neutra no rosto, mas eu sabia que ela tinha algo a dizer. Cassandra sempre tinha algo a dizer.

Margareth havia insistido em me acompanhar à clínica, mas Cassandra foi firme. Tanto eu quanto Cassandra sabíamos que Margareth não podia ir. Não porque seria difícil para ela, mas porque eu não suportaria a presença dela ao meu lado em um momento tão vulnerável.

Margareth era uma falsa. A mulher que deveria me proteger e me apoiar havia me colocado nessa posição. Era por causa dela que eu estava carregando um fardo tão pesado, presa a uma situação que parecia não ter saída. O jeito frio como ela lidava com tudo só tornava as coisas piores. Ela sabia manipular, sabia usar seu poder e sua influência para ajeitar tudo de acordo com o que lhe convinha, e eu era apenas uma peça no jogo dela. A clínica também sabia disso. Já estavam cientes do que dizer, do que documentar. Era assim que funcionava para os ricos e poderosos: ajustes convenientes, mentiras bem contadas, segredos acobertados.

Quase 11 semanas. Mas, para Dylan – e para qualquer documento oficial – eram cinco semanas a menos. A mentira era clara, mas ninguém parecia se importar. Era mais uma camada desse teatro que todos insistiam em manter, mesmo que me destruísse por dentro.

Eu odiava a ideia de precisar da aprovação de Margareth para qualquer coisa, mas, por algum motivo, eu sabia que, no fundo, ela estava satisfeita. Talvez fosse sua forma de me punir, de me manter sob controle. E Cassandra, percebendo isso, se colocou no meio, como sempre fazia. Ela era meu escudo, minha voz quando eu não tinha forças para usar a minha.

Quando chegamos ao portão de casa, o frio da tarde se intensificou. Eu puxei o casaco para mais perto do corpo, mas o incômodo não vinha apenas da temperatura.

— Vai mesmo desistir da formatura? — Cassandra perguntou, enquanto abria o portão, segurando para que eu pudesse passar.

— Não é desistir. Só vou pegar o certificado, nada de festas. — Minha voz saiu baixa, quase um sussurro.

— Todo mundo vai estar lá, Yolanda. Você merece esse momento.

Eu balancei a cabeça, sem conseguir olhar para ela.
— Uma pessoa não estará. E não importa o quanto eu tente, Cassandra... essa culpa nunca vai embora. Ele deveria estar lá, mas está recluso, longe de tudo. E eu sou a culpada por isso.

Cassandra parou no meio do caminho e virou-se para mim, os olhos cheios de algo que eu não consegui decifrar. Talvez fosse pena, talvez fosse raiva.
— A culpa não é só sua. Você sabe disso, não sabe?

Eu não respondi. Como poderia? Todas as noites, antes de fechar os olhos, eu via o rosto dele. A lembrança do seu sorriso desafiador, das palavras que ele usava para me provocar, das vezes em que me tirou do fundo do poço, mesmo quando eu não queria ser salva. E agora... agora ele estava lá, pagando por algo que eu fiz.

Minha raiva dele vinha em ondas, sempre repentina, sempre passageira. Mas a culpa, essa era constante. Porque, por mais que eu tentasse odiá-lo, ele ainda era o único que havia feito algo por mim, que havia me protegido de maneiras que Dylan jamais faria ou poderia fazer.

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