Do I make you cringe? (Fred & Yuri)

Processo de Adaptação

Era pouco mais de sete horas da manhã de sábado quando Yuri acordou com o barulho vindo da cozinha. Sem querer incomodar, ele permaneceu ali, quieto, fingindo que ainda estava dormindo. E estava tão cansado que, de fato, vez ou outra caíra no sono, só para ser acordado minutos depois por algum novo barulho.

A noite passada mudou a vida de Yuri para sempre, desencadeando a uma madrugada que foi um terrível desastre. Pensar em tudo que lhe acontecera nas últimas 12 horas fazia Yuri sentir vontade de desaparecer do mundo, de dormir e não acordar mais. Mas Deus não ouviria essas suas preces… na verdade, o rapaz nem se recordava mais qual foi a última vez que Ele o escutara e nem quando foi que desistira de tentar ser ouvido.

Seu celular estava com apenas 8% de bateria quando ele o pegou, e marcava 8:32 da manhã. Yuri percebeu que havia algumas mensagens de Fernando, mas não acessou a conversa, pois a última coisa que queria no momento era respondê-lo. Sua decisão foi desligar o aparelho e fingir que não viu, depois mentiria que o celular descarregara enquanto ele estava dormindo. Sentia-se covarde por isso, sim, mas depois de tudo que lhe acontecera, achava-se no direito de sê-lo.

Quando Pudim pulou sobre ele e o presenteou com lambidas no rosto, Yuri não teve mais como fingir que estava dormindo. A dona da casa percebeu e veio correndo da cozinha, chamando o animal para junto dela.

— Ai meu deus, ele te acordou? — Dona Sol perguntou, preocupada.

Yuri respondeu que não fazia mal, que já era hora de acordar. Ele se sentou no sofá e o cão voltou correndo para o seu lado. Yuri ainda estava vestido com as roupas de ontem, sequer havia tomado um banho, e sentia imundo por isso. A anfitriã parece ter percebido, pois foi até o seu quarto e depois voltou com uma toalha limpa, sabonete e uma escova de dentes.

— É rosa, não tem problema, não é? — Perguntou Sol ao entregar os itens de higiene a Yuri, referia-se a escova de dentes. — É que faz tanto tempo que não temos um homem aqui em casa. 

— Que é isso, Dona Sol, não tem problema nenhum — o rapaz se justificou, rindo sem graça e pegando as peças que lhe foram oferecidas. 

— Você tá se sentindo melhor agora? — perguntou Sol, sentando-se entre Yuri e Pudim. O cão começou a lamber o rosto dela.

Yuri não quis pensar nisso. Respirou fundo e respondeu:

— Vou ficar.

Durante a manhã, Yuri se ofereceu para ajudar em tudo que o deixaram fazer: varreu a casa e lavou a louça. Ele disse que sabia cozinhar e combinou com Dona Marlene que ajudaria nos preparativos das quentinhas quando tivesse livre da faculdade, principalmente aos sábados. Sol disse que ele tinha que focar nos estudos, mas Yuri insistiu que não podia ficar ali sem ajudar em nada.

Duda acordou, tomou o café da manhã e foi brincar na casa da vizinha. Sol foi para os ensaios na banda do Lui Lorenzo e Dona Marlene saiu para vender as quentinhas junto de Bruna. Yuri ficou sozinho com Jenifer e eles foram ler alguns textos para segunda.

Ao menos foi o que Yuri tentou fazer, mas a sua cabeça estava cheia de pensamentos, e as palavras do texto não conseguiam se organizar de um jeito que fizesse sentido. 

— Ontem eu vi, pela primeira vez, o Fred que só você, Rafa e Bela enxergam — Jenifer comentou, de repente. — Ele realmente se preocupa com você.

Yuri olhou para a amiga de forma pensativa.

— Eu causei muita preocupação a vocês, não queria. Me desculpa, Jeni — Yuri pediu, pela terceira vez só naquela manhã.

— Yuri, por favor… — Jenifer dispensou. — Você é nosso amigo e faremos o que tiver ao nosso alcance para te ver bem. Eu não consigo imaginar o que você está passando agora, mas saiba que serão só mais alguns obstáculos em seu caminho, e você irá vencê-los, como fez com todos que já encontrou.

Poucas semanas atrás, Jenifer estava chateada com a mãe após descobrir que Theo era seu pai biológico. Nos primeiros dias, ela reagiu mal, encheu a cara, quis atingir a mãe por ter escondido a verdade dela e permitido que ela se apaixonasse pelo próprio irmão. Agora, porém, mãe e filha estavam em paz. Yuri perguntou a Jenifer sobre como ela superou isso. Ao que ela respondeu:

— Não sei, Yuri… Acho que eu só parei de me odiar por algo que nunca tive escolha.

***

Yuri esqueceu de trazer um carregador, por sorte o de Jenifer encaixou em seu celular. Mesmo assim, ele o deixou desligado. Ainda não queria encarar Fernando, o que significava que também não podia agradecer Fred pelo apoio que lhe dera na noite anterior.

Durante a tarde, Yuri e Jenifer deram uma arrumada num depósito em que ficavam guardados pertences do falecido esposo de Sol. Era um ambiente pequeno, com uma mesinha e estante com diversos tipos de objetos pessoais da família. No espaço entre a mesa de madeira e as estantes, coube um colchão de casal, que eles colocaram no chão, e um ventilador. "É um colchão velho, mas é melhor do que o sofá da sala. Ao menos você não vai acordar todo dia com o Pudim lambendo a sua cara", a dona da casa tinha orientado antes de ir para o trabalho.

***

Após a janta, Yuri encontrou Jenifer rindo enquanto conversava com alguém no celular. Ele se aproximou e ela revelou que estava conversando com Fred. O playboy queria ter vindo até a casa dela hoje, mas Jenifer o convenceu de que seria melhor visitá-los no Domingo. Yuri achou bom, pois estava exausto. Depois Jenifer mostrou algo curioso, Matheus, o namorado de Fernando, havia deletado todas as fotos com ele de uma hora pra outra.

Merda, Yuri lamentou mentalmente, escondendo da amiga a razão de seu desconforto. Perguntou-se se o ex tinha alguma esperança de voltar para ele.

Às 21 horas, o hóspede se despediu de todas da casa e partiu para o seu quarto improvisado. Achou que estava tão cansado que só bastaria deitar para pegar no sono, mas não foi isso que aconteceu. Ao se deitar, tudo voltou à sua cabeça, se repetindo várias e várias vezes, como um filme dramático ruim.

Lá pelas tantas da madrugada, Yuri finalmente conseguiu dormir.