Capítulo 77

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Depois de quase uma semana, recebi a ligação de Estefânia dizendo que queria conversar comigo. Eu já tinha deixado de lado tentar falar com ela. Quase. Tinha quase certeza que tinha dedo de Gustavo nisso. Ele deve ter falado com Victor sobre a nossa falta de diálogo, pero bueno, decidimos nos encontrar num restaurante perto do nosso antigo loft. Assim que cheguei, me sentei em uma das mesas vazias do fundo. Não queria que ninguém perturbasse nossa conversa. Tínhamos muito o que conversar.

No tempo em que esperei, comecei a procurar pontas duplas em meus cabelos para me distrair e quem sabe o tempo decidisse passar mais rápido. Intercalava entre mexer no cabelo e alisar minha barriga. Era algo que eu comecei a fazer sem perceber. Muito menos percebia que enquanto passava a mão nela, um sorriso brotava no meu rosto. Eu não percebi, Gustavo que disse. Depois de ver o garçom passar por minha mesa umas dez vezes, ouvi o barulho do sino da porta, indicando que alguém tinha entrado. De imediato levantei minha cabeça e lá vinha ela. Estava diferente, o cabelo estava cortado na metade. Não consegui evitar sentir um turbilhão de sentimentos ao mesmo tempo. Alívio por ver que ela estava bem. Medo por não saber onde nossa conversa iria acabar. Ansiedade para que esse fase toda acabasse e voltássemos a ser o que éramos.

Estefânia olhou para os lados tentando me encontrar. Pensei em não levantar a mão e apenas sair pelos fundos, mas eu não me perdoaria por isso, então apenas ergui a mão para que ela pudesse ver onde estava. Senti um pouco de tensão quando seus olhos encontraram os meus, mas ela não hesitou, apenas veio andando até mim.

- Oi. - Falei com um pequeno sorriso nos lábios. Isso estava horrível. Desde quando éramos tímidas para falar com a outra?

- Oi. - Ela respondeu com o mesmo sorriso morno antes em mim.

Nada de abraços. Nada de risadas. Apenas nos sentamos e ficamos olhando uma para outra esperando a primeira palavra. E pensei se era eu quem tinha que começar, mas ela que tinha me convidado, então...

- Vocês estão prontas para pedir? - O garçom voltou a mesa e finalmente perguntou ao parar do nosso lado com o cardápio na mão.

- Ainda não. Volte daqui a meia hora e se não estivermos conversando nos expulse. - Estefânia respondeu e me surpreendi com o que ela pediu. Curta e grossa.

O garçom ficou alguns segundos digerindo e me olhando para saber se procedia o que ela estava dizendo. Apenas fiz que sim com a cabeça e ele nos deixou sozinhas.

Um. Dois. Três. Quatro. Cinco. Ficamos cinco minutos olhando uma para a outra sem trocar uma palavra. Até passou pela minha cabeça que ficaríamos mais de dez, vinte ou talvez trinta minutos sem nos falar, mas uma de nós atirou a primeira pedra.

- Não tem um jeito fácil de fazer isso. - Comecei. - Não sei por onde começar... Eu sei que os últimos meses têm sido uma loucura e eu não tenho noção nenhuma do que você e Gustavo passaram naquele hospital, sei que...

- Teresa... - Ela tentou me interromper, mas resisti.

- Me deixe falar, estou com isso preso e preciso terminar. Sei que eu fui uma filha da puta por não ter te contado sobre o que estava acontecendo. Eu estava tentando te proteger, na minha cabeça tudo ia acabar e você não ia precisar enfrentar a ex do Victor. Você não ia se desgastar, não ia achar que a vida estava brincando de novo.

- Me proteger? Você sabe que eu sei me cuidar, que se tivesse me contado, eu poderia ter ajudado. Poderíamos ter evitado tantas coisas.

Estefânia suspirou e não podia ignorar as palavras de acusação dela.

- Quando eu soube que a ex do Gustavo estava na cidade, eu me senti estranha. Descobrir que ela tinha sido a ex de Victor me fez ficar com a cara no chão. A história em si, dela trocar de irmão e achar que isso ia ser normal, sumir e retornar achando que as coisas voltariam a ser o que eram, isso... Eu estive no seu lugar. Descobri que meu noivo tinha um filho de uma mulher desprezível, mas ambas sabemos que isso não era algo de outro mundo. Eu só quero que você entenda que mesmo não demonstrando nos últimos meses, você é e sempre será minha melhor amiga. Ninguém vai ocupar esse lugar a não ser você.

- Teresa, eu...

- Não. - Sequei os olhos marejados. Droga! Eu tinha que começar a chorar? Como iria manter a seriedade agora? Droga de hormônios. - O que eu mais queria era te contar, sobre tudo... Mas, você já viu você e Victor juntos? Vocês estavam tão bem e eu só ia jogar minha porcaria em você.

- Achei que você já sabia que estou aqui para isso também. Não sou sua amiga só para os momentos bons, quando merdas estão acontecendo eu quero saber. - Ela falou um pouco revoltada. - Sei que foi muito nobre da sua parte não falar dela, mas eu não sou de porcelana.

Eu sabia disso. Sempre contávamos as coisas uma pra outra, por que agora tinha que ser diferente? O que mudou que nos permitimos nos afastar tanto?

- Eu sei disso. - Falei firme. - Mas, eu cansei de ver você achar que a vida só quer gozar de você. Não é verdade. Você tem um cara incrível do lado e agora uma... Uma criança que é tão linda e...

- Teresa. - A voz dela quase falhou e levei alguns segundos para me recompor. - Eu entendi que você queria me proteger. É o que fazemos, mas esconder as coisas foi algo grande que não dá para ignorar. Você preferiu confiar sua vida em uma pessoa que você conheceu a um pouco mais de um mês, mas teve receio de me contar. A pessoa que cresceu contigo.

- Eu... Me perdoa? É só isso que eu quero. Poder conversar com a minha melhor amiga sobre qualquer coisa a qualquer hora. Eu sei que fui errada e estou pedindo desculpas.

Estefânia estava sem palavras. Não que eu nunca tivesse pedido desculpas na vida, mas essa situação era nova. Lembrei com perfeição que só tivemos três brigas em toda nossa amizade, mas isso tinha atingido um novo nível.

- Eu fui te ver no hospital. - Ela disse baixo.

- Gustavo me disse. Pena que eu não te vi.

- Óbvio que não. Você tinha acabado de sair de uma cirurgia e estava toda dopada em uma cama. Demorou dias para abrir os olhos. É óbvio que não. Foi difícil, Teresa.

Me concentrei em ouvir tudo o que ela estava sentindo. A ouvi falando sobre as horas que passou andando de um lado para o outro naquele hospital. Sobre ver Gustavo destruído, apenas a espera de uma única notícia sobre meu estado. Sobre o "pequeno" surto de Andrea ao saber da irmã hospitalizada. Estefânia contou como tentou dormir a noite mesmo sabendo que teria pesadelos sobre os infelizes acontecimentos daquele dia. E no fim de tudo, as lágrimas não poderiam faltar. Choramos tanto que soluçamos. Choramos tanto que parecia que alguém tinha morrido.

- Eu preciso de você. E isso é um saco, porque eu ainda estou tão puta, mas não consigo ficar sem você. Saber que você está bem, foi tão... - Ela parou de falar engolindo as lágrimas. - Eu só quero minha amiga de volta.

- Eu estou aqui. - Coloquei a minha mão sobre a dela. - Não foi sua culpa. Nada naquele dia foi.

- Eu... só quero que isso passe. Eu cansei de cair.

Sequei as lágrimas tentando me controlar. Isso definitivamente não estava indo do jeito que planejei. Ela se levantou e veio em minha direção pra me abraçar. Então tudo vai por água a baixo porque voltei a chorar. Porra de hormônios!

- Eu prometo não esconder mais nada de você. Vamos superar isso. - Ela sussurrou.

E assim, finalmente, senti que tinha minha amiga, minha irmã de volta. Queria tanto contar a ela sobre a gravidez, mas achei que estava muito cedo. Como poderia dizer algo feliz enquanto estávamos ainda frágeis com a outra?

Um Inferno IrresistívelOnde histórias criam vida. Descubra agora