Abro os olhos devagar, minha cabeça está pesada e a claridade me incomoda, tento erguer a mão para passar pelo rosto, mas não consigo.
— Como se sente, amor? — Nicole se aproxima e praticamente encosta seu rosto no meu.
— O que aconteceu? E o que está fazendo aqui Nicole? — Novamente tento erguer a mão, na intenção de afastá-la, mas não consigo e me dou conta de que estou preso... — Você mandou me amarrarem? Já não basta terem me apagado? Manda virem me soltar agora!
— Calma amor, por favor... — Ela segura em meu rosto. — Me escuta... Eu não... — Ela começa a chorar, e que merda! Não posso nem abraçá-la, apesar de estar sendo grosseiro, estou muito feliz e aliviado por ela ainda estar aqui.
— Não chora! Por favor... — Começo a chorar também, estou um misto de emoções, estou irritado, bravo, e ao mesmo tempo grato por ela permanecer ao meu lado. — Não aguento te ver sofrendo por minha culpa.
— Então não me mande mais embora, até porque eu não vou a lugar algum. Você está com dor? — Ela acaricia meu rosto.
— Não, mas quero que me soltem.
— Amor, o médico não vai permitir isso agora, não fui eu que mandei fazerem isso, eu tive que concordar e autorizar, mas juro que não queria, relutei e questionei se não havia outra forma, argumentei que não era necessário, que foi apenas um pico de estresse que fez você agir daquele modo, mesmo assim, ele disse que para sua segurança isso era necessário. Pela manhã vem um psiquiatra te avaliar e ele decidirá como proceder com você.
— Mas eu não sou louco!
— Eu sei amor, tenho certeza que quando ele te vir, vai concordar que não há necessidade disso. — Ela continua me acariciando e ainda chorando.
Respiro fundo por um momento, tentando assimilar tudo o que aconteceu, minhas lágrimas rolam e eu sei que tenho que reconhecer que me descontrolei, mas porra! Deixei de me sentir homem com o que aconteceu. Olho para Nicole que permanece me olhando, movimento um pouco a cabeça e beijo a mão dela que está em meu rosto.
— Me perdoa, eu sei que estou errado, não quero me separar de você, eu te amo, te mandei embora e me desesperei por pensar em ficar sem você, juro que vou tentar me controlar.
— Está tudo bem Noah, eu não vou a lugar algum, eu te conheço, sei que foi o desespero que te fez agir daquele modo, e minha aflição foi justamente por não conseguir e não poder te abraçar e te confortar. Mas agora chega desse assunto, descansa, foram emoções demais por um dia.
— Que horas são?
— Duas da manhã.
— Deita aqui comigo? Sei que não mereço seu carinho e não posso te abraçar, mas quero te sentir abraçada a mim.
— Vou levar bronca de manhã, mas você merece sim todo o meu amor, vou deitar.
Ela se ajeita como consegue e começa a me acariciar, eu choro e ela também, mas não dizemos mais nada, apenas permanecemos assim. Não conseguimos dormir, eu por estar sem sono e Nicole certamente por toda a situação, ela levanta quando uma enfermeira entra.
— Desculpe, não queria assustá-los, vim verificar o paciente.
— Tudo bem, ele acordou de madrugada ainda, mas como não estava sentindo nada eu preferi não chamar ninguém.
Ela concorda com Nicole e após fazer a verificação de rotina em mim, se retira.
— Nick, estou com sede...
— Vou te ajudar a tomar água, deixa eu sentar um pouco essa cama.
Ela me ajeita e me dá água na boca, não demora, trazem meu café e eu suspiro ao ver que Nicole terá que me alimentar, mas ainda bem que ela não questiona nada, acho que me sentiria muito humilhado se ela perguntasse algo aos enfermeiros. Com toda paciência, ela me dá comida na boca e após alguns goles do chá e alguns biscoitos eu começo a me sentir enjoado.
— Não quero mais, está me embrulhando o estômago.
— Deve ser ansiedade por causa da quimio.
— Acho que sim. Vai comprar algo para comer amor, prometo que não levanto daqui!
— Que bom... Está fazendo piadas, isso é ótimo. Vou buscar algo e já venho.
Ela sai e eu fico pensando na sorte que tenho, se não fosse o amor de Nicole, eu certamente já teria desistido de me tratar, ouço uma leve batida na porta que é aberta em seguida e uma senhora entra.
— Bom dia Noah, sou a doutora Rossi, psiquiatra do hospital, podemos conversar por um momento?
— Tudo bem. — Tento me manter o mais tranquilo possível, mas a verdade é que aquele desespero e angústia que eu estava sentindo ontem, já diminuíram bastante.
— Pode me contar o que aconteceu ontem e porque?
— Eu não sou maluco doutora... — Respiro fundo.
— Eu sei que não.
— Também não quero me matar ou machucar alguém, não sei explicar direito meu desespero de ontem, mas não conseguir fazer amor com minha esposa, para mim pareceu uma sentença de que eu não irei melhorar, pelo menos na hora foi isso que imaginei, não consegui pensar em mais nada, mas eu juro que não quero desistir de me tratar e muito menos quero me separar, eu amo a minha esposa...
— Tudo bem Noah, descontroles emocionais acontecem, principalmente em situações de estresse, vamos fazer o seguinte, eu sei que você está fazendo um acompanhamento com uma psicóloga e seria interessante se ela puder vir te ver, mas enquanto você está aqui, para que eu possa liberá-lo da contenção e manter seu bem estar e segurança, eu venho te ver todos os dias, e também iniciaremos com um ansiolítico leve, tudo bem? Até sua alta voltamos a conversar sobre a sequência do seu tratamento psicológico, mas por enquanto vamos lidando com um dia de cada vez aqui no hospital.
— Não vejo problemas em conversar com a senhora todos os dias, mas esse remédio? Realmente é necessário? Não sou maluco e já estou tomando tanto medicamento por causa do câncer... — Olho para ela na esperança que me libere sem isso.
— É a melhor opção para você no momento, não é questão de loucura e nem remédio para maluco como as pessoas pensam e tem preconceito, ele vai te ajudar bastante, sei que esse processo de tratamento é bastante estressante, encare isso como uma ajuda para você lidar com as emoções enquanto se trata, pode ser?
— Tudo bem. — Acabo concordando e a porta novamente se abre.
— Desculpem, não queria atrapalhar. — Nicole para na porta e eu olho para ela.
— Sem problemas, nós já estávamos encerrando e que bom que chegou, você é a esposa do Noah, correto?
— Sim doutora, essa é Nicole, minha esposa, amor, essa é a doutora Rossi, psiquiatra, ela veio me avaliar.
Nicole cumprimenta a médica e se aproxima pegando em minha mão.
— Bom, gostaria de mais tarde conversar um pouco com você Nicole, podemos?
— Claro doutora, mas e o Noah? Como...
— Vou acompanhá-lo diariamente enquanto ele estiver aqui. — A doutora interrompe Nicole com calma. — Também usaremos um ansiolítico leve, vai ajudá-lo a manter a tranquilidade nesse período de tratamento. Bom, vou resolver tudo e dar meu parecer para liberar a contenção física, te aguardo na parte da tarde no meu consultório Nicole. — A médica se despede e sai, Nicole então senta ao lado da minha cama.
— Está tudo bem com isso que a médica propôs amor? — Ela acaricia minha mão.
— Bem não seria a palavra, mas ela me convenceu que será o melhor para nós no momento.
— Que bom.
Conversamos um pouco enquanto ela toma o café que comprou, até que novamente alguém bate e abre a porta em seguida...
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Depois da Chuva
RomanceA vida fez com que Noah amadurecesse em poucos meses, algo que a maioria das pessoas levaria anos para alcançar. Ainda muito jovem, ele teve que assumir a responsabilidade por sua família e adaptar seus sonhos pessoais a essa nova realidade. No enta...