Capitulo 47

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Gabriella

— Como você vai pagar? — minha mãe questiona tristemente.

— Consegui um empréstimo. — omito a parte de que o Matteo está por trás disso, até porque a sua reação aquele dia sobre ele foi bem estranha e não quero que ela se exalte ou volte a ficar com aquela raiva descontrolada. Não sei até que ponto foi apenas suas memórias a confundindo ou se existe, realmente, alguma outra coisa a mais e não pretendo falar sobre isso agora. Não com ela.

Não gosto disso, Gabriella. — diz — Estou te enchendo de problemas. — murmura chateada.

— Não repita isso nunca mais. — retruco séria — O mais importante é a sua saúde e não o dinheiro. — como se estivesse envergonhada, ela sorri de um jeito sem graça e abaixa a cabeça — Olhe para mim. — digo baixo e seus olhos se levantam e encontram os meus — Eu faria qualquer coisa porque te amo muito.

— Eu também. — sussurra com a voz embargada e meu coração, uma parte dele se estilhaça pela forma como seu corpo se inclina, parecendo derrotado e isso machuca tanto, dói por pensar que acredita ser um fardo e não uma benção na minha vida.

— A senhora entende que é para o seu bem, certo? — passo a mão por seus cabelos e sorrio.

— Sim. — responde — Eu me sinto diferente há algum tempo mesmo. — confessa — Preciso de ajuda, pequena.

— Sim e é isso que estamos fazendo, mãe, mas não quero que pense que não é amada ou que estou te abandonando, pelo contrário. — ela retribui meu sorriso e sinto as lágrimas arderem meus olhos, quando percebo o quanto ela é forte, o quanto continua perfeita mesmo em volta do caos.

Quando sentamos no quintal ontem a tarde, com um pano jogado sobre o gramado e o sol brilhando em nós, contei tudo a ela. Fui minuciosa sobre a sua condição e o que poderia ser feito para que ela se sentisse melhor, aonde ela precisaria ficar para não se machucar e que teria toda a ajuda e apoio do mundo. Mostrei os exames e as receitas e despejei toda a verdade. A porcaria da verdade que destrói sua sanidade a cada minuto. Seu Alzheimer.

Eu chorei muito. Ela nem tanto. Não posso dizer se entendeu a realidade disso tudo ou se apenas encontrou força na sua fé, porque apenas sorria e dizia que tudo ficaria bem. Espero que sim.

A cada roupa que ela colocava na mala, eu chorava. 

Cada foto que ela escolhia e perdia um instante observando, eu chorava.

Cada vez que seu olhar se demorava pelos seus pertences, eu chorava.

— Você estará seca em alguns segundos se não parar com essa cachoeira. — Como ela pode estar tão tranquila? — Não estou indo para o Japão, menina. — diz divertida — São apenas alguns quilômetros, poderá me visitar quando quiser.

— Irei todo maldito dia. — digo.

— Não diga essa palavra feia. — me repreende e eu choro novamente. Meu Deus, estou um desastre absoluto.

Ontem de madrugada, quando tudo já estava quieto e eu não conseguia lidar com o barulho dentro de mim, sai pisando leve do meu quarto e desci as escadas. Sentei no sofá e sofri sozinha ao ver suas malas na porta. 

E como se eu fosse transportada para a minha infância, lembro de apenas me importar com o horário que os cookies ficariam prontos, a hora em que eles ainda quentinhos eram colocados sobre a mesa e o cheiro do chocolate empesteava todo o ambiente. O cheiro daquela felicidade simples, com nossos aventais sujos de farinha e a cozinha uma completa zona, enquanto minha mãe gargalhava e apontava para mim, rindo do bigode que o leite deixava na minha boca. 

Merda. Eu não estou bem.

Não sei em qual momento peguei meu celular e liguei para ele. Não sei, com exatidão, dizer quando meu coração ansiou por ele ou quando meus pensamentos, que estavam caminhando em direção ao abismo, procurou por ele querendo ser salvo.

— Matteo? — digo e me surpreendo por ser atendida a essa hora. 

— Aconteceu alguma coisa? — pergunta com a voz rouca.

— Acordei você, me desculpa. — peço constrangida e me sinto uma idiota. Por que diabos fiz isso?

— Sim. — ouço seu riso baixo do outro lado e um calor percorre meu corpo ao ouvir seu timbre — O que aconteceu?

— Conversei com a minha mãe sobre a clínica. – inspiro profundamente e continuo — Foi difícil. — concluo.

— Agora? — questiona — Poderia ter feito isso durante o dia, foguinho.

— Não agora. — minha risada preenche a quietude a minha volta e sei que fiz o certo. Esse cara melhora tudo.

— Bom. Fiquei assustado, garota. — ri novamente — Foi ruim assim? — pergunta.

— Para mim. — murmuro — Ela até que se saiu muito bem. — explico.

— Posso ir até ai, se quiser. — diz — Consolar você e tal ... — consigo sentir a malícia dele daqui e não seria nada mal, sendo sincera.

— Seria ótimo, quem sabe a noite? — respondo — Porque vamos sair em algumas horas ...

— Claro. — diz sério — Vou transferir o valor para eles e não esqueça de levar o contrato.

Devo a minha vida a esse homem.

— Já está tudo organizado, obrigada, Matt. — agradeço.

— Matt? — repete — Gostei disso, Gabriella. — a vergonha por usar o apelido que só existia na minha cabeça e que falei em voz alta, me faz querer socar minha cara — Quer que eu leve vocês até lá?

— Acho melhor não. — interrompo e o silêncio depois disso é ensurdecedor. Ele não diz nada, o que é ainda mais esquisito, aquele episódio foi completamente bizarro.

Tudo bem. — responde por fim — Tente descansar um pouco, posso cantar para você dormir ... — a risada alta que vibra da minha garganta é o suficiente. Ele é a âncora que me prende, que não me deixa desmoronar e não sei como alguém, em tão pouco tempo, pode se tornar tanto.

— Boa noite, Matt. — digo e suspiro, me sentindo melhor e mais forte — Obrigada por tudo.

— Boa noite, foguinho. Não me agradeça por nada, é uma honra.

— Você é maravilhoso. — sussurro corajosa.

— Verdade, agora vai dormir. — sorrio de novo e encerro a chamada, sentindo cada fibra do meu corpo mais valente e mais poderoso.

MATTEO  Uma noite * livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora