Quando eu acordei naquele dia eu tinha uma baita dor de cabeça. Ainda assim me forcei a me erguer e me juntei ao grupo para planejar o resgate de Anna.
Ultimamente eu andava pensando muito sobre o que era mesmo ser um herói. Porque era tudo que eu queria, mas eu nunca encontrava a exata definição...
Eu me lembrava de quando mestre Issachar dissera em Zalim que não devíamos conhecer nossos heróis, porque na maioria das vezes eles nos decepcionavam. Eu não diria que o Ratel de Zalim me decepcionou... Acho que o que me decepcionou foi a realidade.
Quero dizer, meu plano era ser a grande guerreira Myra Petris, que salvou a princesa, etc, etc. Mas eu nunca havia dado rosto a princesa. Ou nome. Ou voz. E agora que Anna tinha rosto, nome e voz no meu coração eu preferia que ela nunca estivesse em perigo, mesmo que isso significasse não "salvar a princesa".
Eu pensava sobre essas coisas quando prometi a Dishi que salvaríamos a todos. Mas quando o Ruivo me perguntou o que eu faria se todos já estivessem mortos, eu não sabia bem como responder. Porque não havia passado pela minha cabeça antes que isso poderia acontecer, e que as pessoas poderiam morrer assim.
A história de um herói parecia menos heróica quando eu pensava nesses detalhes.
— Tudo bem? — A voz do Ruivo perguntou, mas não ergui meus olhos para fitá-lo.
Todos deviam achar que eu deixei a taverna por alguma birra, mas na verdade eu só estava triste.
Eu pude ver os pés do ruivo parados na minha frente e acabei erguendo a cabeça para vê-lo, apesar de me sentir sem energia para discutir.
— Tô bem. — Eu disse, quase sem humor.
— Eu sei que você quer salvar todo mundo, mas nem sempre a gente consegue. — O Ruivo falou, o que era difícil de engolir.
— Vocês são muito frios... Não se importam com o sentimento das pessoas? — Perguntei.
O filho do magistrado estava chorando, mas eles continuaram imparciais. Eu sabia que era pra eu ter sido imparcial também, só que se eu pensasse sobre como não conseguiríamos salvar a mulher de Dishi, teria que pensar também sobre como poderíamos acabar não conseguindo salvar Anna.
O Ruivo tocou o meu rosto com carinho, mas bati na sua mão, empurrando-a pra longe. Volvi meu olhar para a porta num reflexo, pra ver se ninguém tinha visto aquilo. Eu claramente não tinha orgulho da intimidade que dei àquele ruivo. O fitei e soltei um suspiro quando ele perguntou:
— Está falando deles ou está falando de mim? — Ele quis saber com uma tranquilidade invejável.
Sobre não se importar com os sentimentos das pessoas?
Fitei o chão. Na verdade eu não tinha meditado sobre aquilo. Mas quando eu perguntei se não se importavam com os sentimentos das pessoas, talvez eu estivesse mesmo falando um pouco dele. E não tinha nada a ver com Dishi. Tinha a ver com como o ruivo brincava comigo.
VOCÊ ESTÁ LENDO
O Martelo das Bruxas - Volume II: As Crônicas dos Guardiões do Alvorecer
FantasíaNo Volume II desta trama, o grupo de aventureiros finalmente colide. Uma aventura com piratas toma lugar em alto-mar, enquanto, em terra, um conflito se desenvolve, e aumenta a tensão entre as nações vizinhas. Diante da infindável perseguição, esses...