Capítulo 22

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• Fernando •

Áurea: Seus pais, nunca ouvi falar deles. — A mulher simplesmente ama conversar e eu estou sem nenhum drinque, desesperado em saber se a florista esconde escândalos de noivos traidores. Encaro a tela do celular com o "ok" de Sorocaba e guardo o aparelho, ante a sobrancelha erguida de dona Áurea em nítida reprovação.

Sinto-me no jardim de infância indo para a diretoria por ter puxado o cabelo de alguém. Quando regredi toda uma vida?

Fernando: Minha mãe mora no interior e meu pai faleceu. — Não há muito o que falar, pois destrancar certas portas libera a parte que eu mais odeio em mim: a fragilidade.

Áurea: Sinto muito.

Fernando: Tudo bem. Não éramos próximos. — Minto.

Áurea: Minha irmã também se foi. — Ela se refere à mãe de Maiara. — Almira e Marco César se foram cedo demais e me deixaram esse doce de menina para criar. Espero que sejam felizes como eles foram. — Ela deseja e noto quando Maiara baixa o olhar. É tudo uma farsa e os desejos de Áurea são em vão. — Eles foram corajosos em ter um casamento de mentira, se casaram somente para Almira sair da casa dos pais, mas no final, acabaram se apaixonando, logo Maiara nasceu, e foram catorze anos felizes. — Áurea conclui. — Minha família deve ter um parafuso a menos. Graças a Deus isso parou com Almira. Deus me livre passar por aquilo de novo!

Maiara: Deus nos livre, não é tia?! — Ela ri de nervoso cru.

Áurea: É como dizem: "um raio não cai duas vezes no mesmo lugar."

As horas passam e Maiara tenta me livrar quatro vezes, levando com um sorriso todas as reprimendas que a tia dá.

Maiara: Tia, ele precisa ir, é sério. — A mulher é persistente, pois eu já desisti. Acredito na teoria de que se não parecer interessado, Maiara entrará no primeiro voo para outro estado.

Áurea: Sim, sim. Eu mesma preciso descansar. Mas antes, Fernando. Preciso saber. Todos ficam falando para lá e para cá que vocês estão noivos. Até na sua casa, de homem solteiro, diga-se de passagem, essa menina entrou. Então, ficarão noivos?

Fernando: Essa é a ideia. — Digo, sucinto.

Áurea: Quando?

Maiara: Como assim, quando, tia?

Áurea: Ora bolas, quando? Data, calendário gregoriano. O que deu em vocês? Ficam repetindo minhas perguntas como se estivessem... vocês não estão bêbados, não é? Maiara? É o quê?

Maiara: Tia! Céus! Não, não estamos. Apenas é a primeira vez que você o vê, acaba de conhecê-lo. Estava com dúvidas horas atrás. Então não preciso me apressar.

Áurea: Você não, mas ele? — Ela me encara.

Fernando: Não, também não.

Áurea: Não está ansioso para viver ao lado da Maiara pelo resto da sua vida?

Fernando: Não disse isso, eu apenas acho que estamos apenas no início, não precisamos de pressa.

Áurea: Então, suas palavras foram apenas isso? Sem intenções bem claras?

Fernando: Capciosa! — Acuso-a e ela ri. — Poderia leva-la em uma mesa de negociações, dona Áurea.

Áurea: Sua avó estaria ocupando a cadeira, afinal vocês são as raposas. — Ela se diverte. — Bem, não vou apressá-los. — Diz simplesmente. — Stella já me contou que vocês têm pressa. Algo sobre a inevitabilidade do amor. Não sei por que você está fazendo esse drama, Maiara. Mas, não esqueçam que as famílias devem se conhecer antes. Temos costumes, rapaz. Espero que você não se esqueça.

Maiara: Acabou? Que tal dormir, descansar que amanhã sua agenda está cheia. — Maiara arregala os olhos, como se eles tivessem muques e fossem capazes de empurrar a tia para longe.

Áurea: Verdade. — Ela decide enfim. Preciso descansar, pois amanhã Stella e eu temos muito o que fazer na igreja. — Ela diz, como se nós não soubéssemos que metade dos afazeres se resumem a destrinchar minha vida e a de Maiara. Minha avó espertamente esquece do contrato nessas horas. — Bem, foi um prazer conhecer você, Fernando e ver que metade do que escrevem é mentira. Espero que continue sendo, não é?

Ela diz e sai andando para o interior da casa, deixando-me aturdido e Maiara com a expressão semelhante de quem está à beira do precipício.

Poucas horas com Áurea e eu entendo a apreensão da florista. Eu acho que nunca pensei sobre como posso afetar alguém pelas minhas escolhas. Sempre fui minha única meta, e longe de me sentir egoísta, aprendi a ser assim.

As raposas são solitárias e vivem à espreita em seu benefício. Aprendi a ser perspicaz, a me livrar de situações difíceis e a sobreviver sozinho. Quando minha avó se fechava em seu mundo, diante da solidão do seu casamento, eu estava só do outro lado, aprendendo a sobreviver.

Quando meus pais pareciam que iam se matar em uma briga, eu continuava minha caminhada solitária. Cresci apesar de todos eles, e por mais que ame muito minha mãe e avó, mesmo elas não seriam capazes de me fazerem abrir mão de algo.

"Ela faz tudo por amor". A voz de minha avó Stella ecoa na minha lembrança.

Um Contrato de NoivadoOnde histórias criam vida. Descubra agora