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Gregory:

Era manhã chuvosa, estávamos na parte coberta da mansão, um pouco distante da casa. Ohana estava sentada, Larissa próxima, e papai ao meu lado. Ele tinha um xícara de café em mãos, o que era bem raro por sinal. Entretanto, seus modos não permitiram-lhe ser medianamente saudável, e ali tinha-se um cigarro saborizado aceso.

Ele tinha tirado um dia pra família, afinal, era véspera do aniversário da minha irmã. Ele sempre fazia isso, quando estávamos próximos de alguma data comemorativa. Acontece que... já carregávamos um medo bem familiar, e prezávamos por essas vésperas com maior intensidade, em extremo e puro afeto. Ele sempre salientava o maior cuidado, maior percepção e por priorizarmos ficar em casa, afinal, era de todos, o lugar mais seguro para nós.

Havia uma chuva fraquíssima, entretanto, o céu estava nublado. O cachorro do papai estava ao lado da poltrona ocupada pela loira, ele parecia fitar o gramado verdinho qual adorava passar as manhãs brincando. Nem que fosse sozinho.

Observei Ohana levar a mão discretamente até a coxa da ruiva, puxando-a mais para perto, o que levou-a, a repousar ambas as mãos no encosto da poltrona. Eu surpreendia-me um pouco com o relacionamento tão amigável delas, Ohana nunca tinha sido assim com nenhum outro profissional. Pra falar a verdade, com ninguém.

-Yoseph: Suas aulas voltam quando? - ele referiu-se a faculdade a loira.

-Ohana: Ainda está distante. - ela respondeu calma. -  Semanas, eu diria.

-Yoseph: Não vai querer fazer nenhum viagem neste período? - ele questionou curioso, visto que, ela adorava sair gastando por aí.

-Ohana: Talvez. - respondeu duvidosa. - Eu ainda não sei.

-Yoseph: Espero que saiba que... aonde quer que vá... - ele fitou-a pela primeira vez. - Ela vai com você. - salientou a ruiva. - Sei que gosta a sua privacidade, mas eu gosto muito mais da sua educação.

-Vicente: Você melhorou... - vi Vicente soar com muito convencimento. - Seja lá o que essa aí fez.

-Ohana: Será que dá pra você ter um pouco de respeito? - ela indagou rapidamente. - Não está falando com as idiotas que você arranja por aí.

-Vicente: Eu devo chamá-la como? - ele questionou provocador e vi papai olhá-lo inconformado.

-Ohana: Você tem um vazio terrível ainda dentro, Vicente. - ela mostrou-se provocadora também. - Sente uma falta terrível de algo que nem sabe explicar. Talvez seja de você. De quem você era antes de se tornar um fantasma de si mesmo.

Ohana levantou-se com precisão, a vi ajustar o robe e sequencialmente se destinar para longe. Larissa seguiu-a com vagareza, mantendo as mãos entrelaçadas e o olhar atento.

-Yoseph: Precisa de uma terapeuta... ou psicóloga? - papai sugeriu calmo demais, para devida situação. O vi colocar a xícara de café sobre a mesa de centro e inclinar-se para Vicente. - Ou vai precisar que eu esfregue sua cara no chão até que enxergue a consciência outra vez?

Vicente permaneceu calado. Ainda o temia, papai não costumava passar a mão em nossas cabeças, isso fazia-nos o temer, e assim, a ter respeito. Nossos avós, os vivos ao menos, odiavam seus atos tão brutais e grosseiros, e confesso que se a mamãe ainda estivesse viva, também odiaria. Mas para ele, a violência gerava medo, e medo era respeito.

-Yoseph: Tem tratado sua irmã com demasiado desrespeito, e eu não tolerarei isto. - ele soou ríspido, segurando-o pela mandíbula, como um garotinho idiota.

Acomodei-me mais no sofá, confesso que meu interior todo pedia que ele subjugasse Vicente a tais atos, ele vinha sendo um tremendo babaca. Ohana o amava mais do que ninguém, ele era literalmente o mundo dela. Desde a infância, sempre teve maior conexão com ele, por um tempo isso até que me afetou. Entretanto, agora ele vinha colocando-a emocionalmente contra a parede, maltratando-a de formas vastas e doentias.

-Yoseph: Existem três tipos de pessoas no mundo... - ele pressionou o maxilar do meu irmão com ainda mais força, o fazendo arfar em dor. Vicente logo ficou de pé, e papai o olhou nos olhos ainda mantendo a postura e a rispidez. - Ovelhas... Lobos e pastores. - era uma velha história, de infância, lembro-me claramente te já tê-la escutado uma vez, na voz doce e suave da vovó. - Algumas preferem acreditar que o mal não existe no mundo. Mesmo que o encontrassem não saberiam como se proteger. São as ovelhas. - ele soou didático, tranquilo. Já Vicente, postava-se inquieto, o apertar em sua mandíbula o incomodava demasiadamente. - Os predadores, usam violência pra vitimizar os fracos. São os lobos. E aí tem aqueles que foram abençoados com o dom da agressão... e a necessidade avassaladora de proteger o rebanho. Esses são de uma raça rara e vivem pra confrontar os lobos. São os pastores.

Ele empurrou Vicente ao chão, vi meu irmão deslizar por meros centímetros e apoiar o corpo com as palmas ao chão. Ele rapidamente levou a destra ao rosto, a medida em que papai se mantinha de pé, o encarando.

-Yoseph: Não criei nenhuma ovelha nesta família. - ele disse paciente. - E vou acabar com a sua vida se você virar um lobo...

Papai ajoelhou-se o agarrou pelo pescoço, como se fosse um bonequinho de pano, e eu sorri ladino. Vicente arfou pesado, encarando-o já com ira, e papai deferiu-lhe um tapa no rosto com extrema precisão.

-Yoseph: Cuidamos dos nossos. - ele proferiu com cautela, com paciência. Ainda que seus atos físicos não demonstrassem isso. - Independentemente do que tenham feito. Resolvemos nossos problemas em casa, e não os apunhalamos pelas costas. Se intimidar sua irmã mais nova, uma outra vez... - papai disse-lhe bem próximo ao ouvido. - Juro que acordará na manhã seguinte sem visão, sem dentes... e com um corpo extremamente marcado. Vicente... eu não estou brincando.

Larissa:

Ela estava chateada, isso era mais que óbvio. Acho que aquela tinha sido a razão da sua crise, bem, ela tinha preferido por não contar-me o motivo.

-Ohana: Senta comigo. - ela pediu baixinho, e eu sentei-me a mesa, com ela. - Quer? - ofereceu-me o recém pedido chegado. Eram... donuts de uma cafeteria bem conhecida na cidade.

Eu aceitei, e ela sorriu quase imperceptível. Ohana não olhava-me nos olhos, parecia entreter-se com as cores saturadas do adocicado decorativo.

-Larissa: Não gosta nada disso, não é? - perguntei baixinho e ela assentiu milimetricamente.

-Ohana: Nunca... estivemos assim. - ela respondeu baixinho. - Ele nunca me tratou assim.

-Larissa: Bem, sempre há uma primeira vez para tudo. - ela sorriu ladina. - Vai ficar tudo bem, você vai ver.

-Ohana: Eu não... não espero mais por isso. Vicente... tem dado espaço a uma parte dele que nunca idolatramos, isso tem tornado-o consequentemente em tudo que odiamos. Digamos que... ele tem tentado fugir do que o atormenta, e cada vez mais tem expressado essa dor em atos físicos que nos machucam emocionalmente.

-Larissa: Ele precisa de ajuda. - eu disse baixinho. - Não deve se submeter nunca a isso, mas... acredito que não deveria guardar rancor dele. - a aconselhei calmamente. - Desculpa se estiver me envolvendo em algo que não me cabe.

-Ohana: Não... - ela segurou minha mão sobre a mesa. - Adoro ouvir você. - ela sorriu e seu olhar tornou-se denso em frações de segundos. - Lari... você significa muito pra mim. Muito.

Ela olhou em volta e depois inclinou-se em minha direção. Senti seus lábios macios tocarem meu rosto em um selar demorado, e posteriormente aproximar-se do meu ouvido.

-Ohana: Eu me apaixonei por você. - aquele confessar me fez arrepiar por inteira, tanto que foi inevitável não fechar os olhos. - Por tudo em você.

Ela se aproximou um pouco mais, e senti seus dedos colocarem-me alguns fios atrás da orelha, enquanto sua respiração morna ainda ia contra minha pele. Seu perfume inebriava-me, seu toque me acalentava e seu corpo todo parecia deixar-me vibrar em sincronia.

-Ohana: Eu não posso mais guardar isso só pra mim. - dissera em sussurros. - Há uma parte minha que pertence a você, gostaria que soubesse disso.

A olhei paciente e vi seus olhos brilharem, um sorriso ladino escapar e inevitavelmente arranquei-a um selinho.

-Ohana: Você acidentalmente salvou a minha vida. - ela sorriu fraco. - E esse contato que eu julgava absurdo, em pura rebeldia... trouxe-me a parte mais linda da vida, Lari. Eu sou grata por te ter por perto. Lembre-se disso.

Í𝔫𝔣𝔦𝔪𝔬 𝔡𝔢𝔩í𝔯𝔦𝔬 - ᴏʜᴀɴɪᴛᴛᴀOnde histórias criam vida. Descubra agora