Capítulo 15

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Gabriella

Nove dias.
Nove dias que Matteo não aparece no bar. Não que eu esteja contando, na verdade, não dou a mínima.

Mentirosa.

Não o vejo desde aquele nosso beijo no carro, o momento que desisti e o deixei se aproximar, desde que senti o fogo que os seus lábios causaram em mim e das suas mãos que incendiaram a minha pele. Desde aquele erro, naquele instante em que me dispensou para poder lidar com alguma porcaria que rodeava na sua mente.

Quer saber? Não vou me importar. Já tenho meus próprios problemas para ficar pensando nos dele.

Passei tempo demais tentando entender o que havia acontecido, se eu tinha feito algo alguma coisa errada, porque aquilo foi bem esquisito. Esperei e esperei, mas ele não apareceu. Talvez nem ele mesmo se importe, por que eu deveria?

- Acorda, garota. - Bianca estala os dedos na minha frente e aponta para a fila que se formou.

- Desculpa. - murmuro e volto ao trabalho.

Pensar tanto assim nele é cansativo. Não vou arrumar desculpas na minha cabeça para um cara que acabei de conhecer. Foi legal a sua atenção, como fez eu me sentir especial, mas acabou. Aliás, o que tinha começado? Por isso, não me relaciono. Emoção demais atrapalha e está me fazendo perder gorjetas.

Uma banda ótima está tocando aqui hoje, o som deles lembra muito o Green Day e estou amando. É um grupo da faculdade bem famosinho na cidade. Nunca havia presenciado um show deles e confesso que me surpreendeu. Os caras são bons.

Passo o resto da noite fazendo tantos drinks, que as pontas dos meus dedos estão ficando congelados. Mal sinto quando seguro uma nota e a jogo dentro do meu avental. Depois que foquei no que realmente vale a pena, meu emprego, as gorjetas aumentaram.
Isso é ótimo.

Paro por um minuto para ouvi-los tocar e pego uma lata de refrigerante. Enquanto levo a bebida a boca, o olhar do vocalista se fixa nos meus e ele sorri ao dedilhar sua guitarra. Ele canta seus últimos versos olhando diretamente para mim e sem jeito, desvio os olhos e me agacho atrás do balcão para guardar meus lucros na mochila.

- Aquele homem é um gato. - Bianca comenta quando me levanto.

- É mesmo. - digo.

- O que você tem, Gabb? - pergunta baixo, preocupada.

- Cansada como sempre. - respondo sorrindo, mas ela me encara e arqueia a sobrancelha.

- Não é não. - diz e se aproxima - É por causa daquele deus não é? - sussura.

Sim.

- Claro que não. - retruco firme - Essa rotina está me matando. Não tem nada a ver com aquele idiota. - minha voz sai mais ríspida do que pretendia e ela sorri. Ela sabe que tem tudo a ver com o sumiço dele.

- Tudo bem, então. - cantarola e se afasta rindo ainda mais.

Você me fez voltar a pensar nele, Bianca. Obrigada.

- Oi.

- Oi. - respondo.

- Uma água, por favor. - o vocalista da banda pede e me entrega a sua comanda. Assinto e caminho até a geladeira.

- Vocês são bons. - comento e entrego a bebida.

- Obrigado. - ele sorri e se senta na banqueta a minha frente. Na banqueta que vinha sendo ocupada por outra pessoa há alguns dias. Ignoro a pontada no peito e retribuo o sorriso.

- Por nada. - digo.

- Qual seu nome? - questiona curioso.

- Gabriela e o seu?

- Luca. Prazer. - ele estica a mão e me observa divertido. Estendo a minha e aperto levemente.

- Nunca vi você no Campus. - declaro.

- Eu já te vi por lá. - sorri abertamente e continua - Você estava andando rápido demais para reparar em qualquer outra coisa ao seu redor. - seu sorriso aumenta e começo a reparar nele.

Seu cabelo escuro está todo grudado na testa, talvez pelo calor infernal que está aqui dentro, misturado com a sua atuação animadora no palco improvisado. Seus olhos são escuros e ele tem algumas tatuagens pelo braço. É uma vista e tanto.

- Estou sempre com pressa. - comento sorrindo - O que você cursa? - pergunto.

- Economia e você?

- Direito. - respondo orgulhosa.

- Meus pais são advogados. É uma profissão legal. - diz.

- Muito. - emendo.

- Mais uma, por favor. - balança a garrafa e pisca.

Com o fim das músicas e o passar das horas, o movimento vai enfraquecendo e esvaziando, tirando a banda, não sobrou muita gente aqui.

Luca ficou a maior parte do seu tempo de descanso aqui comigo. Ele é bom de conversa e educado. Cenas difíceis de aparecer.

- Aonde você mora?

- San Berillo e você?

- Eu também, na verdade, na divisa.

Ele é rico. Claro.

- Não me julga, menina. - gargalha - Meus pais tem dinheiro, eu não.

- Não disse nada. - argumento.

- Nem precisou, você é bem transparente. - comenta rindo - Posso te levar para casa se quiser. - diz sério.

- Claro que não. - digo - Nem te conheço.

- Conhece sim. - revira os olhos e eu sorrio. Ele é divertido. - Sabe que eu tenho uma banda, que curso economia, aonde moro e o que os meus pais fazem.

Justo. Ainda assim...

- Não vou embora agora. - respondo, recusando seu convite.

- Eu te espero. - diz.

Que mal pode ter nisso? Ele não parece um psicopata ou algo do tipo.

- Beleza. - digo - Mas saiba que tenho um canivete na mochila e vou usar se precisar. - ele ri alto e levanta as mãos em rendição.

-  Que Deus me defenda de dar carona para uma pessoa dessa.

- Engraçado. - comento sorrindo.

Luca se despede dos amigos e saímos juntos depois de quase uma hora. Bianca fechou o caixa hoje, então não precisei ficar até o final.

Assim que o ar abafado da noite acerta meu rosto, suspiro aliviada. Fui salva dos caminhos que meus pensamentos me levavam toda noite, Luca me distraiu e isso foi bom.

Levanto o olhar e o vejo.

Matteo.

Tão lindo e tão cretino.

Ele está encostado no seu carro com as pernas cruzadas e as mãos enfiadas no bolso do seu jeans. Ele sorri ao me ver e  quando percebe que não estou sozinha, cerra os dentes e o sorriso no seu rosto morre.

- Foguinho. - ele me chama e preciso controlar as batidas do meu coração. Ouvir sua voz me lembrou do quanto senti a sua falta e uma dor pequena, mas verdadeira, faz meu corpo estremecer com a saudade - Vem, vou te levar para casa. - ele fala comigo, mas seus olhos não estão em mim. Estão em Luca.

Sério? Inacreditável.
Ele não pode simplesmente desaparecer da minha vida e voltar como se nada tivesse acontecido.

- Já tenho carona, Matteo. Pode ir embora. - meu timbre seco e frio, o acerta em cheio. Percebo quando ele encara furiosamente a minha companhia e fecha os punhos ao redor do corpo, batendo a porta em seguida, ao entrar no seu carro e sair acelerado.

MATTEO  Uma noite * livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora