— Devagar. — Pedi rindo e ele acelerava mais.
— Pra onde donzela? — Ele brincou me indicando o GPS.
— Quer dizer que estamos perdidos?
— Talvez.
— Você não me assusta. — Falei dando de ombros.
— Não? — Ele insistiu na minha certeza acelerando ao último.E para sua grande surpresa eu apenas coloquei a cabeça pra fora da janela e gritei.
Estávamos há 220/h pelos meus cálculos, e aquilo foi a coisa mais incrível da minha vida.É verdade quando dizem que somos instantes. Não importava o que estava acontecendo no lá fora, ele estava do meu lado, a gente estava no nosso mundo, eu estava no meu mundo, e muito bem acompanhada.
— Philips Dinner? — Ele optou por um restaurante na esquina do Central Park assim que diminuiu a velocidade.
— Muito caro. — Falei minha verdadeira opinião.
Os Philips eram uma familia podre de rica que tinham muitos restaurantes espalhados pela cidade, e sinceramente eu tinha certeza que nunca entraria lá.
— Acho que a champanhe de lá compra minha casa. — Continuei.Ele riu, e sua risada foi contagiante.
Eu estava adorando aquilo. Por mais que eu não conseguisse expressar, não havia nenhum lugar a qual eu quisesse estar, se não alí, com ele.
— Eu conheço um lugar. — Arrisquei.
— Torre Eiffel?
— Melhor.
— Agora estou interessado. — Ele usou o sarcasmo.Mostrei o caminho e ele seguiu as coordenadas.
— Por aqui. — Apontei o dedo indicador à uma árvore junto à um poste, em uma rua tranquila.
— O que vai fazer comigo? — Ele brincou ao perceber que não havia movimento algum.
— Vender seus rins, talvez.
— Que? — Ele olhou assustado.
— Qual é, vamos. — Encerrei o puxando pela mão esquerda.Era um parque. Na verdade um parque antigo. Tinha algumas árvores, um balanço enferrujado e logo à nossa vista um córrego e uma ponte. O vento estava frio, 10 graus, eu imagino que fosse. A Lua saía a cima de nós e com um resplandecer incrível.
— Eu esperava. — Ele admitiu e tocou meu ombro, observando o local.
— Está me chamando de estranha?
— Tem algumas caveiras aqui? — Ele analisou os cantos.
— Vem, eu te mostro.Confesso que eu deveria ter o levando pra algum lugar diferente, ou ao menos, ter deixado que me levasse àquele restaurante exótico. Mas, eu não queria nada diferente e elegante, eu queria calmaria, queria a noite tranquila e nada mais, além de nós.
Começamos a caminhar e fomos até a ponte.
— Gostei. — Ele disse observando cada detalhe, principalmente em especial, o tanto de folhas secas no chão.
— É um lugar lindo. — elogiei e ele riu.
— Você tem um toque de mistério. — Ele disse chegando mais perto, e mudando de assunto.
— Impressão sua. — Falei jogando umas pedras soltas do muro ao lago.
— Me fale mais sobre você.
— Não tenho o que dizer, de verdade. Eu sou só uma adolescente ferrada, e deprimida.
— Acho que hoje em dia todo mundo é deprimido.
— Provavelmente.
— Mas, por favor, deve haver mais coisas pra me contar, além de incrível, bonita, gent...
— Certo. — Interrompido por mim, ele ficou em silêncio e eu percebi que o vento ficava mais forte.
— O que quer saber?
— O que quer que eu saiba?
— O quero que saiba o que quiser saber.Ele levou alguns segundos para entender o que eu havia dito, e fez uma careta.
— Adoro trava línguas.
— Rá, rá. Engraçadinho.
— Vai mesmo dizer?
— O quê?
— O que eu quero saber.
— É, acho que vou.
— Porque tentou me evitar?
— Ah, eu sou boa nisso.
— Campeã, eu diria.
— Obrigada. — Reconheci.
— Você sabe que não precisa fazer isso né?
— Isso?
— É isso. Fazer com que as pessoas pensem que você é ruim.
— Talvez eu seja.
— Não vejo ruindade em você.Apenas ergui as sobrancelhas e continuei a atirar pedras.
— O que a gente está fazendo? — comecei uma pergunta desnecessária.
— Como assim? — Ele ficou confuso.
— Aqui, juntos, querendo entender a vida do outro, eu não sei, não sei se deve mesmo saber de mim, não sei. Minha voz foi ficando forte, minha cabeça doía e mais uma vez eu estava estragando tudo. — É melhor a gente ir. — Continuei pondo as mãos na cabeça depois voltando ao rosto.
— Ei, calma. — Ele me abraçou ao perceber que eu estava assustada.A pior crise da minha vida, sem dúvidas. Eu simplesmente estraguei a noite que eu havia esperado que acontecesse.
Eu não podia contar pra ele, não agora. Não queria que ele desistisse de mim, ao saber mais, sobre minha vida, meus caos, minha depressão.Eu sentia minhas veias doerem e minha pulsação aumentar. Imaginei que estivesse com o rosto pálido pois minha cabeça agora parecia que ía explodir.
— Está tudo bem, está tudo bem. — Ele repetia alisando meu cabelo com os dedos.
— Me descupe. — Pedi chorando.
— Não precisa se preocupar. O ano tem 365 dias não é mesmo? E pelo visto ainda não são nem duzentos, temos muitos encontros. — Ele falava me acalmando, tentando me fazer rir.Então é um encontro. — Pensei e sorri entre as lágrimas.
Direcionamos até o carro e ele me levou pra casa.
Eu chorei quase o caminho inteiro, mas em silêncio, em uma briga comigo mesmo.Porquê eu sempre tenho que ferrar tudo? Minha capacidade era extraordinária.
Desci do carro, ele acompanhou. Dei-lhe a chave, ele pegou em minha mão, e abriu a porta.
Seu jeito me acalmava. Uma paz que o mundo me tirou há anos, retornava no momento em que ele se aproximava.— Eu vou fazer um chá. — Ele disse indo em direção a cozinha, ao me deixar no sofá.
— Café. — Optei.
Ele apenas olhou pra trás e concordou.Eu estava deitada no sofá, e escutava atentamente o barulho de talheres vindo da cozinha. Ele tentava fazer o mínimo de barulho possível mas era uma tarefa complicada.
— Aqui está. — Ele voltou com duas xícaras em mãos, me entregando uma.
— Está ótimo. — Fiz um elogio assim que sentei e experimentei.
— Está melhor?
— Sim. — Falei baixo, quase em sussurro.O silêncio era o maior mal entre nós. Eu não falava uma palavra, muito menos ele. Imaginei que talvez eu estivesse o deixado assustado, e isso revirou meu estômago.
— Acho melhor você descansar. — Ele disse sorrindo, e pegando minha xícara vazia pra levar até a cozinha.
Enquanto ele estava de costas pra levar as sujeiras do café eu o observava. Ele estava sendo tão gentil comigo, eu quis mais que nunca, poder tirar aquela maldita doença de mim.
— Acho melhor eu ir.
— Ok. — Foi só o que consegui dizer.Eu não queria que ele fosse. Queria que ficasse, a noite inteira se possível, mas não tive forças pra pedir.
— Ei. — Chamei, antes que ele pudesse fechar a porta ao passar por ela.
— Sim. — Ele disse virando e olhando dentro dos meus olhos.
— Obrigada.Ele concordou e foi embora.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Minhas Marés
Romance[COMPLETO] Com uma vida fora dos trilhos, Carrie entra em depressão. A falta do carinho dos pais afeta sua rotina, mas quando conhece Lowis e se apaixona mais rápido do que imaginou, enxerga a felicidade perto. Contudo, quando a doença começa causa...