Ohana:
Eram exatos dois dias antes do meu aniversário. Bem, já era noite, Larissa bebia algo lácteo enquanto estávamos sentadas juntas na parte alta da mansão, qual dava pra avistar o arquipélago de pequenas ilhas inabitáveis ali.
A observei por um tempinho, guardando em mente seus lindos traços. Ela estava dispersa o suficiente pra não perceber tal ato meu. Seus fios ruivos balançavam vagarosamente de acordo com o bater da brisa gélida, a face estava límpida, ela usava uma regata preta e canelada, junto a uma calça moletom confortável.
-Ohana: Lari... - chamei paciente, tocando-lhe a coxa e ela olhou-me rapidamente.
Seus olhos brevemente ofuscados pela fraca iluminação ali, que predominava no céu amarelado, buscaram-me com ternura o suficiente para deixarem-me ainda mais a sua mercê. Levei com extrema vagareza a mão até seus fios macios e ruivos escuros, os coloquei atrás da orelha e dedilhei pacientemente sua mandíbula bem marcada.
-Ohana: Promete pra mim... que vai manter a calma? - referi-me ao meu aniversário, afinal, ali teríamos presentes grandes mafiosos que trariam benefício a minha família. Entretanto, muitos deles a odiavam.
-Larissa: Eu prometo. - ela respondeu-me baixinho.
Acomodei-me deitando a cabeça em seu ombro, senti sua mão meramente gélida tocar-me o antebraço, subindo e descendo, em um carinho espontâneo. Estávamos cada vez mais conectadas, e cada vez mais, eu deixava de me importar com o óbvio, seu profissionalismo. Eu já não via ela como primordialmente minha segurança, a muito tempo.
Ainda assim, acomodada a ela, presa em seus encantos... a voz do meu irmão, Vicente, ainda ecoava em minha mente. Qual momentos atrás, a fez repetir o dito que muitos subordinados nossos faziam. Cada vez que eu ouvia aquilo, sentia todo meu cerne queimar, meu estômago revirar e a ânsia de vômito tomar-me. Aquilo ressaltava a objetificação de que, muitos ali, só nos eram úteis para proteção. E naquele momento, em que a vi fazer, foi como se ele resumisse ela a isso. E não, Larissa não era só isso.
"-Larissa: Eu estou preparada... pronta para cumprir minhas funções da melhor forma possível. Estou focada apenas no essencial. Alheio a todo o resto."
Era simplesmente incompreensível pra mim. Eu não conseguiria nunca lidar de forma tão banal com aquilo. E tudo isso tinha se tornado ainda mais intenso pra mim, quando a subordinada ali era ela.
"-Larissa: Só vou tomar decisões pragmáticas. Não vou me permitir distrações levianas. Não vou me permitir pensar em coisas não importantes. Não vou estar sujeita a erros."
Estava sujeita a erros, era humana. Como podiam ser tão... boçais e ignorantes assim?
-Larissa: Ei... - ela chamou tirando-me do transe. - Está tudo bem?
-Ohana: Não está, Lari. Eu já falei. - ressaltei minha inquietude diante daquilo.
-Larissa: Tem que compreender que... - eu sentei-me corretamente, enquanto ela segurava minhas mãos e fitava-as, desviando o olhar do meu. - Esse é o meu trabalho, hum? É perigoso e eu sempre soube disso.
-Ohana: Lari... - contestei inquieta, havia algo em mim que não permitia-me comodidade e conforto naquilo.
-Larissa: Está tudo bem, eu prometo. - ela disse baixinho, com toda doçura que havia em si. - Não vai haver nada de errado.
(...)
Ohana:
A insegurança muitas vezes me visitava, mas não era nada como aquilo. Eu sentia-me demasiadamente ansiosa, parecia atônita, presa naquela enorme caixa onde esvaia em sussurros: "A culpa será sua." Eu não estava nada confortável em deixá-la tão expostas a mãos ousadas que buscavam-a, a anos. Em deixá-la de forma tão insegura, no meio daqueles que pagariam milhares apenas por sua vida.