Minhas Marés

F E S T A

Saí do banho, e me arrumei enquanto Clair me esperava ansiosa na sala.

— Jura? — Ela  perguntou me olhando com cara de desgosto assim que desci as escadas.
— O quê?  — Me olhei também
— Vai de calça e moletom mesmo?
— Tanto faz. — Dei de ombros.

Ela estava de carro. Não era muito longe, gastamos uns 15 minutos.
A noite estava bonita como sempre. Havia  estrelas quase impossíveis de serem vistas devido a claridade das luzes de toda cidade, mas a frente fria que vinha chegando, me animou.

— Jogue. — Ela pediu apontando pro meu cigarro.
— Sério isso?
Antes que eu pudesse dizer algo a mais, ela pegou o cigarro e jogou.
— Ah, fala sério.
— Não pode fumar aqui, as pessoas são chiques. O pai da Michelle tem dinheiro suficiente pra bancar uma festa pra ela todo fim de semana.
— Deve ser um saco. — Eu ri.
— O que?
— Ser rica e mimada.
— Eu queria, ela tem tantas bolsas da Louis Vuitton.
— São ridículas.
— Droga, você é estranha.
— Ha ha. Diz algo que eu ainda não sei.
— O Lowis não tira os olhos de você, na escola. Vocês estão saindo?
Borboletas acordaram no meu estômago.
— Não. — continuei séria, embora um sorriso estivesse quase exposto.

Era um clube lindo. Havia piscinas, barracas, algumas árvores também. Estava repleto de gente. Garrafas espalhadas pra todo lado. Já eram 11 horas, quando chegamos. Mas pelo visto, estava apenas começando.
Clair saiu me puxando pelo braço enquanto tentávamos passar pela multidão de pessoas  dançando. Nós fomos até as bebidas.
Eram tantas opções de álcool, posto em copos exóticos. Eu acabei opinando por um copo vermelho com vodka azul.
Eu estava um pouco entediada, mas eu tinha certeza de uma coisa.
Essa noite, eu queria muito esquecer quem eu era, o que eu passava, e o que estava por vir. Mas acredite, eu teria tomado muito mais se soubesse o que estava por vir.

Começamos a beber, até que eu avistei o Lowis. Ele estava elegante, de calça preta e uma camisa branca, que me deixou impressionada. Até então ele não tinha me visto, eu tentei me aproximar, devia ao menos um pedido de desculpas por ser tão rude, mas logo vi a "loira", chegando. Ela a usava um vestido vermelho com um decote enorme que provavelmente até eu olharia. Eles ficaram em um grupinho, bebendo e rindo, e eu fiquei odiando a festa por um longo tempo.  Pra piorar minha noite Clair havia sumido.

— Posso te pagar uma bebida? — Um rapaz disse se aproximando o máximo possível.
— Mas  não é grátis?
— É só um pretexto pra ficar mais perto de você.
— Eu não bebo. — Disse rindo irônico e bati meu copo ao dele, como um brinde.

Estava muito chato tudo aquilo, e eu fui pra fora. Não fora de toda a festa.
Fui andar em volta de piscina, fumar, pensar um pouco.
  Depois de dois cigarros sentei em um sofá ao céu livre, e fiquei observando como havia pessoas bêbadas e copos espalhados por toda parte. Cheguei a conclusão de que provavelmente eu não era a única tentando fugir da realidade.

— Aí está você. —  Clair falou se aproximando.
— É.
— Vamos, tenho que te apresentar pra galera.  — Disse pegando minha mão me erguendo rapidamente.
— Espera, eu...

Ela me puxava rápido e forte, era impossível se livrar.
  Fiquei assustada ao ver que ela se aproximava do grupinho da loira, na qual, a Michelle estava com o namorado, Lowis e outras pessoas.

— Gente, essa é minha amiga nova. — Clair disse me empurrando pra perto deles, toda entusiasmada.
— E aí. — Falei sem expressão erguendo uma mão, e querendo desaparecer imediatamente.
— Deus, você não tem nenhum vestido? — a loira disse me olhando e todos riram. Exceto Lowis. Ele me olhava fixamente.
— Oi Carrie. — Lowis finalmente, respondeu e eu fiquei vermelha.
— Peraí, vocês se conhecem? — A modelo loira irritante agora falava com ciúmes.
— Sim Katy. Nós temos algumas aulas juntos, não é?
— Eu assenti, ainda desconfortável.

— O Lowis é amiguinho da gótica gente. — Katy pronunciou e todos riram novamente.
— Vai se foder. — Falei.

Saí imediatamente antes de Clair conseguir segurar meu braço.
  Andei rápido, acendi um cigarro e fui sentar sob a luz da lua novamente.
Eu poderia estar brava com tudo que aconteceu, com a irônica da Katy, ou por estar achando que Lowis estaria namorando ela, por tudo. Mas como eu tinha prometido ter uma noite diferente, tentei manter a calma. Um cigarro atrás do outro. Nada de lágrimas, nem lamentação.

— Até que enfim. — Ouvi uma voz grossa atrás de mim.
Conheci a voz, porém não me virei.
— Andei a festa inteira atrás de você.
— Lowis chegou mais perto, parando na minha frente.
— Eu quero ficar sozinha.
— Não liga pra Katy ela é assim mesmo.
— Dana-se ela. — Dei de ombros.
— Que bom que você veio. — Ele disse sentando do meu lado.

  O cheiro dele chegou instantaneamente em mim. O vento balançava meu cabelo, a noite ficava mais fria e pela claridade da lua eu conseguia enxergar sua boca e  no momento eu não sabia se  sentia raiva ou desejo. Raiva de mim por ter sido patética quando o conheci e por saber que continuaria sempre ferrando tudo, ou desejo por ficar quase sem ar ao fitar seus olhos.
—  Não se importa de estar falando com a gótica? — usei sarcasmo já que era minha única saída.
— Não liga pra eles.
— Eu não dou a mínima.
— Que bom!
— Por que está sendo legal comigo?
— Porque você é legal Carrie, merece reciprocidade.
— Não, não sou.
— Faria diferença se eu dissesse que te acho legal e gosto de estar perto de você?
— Te chamaria de louco.
— E por que?
— O que eu fiz até agora foi só agir como uma tremenda idiota com você, não devia me achar legal.
— Eu sei que estava fingindo.
— Sinto muito, mas vou decepcionar você.
— Eu supero.

Eu fiquei sem palavras. Embora  ele não pudesse ver, minha alma sorriu.
  Eu não consegui responder, só abri um sorriso de canto.

— Tem outro? — Ele perguntou apontando pro cigarro.
— Me criticou tanto, e agora quer fumar?
— Você diz que isso mata, preciso experimentar.
— Aqui. Boa sorte. — Indiquei o cigarro e o esqueiro.

Ele acendeu e começou fumar também.
  Comecei imaginar que ele também poderia ter problemas e eu estava sendo muito insensata.

— O que está rolando entre você e a Katy? — Deixei escapar.
— Ela gosta de mim, mas não faz meu tipo. — Gosto de meninas que me ignoram.  — Acrescentou
— Meninas que te ignoram devem ser meninas complicadas.
— Todo mundo gosta de complicações às vezes.

Estar alí com ele era como estar chapada. Uma sensação boa e inexplicável.

— O que foi? — Perguntei enquanto ele me encarava sem parar.
— Você é tão interessante.
— De novo essa história?
— Não sei explicar, mas não parei de pensar em você, eu quero te conhecer, quero passar mais tempo com você, sabe?
— Não.
— Não o que?
— Não sei.
— Ele riu. — Tá vendo? esse seu jeito, eu gosto.

Nós estávamos muito perto, tanto que, pude sentir sua respiração. Nossa boca quase encostada, sem exitar ele chegou mais perto. Mas fomos enterrompidos.

— Vocês estão perdendo a festa. — Clair chegou gritando, totalmente bêbada, caindo sobre a gente.
— Preciso levar ela pra casa. — Expliquei.
— Tá legal, te vejo amanhã?
— Se tiver sorte não.

Fui me afastando com ela apoiada em meus ombros quando ele gritou.

— Carrie.

Virei imediatamente.

— Gostei que veio. — Ele disse sorrindo.

Algo no sorriso dele me fazia perder o ar. Algo naquele olhar me fazia acreditar que nem tudo estava perdido.

Coloquei-a no carro, peguei a chave e fomos embora. Eu não sabia onde ela morava, então, fomos pra minha casa. Afinal, no estado que ela estava, nem ela saberia da própria casa.

Coloquei ela em um colchão no chão ao lado da minha cama, vesti meu pijama e fui dormir. Mas antes de pegar no sono, pensei nele por alguns segundos, e tive a certeza que também queria conhecê-lo.