Capítulo 102

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• Fernando •

Minha direção é tranquila quando volto para casa. O sussurro violento do vento entra pela janela, enquanto empreendo velocidade até a minha Maiara.

Minha. Agora posso dizê-lo, pois abandonei todo engano com que apareci diante dela. Em cada mão uma maldição. Um contrato carregado de mentiras e toda feiura que um Zorzanello carrega no sangue maldito. Na outra, minha ignorância acerca do amor que ela me ensinou e toda a culpa que lancei sobre ela.

Ao longo desse tempo eu fui mais um nó que a impedia de mover-se livremente e cada passo que ela deu para longe, era pela sua própria sobrevivência. A chave para o coração de Maiara é deixá-la forte, inteira e completamente segura de que ninguém mais poderá prendê-la. Enquanto resolvia a questão na empresa, minha mente debatia sobre quais armas usar para pedir passagem sem sentir que arrombava e usurpava qualquer espaço no seu coração.

O tempo se detém quando vejo-a olhando São Paulo sob seus pés, pela janela. Ainda de costas, posso ouvir os ecos que logram saltar o espaço e alcançar o outro. Ecos de amor, talvez, capazes o bastante de romper o natural e guiar-nos para coisas inexplicáveis, como sentir-nos à distância.

Ela detém, tornando-se uma expectadora dos passos que me levam até ela. Entre nós, somente esses ecos, silenciando a existência humana ao nosso redor. Apenas nós dois e todas as palavras que ainda não dissemos.

Todo o amor que ainda não vivemos e a saudade que enfim deixa de nos dilacerar. Eu não perco mais tempo, além de todo aquele que já se foi. Tomo sua mão em uma delicadeza que somente existe no segundo inicial e envolvo Maiara em um aperto com sabor de infinito.

Eu a encontraria, ouviria, falaria e, então, eu poderia finalmente tê-la em meus braços sem sentir algum resquício de culpa. Mas apenas existe um culpado se há quem o condene. E não é o que ela faz nesse momento.

Fernando: Eu estou aqui, meu amor.

Basta apenas um sinal. Minhas mãos desenham o contorno do seu rosto, freando o tempo. Então desaceleramos e deixamos o mundo correr sozinho. E é nesse amar lento que eu a tomo em meus braços.

Fernando: E eu vou te beijar, vida.

Apenas aviso, para logo tomar-lhe o fôlego como se dela decorresse todo o meu oxigênio. Beijo-a irracional, seguindo apenas o passo e compasso do seu próprio coração, perpetuando o instante para que ele não se acabe. Envolvemo-nos em uma morte lenta.

Toco-a como se estivéssemos em uma dança que somente nós conhecemos a música e não resta uma gota de compaixão quando eu a reivindico. Exijo. Possuo.

Fernando: Me perdoa. — Sussurro ao seu ouvido. — Me perdoa, amor.

Maiara: Não percebe que há muito eu o perdoei? — Questiona segurando meu rosto e apoiando-se na ponta dos pés.

Todo plano se vai como levado por um temporal e eu apenas consigo tomá-la e provar da sua boca. Eu a beijo como há muito queria, não como aquele sabor que tivemos quando nos beijamos no banheiro da suíte em meio a minha crise.

Ali ela me curava da pior dor que eu já senti.

Aqui, eu apenas a amo. Tal como uma vela que começava a se apagar, sinto o meu interior reacender nas mãos da feiticeira, que me leva ao seu bel prazer. A boca macia geme contra a minha e minhas mãos desesperadas apertam sua pele e parecem lutar contra ela, quando na verdade apenas se rendem. Minhas mãos, minha boca e meu coração completamente rendidos.

Maiara: Fernando... — encosto minha testa contra a sua, tentando recuperar um pouco de consciência, apenas por ela, pois eu ficaria em seu sabor pelo resto dos meus dias e morreria feliz por isso.

Um Contrato de NoivadoOnde histórias criam vida. Descubra agora