Despensa Vazia

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Yuri fitou a toalha entre os dois, incrédulo, perguntando-se se havia ouvido aquilo mesmo.

— Depósito? — perguntou, sério, fazendo uma breve pausa antes de lançar outra pergunta: — Por que não no banheiro?

De repente, a voz de Guzman surgiu em sua cabeça, "não sabia que você era desses... que curte uma rapidinha no banheiro".

— Tanto faz pra mim — ele lhe respondeu, com um sorriso no canto da boca. — Teu chefe tá lá em cima, ele não vai notar uma fugidinha.

Não soube dizer se o playboy não havia entendido ou se estava apenas se fazendo de desentendido. Olhou bem nos olhos dele e sorriu antes de dizer:

— Acho que banheiro público é mais a tua cara.

Nesse instante, Fred soltou a toalha. A chama nos olhos dele se apagou, dando lugar a um cenho franzido e um olhar desconfiado.

— Do que você tá falando?

— Ué? Onde você tava antes de vir pra cá? — perguntou, abrindo o jogo enquanto enrolava a toalha na mão.

O mais velho balançou a cabeça, confuso e desanimado.

— Você não consegue relaxar e curtir nenhum pouquinho, né? — ele rebateu, sem abaixar a guarda. — É incrível isso, na moral, pense num tesão em cortar clima!

— Ao contrário de uns e outros, eu não sinto a necessidade de sair comendo o ICAES inteiro — disse, sem aumentar o tom para que ninguém decidisse prestar atenção na conversa dos dois. — Quem era agora? Bia? Algum colega do DCE?

Fred ficou quieto por alguns segundos, emburrado.

— Um homem se diverte como pode. Você devia tentar — disse ele, cheio de si.

Yuri torceu os lábios e fez que sim com a cabeça.

— Cara, na boa, procura outro pra apagar esse fogo, já que uma rapidinha no banheiro e essa chuva não deram conta. Eu tô fora.

— Pelo visto esse lance de vocês tá ficando sério... — observou o mais velho, cruzando os braços.

Primeiro perguntou-se sobre o que diabos Fred estava falando, mas, antes de abrir a boca, lembrou-se de que o ex-namorado acreditava que estava rolando alguma coisa entre Guzman e ele. Deve ser por isso que ele meteu essa agora..., cogitou, ficando ainda mais decepcionado.

— Se tá ou não tá, não é da tua conta... — cortou, preparando-se para encerrar a conversa e sair dali.

Foi quando o outro deu um passo para frente e levou uma mão até o seu ombro.

— Se bem que o primeiro não te impediu de nada — ele provocou, o olhar carregado de astúcia e os lábios formando um sorriso que sugeria uma certa malícia.

Afastou-se no mesmo instante, completamente irritado. Resistira ao ímpeto de empurrá-lo porque não se esqueceu de onde estava.

— Vai se... — parou de falar antes de concluir o xingamento, cerrando o punho da mão que não segurava a toalha. — Você realmente acha que pode tudo, né? — indagou, mas não esperou por nenhuma resposta. — Olha, só deixa eu quieto na minha e continua aí vivendo tua vida, como tu já ta fazendo.

— Escuta, Guzman não é um cara certo pra você, nem pra ninguém. Se eu fosse você, eu... — o playboy começou a dizer, agora mais sério. — pulava fora. 

Ele sabe, pensou Yuri, comprovando a hipótese que tinha. Ele sabe e nunca o denunciou.

— Não tô te pedindo conselho, papo reto — cortou-o, dando um passo para trás. Foi quando viu a garçonete passando e chamou por ela: — Milena, atenda ele aqui que eu tenho que resolver uns BO lá dentro. Pode ser?

— Claro! O que vai querer?

Deu as costas e saiu, deixando os dois conversando. Enquanto atravessava o bar, teve a sensação de que os olhos do playboy estavam sobre ele, fuzilando-o.



Entrou na despensa, como Fred havia sugerido, mas sozinho. Agitado, começou a andar de um lado a outro entre as prateleiras cheias de alimentos. Sua mente estava uma completa confusão, sendo como uma panela de pressão prestes a explodir. Palavras que ouvira do playboy, recentes e antigas, vinham e iam embora, as vezes com clareza, outras picotadas e desconexas.

Mas o que é que lhe incomodava de verdade? Era isso que não conseguia entender. Seriam as palavras sem noção de Fred, o fato dele estar com outra pessoa no banheiro do ICAES ou o pensamento de que ele só tentara levá-lo para cama para provar que é melhor que Guzman? O garçom parou de andar e mordeu o lábio com força enquanto fitava o teto escuro. Talvez fosse tudo isso e ainda mais.

Olhou para o lado e viu novamente a cena do banheiro, Fred em pé, o dono do all star ajoelhado em sua frente. Quem é você? De repente, essa pessoa ganhou um rosto. O seu. Estava ali, diante do playboy em toda sua glória. Prestes a...

Bateu com a palma da mão na testa três vezes, afastando a imagem de sua cabeça. Estava percebendo que ainda sentia desejo pelo presidente do DCE, que parte sua queria ter arrastado ele para esse lugar e ter feito o que ele queria fazer. Mas isso era agora, tudo que sentira minutos atrás fora repulsa, ódio por uma traição que, tecnicamente, não existira.

Estou ficando maluco... Quando é que isso vai passar?

Foi então que, sentado no chão e com as costas escoradas na última parede da despensa escura, Yuri prometeu a si mesmo que, a partir de agora, não mais se deixaria afetar pelo que Fred fazia ou deixava de fazer da vida dele. 

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora