Capítulo VIII

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Olho através da vidraça do restaurante atentamente, à procura daqueles cabelos grandes ondulados e aqueles olhos cor de avelã inconfundíveis (e irresistíveis, tenho que confessar) e vou até o fim com a minha atenta busca mas sem sucesso. Já dentro do restaurante, não o encontro reservando nossa mesa e então resolvo me sentar para ficar a sua espera e procura alguma mesa agradável, escolhendo uma perto da vidraça, que tem uma vista perfeita para o céu e para rua, que possui tonalidades de uma tarde amena porém cinzenta. Chegar atrasado? Esse é o joguinho dele? Mas faz bem o perfil dele, para impressionar e para fazer com que toda a atenção ao abrir a porta, seja voltado completamente para ele e já era para eu ter me tocado. Estou desatento com o pequeno sino acima da porta que anunciava, a todo momento, a chegada de alguém e me zomba ao acenar, me mostrando quem eu não espero e continuo o esperando, sentindo uma mão envolver de repente, o meu ombro.

- Boa tarde, senhor. Você já fez o seu pedido? - me recebe o garçom que se mostra preocupado se já fui atendido e enfraqueço o sorriso por não ser quem eu esperava.

- Não moço, estou a espera de alguém... Quando ele chegar, eu o farei. - digo e me viro por me esclarecer mas ele insiste no seu discurso.

- Você não pode ficar se não consumir nada, senhor. - sinto sua insistência grosseira e o olho estático sem esboçar nenhuma reação.

- Mas irei fazê-lo, só que não agora. Tenha paciência.

- Se não vai consumir agora, infelizmente, vou pedir que o senhor, por favor, se retire agora. - não sinto nem um pouco de pesar no seu tom, até finge educação mas não consegue disfarçar sua ironia na sua má abordagem.

- Posso pedir uma água? - é a única saída que me resta para aquele sujeito desesperado pela sua gorjeta sair do meu pé e me permitir ficar.

- Para agora ou para depois? - percebo agora que ele não faz questão de rebocar sua zombaria com cortesia e ainda sorri descaradamente.

- Pode trazer, por favor?

- Gostaria de um acompanhamento? Um aperitivo? Um chá de camomila?

- Eu gostaria que você sumisse daqui e trouxesse minha água, por gentileza. - copio seu semblante deslavado e ele sai finalmente. Só me faltava essa mesmo, sair de casa agora é uma experiência para testar meus limites de paciência e meu senso de humor e interação que não estão em dia.
  Depois de algumas tentativas de vencer aquela disputa entre eu e o menosprezante sininho, fracasso mas não desisto e o indivíduo retorna com minha água.

- Um copo? - o questiono, segurando o copo, que era para ser uma garrafa de 1 litro, no mínimo.

- Você queria o quê? Um cálice ou uma taça de porcelana? Vou me atentar a todos os requisitos da próxima vez.

- Não sabia que vocês aqui cobravam taxa até para ter um bom atendimento, imaginei que era o mínimo de um estabelecimento. Aliás, não quero menosprezar a sua posição de trabalho ou insinuar que você é meu servo, mas me servir está incluso no seu trabalho.

- Mas estou aqui para atender as mesas que estão ocupadas como clientes, não para jogar conversa fora com alguém que acha que está em uma mesa de concreto qualquer da Sprinkly Square. - ele cita a praça da cidade como um local marginalizado e exprime toda a sua arrogância como se fosse o próprio dono e não, um mero funcionário, então não poupo em devolver a sua rebaixação.

- Acontece que uma hora ou outra, eu irei consumir mas a sua insistência não me faz querer ficar. Agora me traga uma garrafa de 1 litro, no mínimo, na bandeja e depressa porque a verdade me faz ficar de garganta seca. - o entrego o copo sem segurá-lo fixamente, com apenas três dedos e ele resmunga algo mas não entendo por que não compartilho do mesmo dom do Dr. Dolittle. - E de nada por ser o primeiro provável lucro do dia dessa lanchonete de trigésima categoria. - ele se dá por derrotado e parte para atazanar outras mesas com sua falação esfarrapada. Dou um gole na minha água para apaziguar meu estresse repentino que foi o preço que paguei para ouvir desaforo desnecessário e permanecer no meu modo vegetativo nessa poltrona que sou incapaz de tecer elogios, até porque nada aqui merece. Se passa exatamente meia hora que estou aqui, a demora começa incomodar e a porta de entrada se torna um oásis em pleno deserto e a imagem do Nathan entrando por ela, uma delirante miragem e suspiro, aborrecido e impaciente. Folheio o cardápio à minha frente como distração e avalio os pratos e seus respectivos preços, se são ideais ao que propõem ou exageradamente caros enquanto o sino toca mais um vez, mas não desvio minha atenção, ao menos, resisto e persisto mas me contrario no fim e abaixo o cardápio lentamente que cobre a minha vista frontal e meus olhos brilham tanto quanto os postes do lado de fora e suspiro agora, de alívio.

Apenas Segure A Minha MãoOnde histórias criam vida. Descubra agora