Uma Decisão Difícil

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As últimas palavras de Isabella chegaram aos ouvidos de Yuri como um soco, fazendo com que ele se aprumasse na cadeira de tão desorientado que ficou.

— Você disse grávida? — perguntou, tentando ter certeza de que não se enganara.

A mineira esfregou a mão trêmula no rosto, visivelmente abatida. Ao notar a angústia cintilando nos olhos dela, descobriu, antes mesmo de qualquer palavra, que não tinha ouvido errado.

— Grávida — ela reforçou, balançando a cabeça em negação, em seguida, desatou a explicar sobre a novidade: — Cê lembra que fui fazer uns exames? Hoje quando passei pra pegar o resultado, eles vieram me perguntar sobre a gravidez.

Começou a ligar os pontos diante da explicação dada, vendo sua ficha cair sobre o modo com que a companheira de chapa se comportara no debate, Agora tudo faz sentido. Viu-se, então, sem conseguir falar nada, como se uma corrente de aço estivesse enrolada em seu pescoço, sufocando suas palavras. Estava diante de uma amiga em apuros, contudo seu coração tinha outra preocupação, uma que, no fundo, ele sabia que não deveria ser levada em conta, que deveria ser mantida longe de seus pensamentos e fora daquela equação. O problema, porém, era que por mais que tentasse ser sensato e manter o foco na objetividade da situação, esse fantasma insistia em assombrar sua mente.

— Eu... não sei se devo te dar parabéns ou... — disse, atrapalhando-se nas próprias palavras. Calma, pode não ser dele. Não é dele. — É do...?

A mineira o encarou com incredulidade.

— De quem mais seria? — Bella soltou, abaixando a cabeça. Percebeu que ela estava ansiosa, cutucando a pele ao redor das unhas. — Aquela maldita festa... Eu não devia ter ido — lamentou, mordendo o lábio inferior.

Maldita festa, repetiu mentalmente, Fred seu idiota, cabeça de vento, você estragou tudo pra sempre.

— Eu fui uma burra, devia ter me protegido, eu sempre me protejo... Mas na hora... foi — a voz da jovem estudante estava embargada, ela ergueu os olhos e mirou o teto por alguns segundos, como quem tentava se acalmar. Esperou em silêncio, pois sua cabeça também tinha virado uma paçoca no meio dessa conversa.

— Vocês dois vão ser pais maneiros, dinheiro não será problema e talvez ele tenha jeito com crianças... — começou a falar sem parar, abstraindo de seus pensamentos qualquer imagem do pai, dizendo só o que acreditava que alguém na situação da amiga iria gostar de ouvir: — Você será uma boa mãe, eu te conheço, tô até vendo aqui que...

— Do que você tá falando? — Bella lhe cortou de repente, agora com uma voz mais firme.

Ficou sem entender.

— De você... da família que vocês vão...

— Você não entendeu... Eu não vou ter essa criança — ela revelou, a voz séria.

E então sentiu um arrepio percorrer seu corpo, levando embora consigo todo o seu vocabulário. Tudo que conseguia fazer era encarar a amiga com confusão.

— Vo-você tá querendo dizer... — começou, com a voz baixa, quase um sussurro.

— Isso mesmo que você entendeu.

Meu Deus...

— Você tem certeza? Talvez... — começou a argumentar, sendo cortado por ela mais uma vez.

— Amigo... eu vim pra essa cidade pra me formar, pra me tornar uma advogada... — Bella começou. Era nítido o nervosismo em seus traços, em sua postura. Ela estava lidando com um peso enorme nas costas, um que ele sequer conseguia mensurar. — Eu não posso dar esse desgosto pra minha mãe, pra minha vó, pra minha família... Eu não posso decepcionar todos que confiaram em mim... Eu... Eu sempre fui a filha certinha, a estudiosa, que todos em volta viam um futuro pela frente. Não posso... Não posso aparecer com um... Meu Deus...

Depositou sua mão sobre a dela para demonstrar conforto e respirou fundo, tentando catar algumas palavras que fossem de acordo com seu instinto inicial, mesmo que depois fosse se arrepender do que iria dizer.

— A gente pode dar um jeito... Tem sempre um jeito. A creche universitária... nós podemos vencer as eleições, agilizar esse projeto, as mães de...

— Yuri, eu já decidi — ela lhe cortara outra vez, mais recomposta. — Não vou voltar atrás.

Apesar de saber da resposta, precisava tirar o elefante do meio da sala:

— E Fred... você vai contar a ele?

Isabella encarou-lhe por alguns segundos com um olhar analítico, até responder:

— De jeito nenhum! Ele não pode ficar sabendo de nada...

Engoliu em seco, sentia que iria explodir a qualquer momento.

— Mas Bella, talvez ele mereça...

A mineira lançou sobre ele um olhar rígido.

— Amigo, eu entendo onde você quer chegar, mas essa questão não é pauta pra debate. A decisão é minha, e eu já a fiz.

— Eu sei... só que sei também que Fred pode ser muita coisa, ter uma lista de defeitos, mas ele jamais te deixaria sozinha assim, nesse momento — defendeu, começando a ficar preocupado de estar tentando dissuadi-la demais de uma decisão que não lhe cabia.

Bella esboçou um sorriso nervoso.

— Quando a gente tava junto, ele me levou pra um jantar na casa dele e eu não me senti nenhum pouco bem-vinda. Teve uma hora que fui ao banheiro e quando voltei, ouvi o irmão dele fazendo insinuações de que Fred era o tipo burro que caia em golpe da barriga — ela soltou um suspiro cansado. — Eu não disse nada, simplesmente fingi que não ouvi. Na época estava muito apaixonada e quando a gente tá assim, prefere ignorar, abaixar a cabeça, se convencer de que o namorado é diferente de todos que estão em volta dele...

Sentiu o estômago embrulhar. Havia encontrado Enrico uma única vez e fora o suficiente para imaginá-lo soltando comentários desse tipo.

— Mas ele é... diferente — atreveu-se a defender Fred mais uma vez.

Bella ignorou-lhe.

— Eu não posso criar um filho num meio daquela gente. Um filho que será igual a mim. Você entende? Não posso. Se eu fosse ter essa criança, teria que trancar o curso e voltar para Minas. Meu futuro seria como o daquela sua colega, Milena. Não é justo com ninguém.

— Eu entendo, mas é que...

— Yuri — Bella segurou sua mão sobre a mesa e lhe encarou profundamente — você sabe que não posso comentar um trem desses com a Jenifer, ela jamais aceitaria. Então você — sentiu ela apertar sua mão. — é tudo que eu tenho nessa cidade. E eu vou precisar, mais do que nunca, de sua ajuda.

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora