Ohana:
Ela olhava-me tranquila, enquanto deitada de bruços. Eu apoiava o peso do corpo sobre um dos cotovelos, e levava a mão livre a acariciar suas costas. Eu tinha meu rosto repousando sobre a própria palma da minha mão, e observava-a extremamente atenta.
Meu maior medo era ficar congelada no passado. Eu estava quase certa de que o amor não era pra mim, mas nunca quis que isso fosse uma convicção. É isso que os traumas fazem: te transformam em refém de certezas que nem eram suas. Mas olhando em seus olhos, agora um pouco ofuscados e sonolentos, talvez eu já não fosse uma total refém. Havia algo nela que me despertava curiosidade, afeto, cuidado e transparecia. Eu prezava por não ser a garota rebelde, nem a inconsequente patricinha, tão pouco a manipuladora ou a catástrofe que me moldaram... quando estava com ela.
Quando a vi fechar os olhos com vagareza, aproximei-me com cuidado, deixando-lhe um beijo perto do ouvido. Senti o cheiro dos seus cabelos macios, e mantive-me a acariciar suas costas. Fechei meus olhos e permaneci ali pertinho dela por alguns segundos.
Afastei-lhe a correntinha dourada que estendia-se na região entre as escapulas, dada a posição deitada por ela. Toquei o pequeno pingente de ouro branco e sorri lateralmente, era uma simplória e delicada pedrinha branca. Fitei suas mãos, e na destra ainda se tinha no dedo anelar, o anel rastreável que eu havia dado-a.
Ela finalmente havia dormido. Eu sabia o quanto isso era difícil pra ela. Larissa as vezes passava a noite inteira acordada, eu a encontrava pela casa quando saia do quarto vez ou outra durante a madrugada ou simplesmente a via nas câmeras.
Larissa:
Eu ainda não dormia, mas sentia-me segura o suficiente pra fechar os olhos e não relembrar todas as atrocidades que eu já tinha cometido por precisar. As que tinham sido de vontade, eu nem se quer recordava-me, mas as injustas... ah elas estavam ali como um castigo. Mas naquele envolvimento de afeto, era como se pudesse limpar minha mente. Trazer-me descanso e entregar-me a paz.
Ohana foi se ajustando na cama e levando-me consigo. Senti meu perfume na blusa larga que eu havia retirado, e que agora ela usava. Deitei a cabeça em seu peito e fui abraçada por ela, enquanto dividíamos um só edredom. Ela me abraçava e eu não fazia ideia de que precisava tanto. Eu estava cansada de ter que ser gigante para encarar a vida. Mas em seus braços, eu me aconchegava até sentir-me pequenininha, desarmada, indefesa, como nunca podia ser. Era como se eu derretesse em seu tocar.
Ohana:
Senti um beijo fraco ser deixado em meu colo, um pouco acima da clavícula esquerda. E então, selei-lhe outro no topo da cabeça, posteriormente a abracei mais forte. Aos pouquinhos, fui sentindo o corpo de Larissa relaxar... e então, tive convicta certeza de que ela dormia, após chamá-la e não receber nada em troca.
Me peguei observando com calmaria todos os seus detalhes. De fato, não dava pra fugir. Larissa tinha pegado-me e prendido a ela de uma forma indescritível, e a cada segundo que se passava eu criava maior convicção relacionada a isso.
Eu nunca havia sentido tanto zelo e cuidado por alguém, não por alguém que estivesse em minha cama. Eu queria-a mais noites ali, fossem em madrugadas frias agarrada a mim como estava, ou em madrugadas quentes enquanto nuas. Seu corpo falava comigo, cada expressar seu pertencia à mim de maneira tão pura. E eu perdia-me cada vez mais no seu agir, no cuidar, e na atenção. Talvez não fosse só carência... só talvez.(...)
Era manhã outra vez, e quando acordei, ela estava sentada na ponta da cama, tinha os cabelos presos a um coque despojado que compunha tudo muito bem. Usava um top de renda com bustiê, e uma calça alfaiataria. Diferentemente de como havia dormido. Observei suas costas meramente definidas, e quando movimentei-me na cama para olhar as horas, ela olhou-me rapidamente. Deixando esboçar um magnífico sorriso.