Autopunição

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Uma chuva inesperada caiu sobre o Rio de Janeiro, agravando a situação de Yuri. Sem ter para onde ir, o rapaz acabou se abrigando em um barzinho localizado em uma esquina de sua própria comunidade, lugar que ele evitava antes, pois era um ambiente mais conhecido por servir cachaça e reunir os bêbados mais inconvenientes que ele conhecia.

Além de Yuri, havia apenas mais quatro clientes, que olhavam para ele de ora em ora, curiosos. Um veio pedir um trocado para pagar uma dose de pinga, mas o rapaz o afastou.

A bebida desceu queimando como o fogo do inferno, e por pouco não subiu levando consigo todo o lanche que Yuri havia comido com Vini mais cedo. Foi horrível. E ele queria mais.

— Você não é o filho do... — um dos clientes do bar começou a dizer, mas foi interrompido por Yuri.

— Não. Eu não sou filho de ninguém — respondeu, ríspido, encerrando o assunto.

Enquanto virava outra dose, o rapaz se lembrou das palavras ditas minutos atrás. "Vá procurar teus machos", veio à sua mente diversas vezes. Yuri resolveu seguir o conselho. Pegou o celular, e percebeu que não sabia quem procurar, afinal quem eram esses tais de "seus machos"? Rolou com desinteresse pelo feed da rede social, passando por algumas postagens de amigos e conhecidos até encontrar uma que prendera a sua atenção, Matheus numa barraquinha com Fernando, a legenda "podrão com o namorado". Era de 3 horas atrás.

"Você está sozinho?", Yuri enviou para Fernando no whatsapp.

***

Era um prédio sem extravagância, mas que apresentava um padrão de vida claramente superior ao que Fernando queria vender. Enquanto subia no elevador, Yuri refletia sobre como o ex queria viver um personagem, mas não abria mão totalmente de uma vida de conforto, É fácil ser pobre assim. O rapaz respirou fundo antes de bater na porta branca. Sabia que uma vez que fizesse isso, não haveria mais volta.

TOC! TOC! TOC!

Fernando estava vestido com uma calça xadrez verde e uma regata branca, claramente trajes de dormir. Ele encarou Yuri confuso, o cenho franzido, um olhar carregado de suspeita.

— Yuri, você tá todo molhado. O que aconteceu? — Nando perguntou, num tom de voz preocupado que quase deixou o visitante noturno tocado. — Você tá bem?

Sem falar nada e sem mesmo esperar por um convite, Yuri entrou no apartamento do ex-namorado. Fernando fechou a porta e virou para ficar de frente para ele.

— Você tá precisando de alguma coisa? — o anfitrião perguntou, se aproximando de Yuri com uma postura receptiva.

Sem perder Fernando de vista, Yuri tirou a mochila das costas, deixando-a cair no chão como uma fruta podre; depois alcançou o anfitrião com um passo largo e o beijou de forma quase desesperada. Fernando retribuiu num primeiro instante, mas logo se recordou de algo e se conteve, sem ir embora. O ex-casal permaneceu com os rostos juntinhos, os lábios tão próximos um do outro que poderiam se encontrar a qualquer momento.

— Eu tenho outra pessoa agora — advertiu o anfitrião, com a respiração ofegante.

As palavras não foram mais que vento para Yuri, que voltou a insistir em beijar o ex. E dessa vez, ele não hesitou nem por um segundo. As mãos de Fernando envolveram Yuri num abraço apertado, um misto de desejo e de saudade. Ele tinha um cheiro bom, de banho recém tomado, e um gosto de café, um gosto de casa.

Sem se desgrudar, os dois deram alguns passos tortos pela sala, até esbarrarem na mochila de Yuri.

— Onde fica o seu quarto? — perguntou o visitante, quando se separaram.

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora