Capítulo 86 - Notícias pesarosas

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Achei já ter visto de tudo, mas há sempre maneiras de se surpreender

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Achei já ter visto de tudo, mas há sempre maneiras de se surpreender. Na noite anterior, enquanto eu dormia na minha tenda, a gritaria se instaurou pelo acampamento, e quando enfim me levantei para entender o que acontecia, vi algo que jamais jurei que veria nem em meus pesadelos: uma enorme criatura dracônica sobrevoando o céu de Passalus e cuspindo uma coluna de fogo sobre a cidade.

Nunca fui do tipo religiosa, mas quando encontrei irmão Jiang na multidão, soube exatamente o que significava o brilho emocionado em seus olhos crentes... Os olhos de quem pregava ladainhas sobre o dragão vermelho que devastou Stoffel e sobre como o rei dragão o colocou em seu devido lugar. Os olhos de quem provavelmente rezava mil preces antes de acender lanternas nas procissões stofellianas.

Eu, por outro lado, tinha apenas uma coisa em mente: deveria escapar dali e deixar que Issachar se fodesse? - afinal dinheiro algum valia tal risco. Ou deveria persistir em seu serviço e continuar a ver o desenrolar do que parecia ser o fim do mundo?

Pelos meus cálculos, eu conseguiria chegar ao estábulo em pouco tempo, mas minhas pernas não se moveram, enquanto meus olhos assistiam com atenção a besta alada.

Pouquíssimas vezes eu senti medo em minha vida, por isso me estranhava que todo o acampamento, incluindo eu, estivesse parado no lugar, assistindo aos acontecimentos como se nada pudéssemos fazer para impedi-los. Mas então veio... O raio subindo ao céu em formato de dragão e um vento forte que quase me tirou do lugar, arrebatando até algumas tendas consigo. Por fim, uma chuva forte como se o céu estivesse surrando a terra.

A chuva pareceu lavar as dúvidas dos homens e a maioria começou a se mover enquanto ordens ecoavam pelo campo, perdidas em meio a ventania.

Um segundo dragão vermelho ganhou o céu, ainda maior e mais assustador que o primeiro e mordeu-lhe a jugular. Os dois lagartos brigando por entre as nuvens acertaram um pedaço da muralha antes de sobrevoarem a colina, entrelaçados.

Caminhei por entre os passantes até a colina e assisti de longe enquanto o segundo dragão matava o primeiro, e montando sobre o seu corpo dava um alto urro, levantando voo e desaparecendo no céu.

Fiquei parada por minutos sem fim, me lembrando de coisas que Wissam dizia sobre o passado e sobre os dragões... Sobre o mundo das primeiras tribos e sobre como a vida era diferente. Sobre como a magia parecia ter sumido do mundo. Mas Wissam estava errado e não era isso que eu via... A magia estava bem ali, assustadora como sempre.

Voltei ao acampamento, ajudando a organizar as tendas. Irmão Jiang também parecia distante, sussurrando orações em stoffeliano enquanto batia as estacas das tendas no chão de terra molhada.

Quando a manhã veio, fui para a cidade para ouvir notícias de Issachar. Os guardas disseram que ele e Anna haviam ido ao templo... Talvez um dragão tivesse deixado até Issachar religioso.

Decidi esperar na cidade. Caminhando pelo centro, pude ouvir o som de um acordeão vindo da praça, tocando notas melancólicas e lentas. A chuva havia parado, mas a capital antes branca e organizada agora fora substituída por restos do incêndio que viera do céu na noite anterior.

O Martelo das Bruxas - Volume II: As Crônicas dos Guardiões do AlvorecerOnde histórias criam vida. Descubra agora