Capítulo 25

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• Maiara •

O clima pesou e aquela leve interação que tínhamos se esvaiu ao longo dos dias. Mas não tenho tempo para pensar em Fernando, quando preciso organizar minhas finanças para incluir Tadeu. O silêncio dele é fundamental, pois se ameaçar minha amiga, não pensarei duas vezes antes de jogar o contrato pelos ares e me vincular a ela na cara e na coragem, apenas para fazer aquele infeliz ir para o inferno.

Depois de algumas noites insones em preocupação e o projeto de jardinagem de Stella ganhar forma, nós finalmente nos juntamos para iniciar a execução. Apenas não esperava que aquele almoço em particular contaria com tanta gente.

Stella tenta manter a animação, principalmente ao perceber o distanciamento entre Fernando e eu. Agda também se tornou menos receptiva e penso que o laço de sangue para ela é mais importante que tudo.

De início, achei que ela seria menos parcial, mas contar com a sorte foi burrice. Ela é uma pessoa incrível, mas...

O clima tenso torna indigesta a refeição em "família". Em minha vida, reuniões familiares sempre representaram riso, conversação e acolhimento. Provavelmente, meus pais brindariam até mesmo com café o fato de eu ter achado alguém. Mas o homem diante de mim apenas aposta que o neto irá falhar, que eu arruinarei tudo e que juntos não somos o bastante.

A prima me olha como quem irá ruir sua família e a avó pensa vorazmente como arrumar essa bagunça.

De fato, eu agora entendo o motivo de Fernando ter optado por um contrato, e por mais absurdo que eu continue achando, faz sentido. Tanto que a avó o ajudou. Melhor ter uma noiva falsa do que uma noiva por obrigação.

Melhor uma noiva falsa que seguirá ao seu lado, mesmo quando ele é um cretino que acha ser mais importante um contrato, do que a segurança de uma pessoa que importa para mim. Se fôssemos noivos de verdade eu já o teria mandado para o quinto dos infernos.

Mas não. Eu irei embora quando a turbulência passar, enquanto uma noiva obrigada permaneceria em um casamento infeliz ao lado de um homem que só pensa em negócios e em mulheres pelo resto da vida. Uma mulher que na velhice teria os olhos tristes de Stella Zorzanello. Ou o sufocaria enquanto dorme, que é exatamente o que tenho vontade de fazer agora.

Analisando a relação daquela estranha família, enquanto bebia mais uma taça de vinho, entendi que Fernando jamais se relacionaria com alguém de propósito. Ele não precisava dizer, bastava olhar o casal na nossa frente.

Fernando: Quer carona? — Ele me oferece. Seu tom de voz é afável, mas reconheço que ele está mais objetivo agora do que quando me contratou.

Maiara: Não, vou encontrar com minha tia. Não vou tirar você do seu trajeto. — Tento sorrir, mas devo estar parecendo o Coringa.

Stella: Eu a levo, querido. — Stella sorri com aquela cara de quem maquina ideias mirabolantes.

Fernando: Tudo bem. — Ele se levanta e toca os lábios fugazmente em minha testa e sai em seguida.

Agora somos oficialmente dois desconhecidos e isso me incomoda. Não deveria.

Dona Stella desconhece limites, enquanto me arrasta pela cidade para decorar o apartamento de Fernando para a sua "versão noivo".

Mas, eu também não quando decido fazer a mudança hipotética sendo apenas eu, com flores, porta-retratos e tudo o que há de melhor para mim.

Para um apartamento tão impessoal, não é como se eu estivesse destruindo alguma decoração. Pelo contrário, salta aos olhos minha presença no lugar. É o que ele queria, não é? Que aguente!

Mas, como eu disse, Stella não conhece limites! Não, ela não desconhece, ela olha bem nos olhos dele, ri, zomba e escarnece, enquanto chuta ele para o cantinho. E o golpe foi certeiro quando nos obrigou a tirar fotos apaixonadas, pois, por óbvio, não temos nenhuma juntos.

"Vocês precisam mostrar que estão juntos há algum tempo. Nenhum casal de verdade deixa de registrar momentos juntos". E foi assim que entre a praia e o jardim, fomos obrigados a fingir amor, quando sequer nos falamos.

Estou trocando de roupa em seu apartamento, quando vejo a fumaça fedida esvoaçante na varanda, espalhada pelo vento. Fernando traga o charuto com satisfação, taciturno e preso em seus pensamentos.

Será que o que eu fiz foi tão errado assim?

Maiara: Vamos continuar assim? — Não seguro a língua, interceptando-o de sua fuga.

Fernando: Assim como? — Ele responde em voz baixa, sem me encarar, inspirando fundo quando eu me aproximo. Ele tem um "toc" com cheiros?

Maiara: Fernando, eu errei. Mas para com essa coisa... isso que está fazendo. É sua prima quem soube, não toda humanidade.

Fernando: É o meu negócio que você arriscou.

Maiara: Era a minha amiga que estava em risco.

Fernando: Claro, levando o lixo!

Maiara: Ela não...! — Seguro a língua. Ele tem razão. No ponto de vista dele, a imprudência de Biah colocou a coisa toda em risco. Mas apenas nós duas sabemos que não houve imprudência.

O risco é real.

Tadeu é real.

Fernando: O que?

Maiara: Não foi intencional. Só é estranho fingir o tempo todo, quando você parece querer me matar a cada segundo. Não facilita as coisas. Podemos apenas... a gente pode ser civilizado, não?

Fernando: Sou civilizado.

Maiara: Como uma raposa selvagem. — Critico. — Sejam felizes, você e sua fumaça. Estou indo. Saio caminhando até a porta e ouço-o bufar quando me segue e as chaves farfalham indicando que irá me levar. Não discuto, pois essa rotina estranha parece normal e eu estou exausta demais para debater.

Assim que o motor de um carro da cor da noite vibra, ligo o som nas alturas, sem sequer perguntar. Se ele gosta do silêncio, sinto muito. Eu amo barulho. A expressão dele se fecha imediatamente, como se me julgasse por estar levando tudo na brincadeira. Ele não faz ideia do quanto perdi e não é um negócio de bilhões que vai me fazer perder o bom humor.

Ele me deixa em casa, e quando eu saio do carro, ouço-o me seguindo a passos firmes. A ideia era sair e entrar sem sequer dar boa noite. Se ele pretende ser mal-educado, eu o acompanho. Não vou gastar minha educação com alguém que está de birra. Ele simplesmente decidiu ter raiva de mim e eu posso aceitar isso. Ele me paga, me odeia e me aguenta.

Maiara: Pode voltar para o carro. Não é como se eu fosse me perder aqui.

Fernando: Mulher teimosa! — Fala para si mesmo, irritado e esfregando a mão na nuca. — Dei duro neste contrato e não é fácil vê-lo ruir por um erro como esse. — Ele solta quase em desabafo.

Maiara: Não ruiu.

Fernando: Não. Apenas não gosto dos riscos. Confiei em você e espero que não tenhamos mais outro.

Maiara: Não teremos. Eu mesma vou garantir isso. — Afirmo em um sorriso que me custa, pensando na minha nova conta de dez mil dólares por culpa de Tadeu.

Fernando: Faça o que tem que fazer, Maiara.

Maiara: Não se preocupe, Fernando. Aprendi com o melhor, não é? — Rio sem graça e entro pelo portãozinho, antes que minha expressão delate que o problema é maior do que ele imagina.

Se ele descobrir sobre Tadeu é capaz de culpar Biah, ao invés de condenar aquele imbecil por nos chantagear. Onde se meteu aquele Fernando do bar com cara de herói?

Vejo apenas essa dureza, como se a intenção dele fosse, de fato, manter-se o mais afastado possível. Como se eu fosse uma doença e ele não tivesse a cura. E me incomoda demais perceber que essa atitude dele se tornou um problema para mim, pois não somos um casal apaixonado e se ele quiser nunca mais sorrir, o problema não é meu.

Um Contrato de NoivadoOnde histórias criam vida. Descubra agora