Capítulo LXXI (Parte 3/3)

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Enquanto recuperamos o fôlego e renovamos a energia em meio a uma ambiência caótica e tumultuada, uma atmosfera no palco é criada para nos surpreender e é tomado por fumaça artificial e bloqueia a vista da silhueta que entra enquanto se inicia a instrumentação de Back From The Edge e em seguida, a voz grave e encantadora do James Arthur. A empolgação e o alvoroço não são poupados para o fim e estamos delirando enquanto ele segue para At My Weakest e Impossible. Toda nossa dedicação é cedida para contribuir ao eco de vozes, que ressoa completo, os que não sabiam a letra, entregavam os corpos invadidos pelo ritmo e pela mensagem que não os deixavam quietos. Homicide Love, Car's Outside e Quite Miss Home se sucedem e arrancam do Matías uma reação esplêndida e específica, como se aquelas palavras relatassem um trecho de sua vida e eu não duvido muito. O título da primeira música pode o remeter à Josephine, duas palavras que podem descrever esse relacionamento bem cruamente, e a um fim nada incruento. Um caso de transfobia que interrompeu um amor com um impiedoso homicídio (assim que configuraram os policiais o crime contra ela), sem relatar essa morfologia que não corresponde ao gênero da Josephine, mas o que podemos fazer quando nem as palavras escapam do machismo estrutural. A segunda talvez,  possa ser uma mensagem dedicada ao seu amor, um pedido de que nunca mais haja ausência ou separação, pois que se doe amor, e nunca doa senti-lo. E a última, possa o fazer lembrar da convivência com ela, a massante rotina de quando podem ficar juntos, quando os afazeres não os mantém separados, ou viagens internacionais, que separam países por fronteiras, e nunca sentimentos por distância. Me desvencilhando da minha lógica mental ao observá-lo e também participando da cantoria, estamos ao fim dos versos de Falling Like The Stars, que castiga os mais apaixonados e os mais abandonados, com ou sem companhia, com um pouco de interação do James, ao virar o microfone em nossa direção, para ouvir o nosso coro fanático e potente. Treehouse traz a alegria com sua agitação nessa montanha russa de emoções mas logo traz de volta a melancolia e a comoção com Naked, um verdadeiro gatilho que não poupa ninguém e pisotea nossos corações sem culpa mas sem nos impedir de perder o canto com vontade, não importa se o choro embarga a nossa voz, ou se a gritaria quase nos faz ficar roucos. Para finalizar com chave de ouro, em tom de despedida com todo o drama e apelação emocional possível, os versos de Glorious são entoados por todos com mais gás e por ser a última música, então nos esforçamos para desgastar o que já estava prestes a ser escasso. Uma forma de escape dos nossos sentimentos era liberar a adrenalina juntos dos outros, cantando e engajando com o pouco de voz que ainda restava, aqui um pouco se transformava em muito e a vergonha se transformava em liberdade. Uma linda mensagem era remetida por dias melhores e que o amor e o respeito fossem os sentimentos primordiais para nos levar de volta para casa com o coração aquecido e reconfortado de toda batalha que feria fora daqui, do nosso universo criado para canalizar e emanar boas energias. Cantamos alto como nunca antes, nossas vozes não alcançam a eternidade mas a nossa mensagem pode se perpetuar, sendo amplicada por todos os corações tocados, sendo um grito para os ouvidos desatentos, para os olhos despersos e para as bocas impronunciáveis, que se neutralizam de um posicionamento e se isentam de uma atitude diante de um ato de violência que banaliza vítimas inocentes e precoces e se tornam cúmplices indiretos dos malfeitores que praticam a violência, desvalorizando o amor, que pode e deve ser tratado e sentido como legítimo e glorioso. Com essa reflexão e influência por todo o meu emocional afetado, se encerra as apresentações e logo depois do James deixar o palco, alguns grupos começam a se dispersar e o movimento de pessoas torna-se inquieto novamente, afim de garantirem agora, um espaço no ônibus de volta para casa. Depois dessa experiência arrebatadora, que mal possa elencar qual experiência tem sido mais, meu corpo ainda processa toda energia recebida em parcelas enquanto seguimos para a saída, que é evacuada mais rápido do que se tivesse houvido um incêndio aqui. Mesmo que desejassemos um descanso para nossos corpos descarregados e quiséssemos sair em disparada para enfrentar aquele tsunami de pessoas, seríamos mais pisoteados do que tapete de boas vindas e por isso, resolvemos esperar aquela saída tumultuada e vamos dar uma volta pelas barracas de bebida que agora, tem mais acessibilidade disponível. O que podemos descansar agora é apenas nossa voz exausta e pedimos água para hidratar e cessar a sede pelo suor e calor humano que foi emanado junto da positividade. Nossas cordas vocais mais estouradas do que as cordas de um violão velho se confortam com o líquido e resolvemos ousar ao termos findado uma garrafa de 600ml em meros 10 minutos de conversa em trio, agora mais audível, antes impedida pelo abafo e altura de toda a música explosiva. Pedimos uma rodada de Coca-Cola com limão, e outra, com abacaxi, porém em rodelas que incrementavam um sabor cítrico e quase efervescente pela agitação das bolhas de gás no copo. A outra rodada é entregue em um copo com refrigerante e o extrato das frutas em outro separado, misturamos tudo e esperamos na barraca para finalizar o drink não alcoólico e descartar nossos copos. Depois de toda a bebedeira, pagamos e nos deparamos com a saída ao horizonte que, se não tivesse portões tão grandes, seria impossibilitada a visão pelo movimento de pessoas ainda que saíam compressadas, sem seguir uma fila padronizada. Com um pouco de dificuldade e esforço, encaramos a aglomeração no seu embalo até cruzarmos todos e chegarmos do lado de fora, afastados e sem sermos cercados, com as nossas bexigas tão cheias e eu só espero que esse reservatório aguente chegarmos no hotel, ou vai acontecer um rompimento de barragem calças abaixo. Ainda caminhamos mais um pouco ao alcance do ônibus que chegava e garantimos ser os primeiros a embarcar e escolher lugares confortáveis e próximos o suficiente para evitar mais perrengue e emoções acaloradas, se é que me entendem. Tomamos nossos postos sem muita correria, eu me sento ao lado do Nathan agora e o Matías ocupa a poltrona ao seu lado para esticar as pernas por ele diz senti-las um pouco dormente, esperamos o embarque e o aconchego de todos para partirmos enquanto meu corpo se recupera da minha permanência de pé e sinto meu corpo latejante, talvez por sentir minha circulação sanguínea fluir melhor agora. O Nathan parece processar tudo ainda, sua cabeça repousa esgotada e seu coração, inquieto pelos batimentos, e ainda palpita desritmado, enquanto faço isso em minha mente discretamente. Apesar de encontrarmos um lugar para acalmar os ânimos e confortar onde doía, seu rosto não transparecia sonolência, apenas cansaço, enquanto eu clamo mentalmente pela nossa chegada imediata e nossa cama confortável para nós descansarmos por todo o resto de noite. Ele diz que o efeito do energético ainda está ativo e segue pelo trajeto observando pela janela os pontos urbanos da cidade enquanto eu evito, por me fazer enjoar essa vista corrida, me atentando ao Matías para que ele não adormecesse e caísse do assento, firmando seu cinto para que ele pelo menos pudesse adormecer sem preocupação na sua posição folgada. O balançar do ônibus atrapalha o sono de alguns, pelo sacudir inesperado e o barulho do movimento também, me atrevo a encarar a paisagem pela ótica da janela da frente e passamos por alguns pontos mais altos, como pontes e morros, que destacava cada ponto de luz aceso lá embaixo que acrescentava um charme a paisagem simples. Por me manter sempre observador e atento ao exterior, começo a reconhecer alguns pontos e posso deduzir que estamos próximos ao hotel, logo o ônibus estaciona e nos preocupamos em acordar o Matías e nos certificar que não deixamos nada para trás, apenas a bagagem de estresse e insatisfação, pois estamos renovados e abençoados por uma noite insuperável de sentimentos e momentos marcantes e inesquecíveis, sem dúvidas. Caminhamos com o Matías cuidadosamente pelos degraus e seguimos para a entrada do hotel, ele está um pouco desorientado pela luz agora presente, praticamente pendurado em nós como um espantalho pela sua postura mole e andar arrastado e o acomodamos em nossa cama, sem estar com os olhos entreabertos por se acostumar com a iluminação e se senta, com os pés em cima dos lençóis. Aos poucos, ele desperta enquanto eu sinto meus olhos pesarem, estando finalmente na cama e depois de ter usado o banheiro, com a disposição apenas de tirar meu tênis e entre uma relutância e outra para manter os olhos abertos, eu ainda posso ouvir um pouco da conversa deles que envolve surpresa e algo mais que já não posso mais compreender pelo meus sentidos já comprometidos pelo sono que me toma. Não me interesso a continuar espionando a conversa e finalmente me rendo, sentindo tudo escurecer e as vozes claras se transformarem em sussuros inaudíveis aos poucos.

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