Lumiar

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O bolsista hesitou por um momento em aceitar o convite de Fred, mas, no fim, decidiu que precisava tentar mais uma vez resgatar a amizade que os dois tinham, também queria parar de incomodar a família de Sol, sumir por um ou dois dias já seria um alívio para elas. Por último, quem sabe o veterano não estivesse certo e esse lugar misterioso pudesse ajudá-lo com seus problemas, embora esse ponto fosse difícil de acreditar.

A viagem foi silenciosa a maior parte do tempo. No meio do trajeto, Yuri dera-se conta de que por mais que ele e Fred tivessem prometido que a noite do baile não acontecera, uma muralha de gelo se ergueu entre eles e, talvez, fosse impossível derrubá-la. O único momento em que eles conversaram como antes foi quando Fred contara-lhe sobre o namoro de Rafa com Kate. Em troca, Yuri revelara sobre Jenifer e Hugo, e os dois passaram bons minutos fofocando sobre a situação do estranho quarteto amoroso. Depois disso, o silêncio dominou o carro novamente, e Yuri até caíra no sono.

O bolsista do icaes acordou quando o carro parou. Que lugar é esse?, perguntou-se ao descer do veículo. Parecia familiar, mas ele não sabia dizer de onde.

— Bem-vindo a Lumiar! – desejou Fred, com um sorriso no rosto.

Lumiar, claro. Dos stories de Guiga, recordou-se então, começando a se irritar. Por que raios Fred achou que seria uma boa ideia trazê-lo para uma colônia de hippies? O lugar pelo menos era bonito, parecendo com esses "resorts" que Yuri só via pela televisão. Quando sentiu a brisa fresca tocar a sua pele, carregando consigo o agradável aroma de mato que vinha das árvores que estavam por todas as partes que era possível olhar, ele admitiu pra si mesmo que não podia ser tão ruim assim.

Até que chegou a recepção.

— Como assim entregar o celular?

— Regras da casa — reforçou uma moça simpática que se apresentou como Cristal.

Fred estava conversando com Dora, uma das donas do lugar e que, por coincidência ou não, era mãe da professora Lumiar.

— Por que você não me disse isso antes? — ele cobrou, puxando Fred pela camisa e falando entre os dentes.

Fred riu da sua cara.

— Porque a graça é ver a reação das pessoas quando chegam aqui. Cristal se amarra, não é Cristal?

A recepcionista esboçou um sorriso e inclinou a cabeça para o lado, como quem dizia "tanto faz".

— Mas eu preciso falar com as pessoas, e com o... Fernando, que tá em São Paulo. Como vou fazer isso?

Fred fechou a cara e se virou para o balcão, tirando o próprio celular do bolso para entregá-lo a Cristal, que prontamente guardou-o em uma caixinha.

— Então... não vai fazer — o playboy decretou, tranquilamente.

Dora pousou a mão sobre o ombro de Yuri.

— É necessário se livrar de tudo que te prende ao mundo exterior para poder resgatar o verdadeiro "eu" que se esconde aí dentro. — explicou a anfitriã, parecia tanto saber do que estava falando que Yuri quase acreditou nas palavras dela.

Ele olhou para Dora, pegou o aparelho, mandou mensagens para Jenifer e Fernando, explicando sobre a sua triste situação, e entregou-o para Cristal, derrotado.

— E agora? — Yuri perguntou.

Dora parou em frente a Yuri e Fred, que seguravam suas bagagens lado a lado. Ela estudou a dupla com um olhar analítico e fez alguns movimentos estranhos com as mãos. Fred até fez uma careta e se inclinou para trás, desconfiado.

— Teu amigo me contou que você anda tendo problemas com pesadelos, ansiedade... — ela começou a elaborar, com os olhos fixos em Yuri. Até que, de repente, virou-se para Fred — mas e o dele, qual é?

— Eu? — Fred exclamou, surpreso. — Nenhum, só estou aqui de acompanhante.

— Ah, minha senhora, são tantos... — zombou Yuri, divertindo-se com a situação.

Dora continuou estudando-os, intrigada.

— Não, não... Tem algo aqui sim, uma energia, eu sinto — constatou, girando a mão no ar que separava os três. — Nós vamos dar um jeito nisso também, não se preocupe — prometeu, tocando o rosto de Fred e sorrindo de um jeito doce. — Agora, vão. Nina vai levá-los até o quarto. Ultimamente eu to evitando escadas.

Yuri só não imaginava que a "Nina" que a anfitriã mencionara se tratava de alguém que ele já conhecia. A estudante do ICAES desceu com trajes largos, típicos das pessoas que viviam naquele lugar, o cabelo estava castanho agora, da cor original, com apenas as pontas pintadas de verde. Ela também o havia reconhecido, pois abriu logo um sorriso ao vê-lo assim que desceu das escadas para atender ao chamado de Dora.

— Yuri! Não brinca, que é você mesmo.

— Nina!

Ela o cumprimentou com um beijo bem no canto da boca. Yuri ficou surpreso, mas sorridente.

— Que surpresa boa!

— Nina, meu bem, leve os dois pro quarto que te falei — Dora pediu para ela.

A moça assentiu com a cabeça.

— Venham, me acompanhem.

Enquanto atravessaram o corredor, os dois conversaram.

— Que legal que vocês dois continuam amigos depois de todo esse tempo. Estou até surpresa — disse ela.

— O que você está fazendo aqui? — Yuri perguntou.

Fred se limitou a seguir o caminho em silêncio.

— Estou precisando de uma grana, sempre que posso, colo aqui. O povo é mó legal — ela parou. — Chegamos. Aqui está o quarto de vocês.

Os móveis eram todos de madeira assim como toda a estrutura do "refúgio". Haviam duas camas de solteiro, uma do lado da outra. Fred atravessou o quarto e se acomodou em uma delas.

— Adorei revê-lo Yuri. Se precisar de alguma coisa, qualquer coisa, é só pedir pra mim.  Ah, quando tiver um tempinho, me procure, vou adorar colocar o papo em dia — Nina falou, perto da porta. — Esse foi só o começo. Espero que o tempo de vocês em Lumiar seja inesquecível — desejou, antes de ir embora.

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora