Ver para Crer

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O bar finalmente seria fechado. Era uma noite estrelada e amena de segunda-feira e o turno se encerrou cedo, tudo como Yuri esperava que fosse. O garçom e seu colega Chico botavam para dentro as cadeiras e as mesas enquanto Simas analisava as finanças debruçado contra o balcão. O gato Salem estava com ele, brincando com uma caneta que o seu tutor balançava entre os dedos para distraí-lo.

— Prontinho. Mais alguma coisa, patrão? — o novato da equipe perguntou.

Simas ergueu a cabeça para olhar para eles. Algo breve, apenas o tempo suficiente de dispensá-los:

— Deu por hoje. Já podem ir.

— Valeu chefinho, até amanhã — despediu-se Yuri, apanhando a sua mochila e deixando o estabelecimento ao lado de Chico.

Os dois funcionários seguiram caminhando na mesma direção, conversando sobre o dia de trabalho, as folgas que teriam, fofocando sobre os colegas e outros assuntos triviais.

— Mas vem cá, cê tá diferente... Tá cheiroso, trocou a camisa. Tá indo encontrar alguém? — Chico quis saber, com um olhar alegre e uma expressão inocente.

— Vou encontrar um... uma pessoa especial, alguém da Internet — respondeu a ele. Não tinha porque mentir... embora agora tenha ficado nervoso com o comentário. — Você acha que eu exagerei?

Saintury finalmente iria conhecer LoboCurioso, toda vez que pensava a respeito disto, seu estômago era tomado por um baile inteiro de borboletas. Como parecer tranquilo diante de um evento como esse? Provavelmente veio dando bandeira o dia inteiro, Bella até fez um comentário durante a aula, mas ele acreditava ter conseguido disfarçar.

— Relaxa, meu mano — Chico respondeu, com um sorriso simpático no rosto e um olhar de aprovação. — Tá chave, vai agradar seja quem for.

— É que eu quero mesmo causar uma boa impressão. Mas também não quero parecer que to indo com segundas intenções ou algo do tipo. Saca?

— Saquei — disse o rapaz, sorrindo. — O que tiver de rolar, vai rolar. Mesmo que você tivesse com uns trapos.

Os dois olharam para os lados antes de atravessar uma rua, fazendo isto com passos largos em seguida.

— E a faculdade, como tá? — Chico puxou um novo assunto. — Muito trabalho? Tá dando pra conciliar de boa?

— Um sufoco sem fim. Mas vai ser só esse período, depois que eu conseguir um estágio, vai melhorar.

— Ih, já vi que vai nos abandonar em breve. Quer dizer que tá perto de acabar? — perguntou o rapaz, levando um cigarro à boca e parando de andar por alguns segundos até o vento permitir acendê-lo.

— Quem me dera. Ainda faltam uns bons anos.

Os dois deram mais alguns passos em silêncio, até que, do nada, Francisco lhe surpreendeu com outro tipo de pergunta:

— Vem cá... tu não conhece alguém lá dentro que vende umas paradas maneiras não?

— Umas paradas? — indagou, sentindo o gosto do nervosismo subir à boca, e dessa vez não era por causa do Lobo. De repente, tudo que havia enterrado começou a voltar do túmulo.

— É, você sabe... maconha, pó... essas paradas. Sempre ouvi que é o que mais rola em facus de playboys....

Engoliu em seco, tentando disfarçar. O que ele queria com isso? Alguém como ele não podia se dar o luxo de gastar o que não tinha com esse tipo de coisa.

— Não. Não conheço não. As pessoas falam muita coisa, mas não é bem assim — mentiu, tentando desencorajá-lo. E também não iria falar nada sobre Guzman, essa era a regra. 

— Ah, de boa. Deixa pra lá então. Depois arranjo outro corre.

Para a sorte de Yuri, o bar que havia marcado com o canídeo misterioso da Internet estava na esquina à frente deles. Algumas dezenas de pessoas se amontoavam do lado de fora do estabelecimento, todas vestidas casualmente para os padrões de uma noite no Rio de Janeiro. Uma banda tocava um pagode na calçada, que era o que mantinha os clientes entretidos.

— Animado ali — constatou Chico. — É pra lá que tu vai?

Fez que sim com a cabeça e então se despediu do rapaz como se estivesse tudo normal, partindo rumo ao estabelecimento sem olhar para trás. No caminho, passou por algumas pessoas que estavam dançando, brincando ou conversando pela calçada.

O interior do bar não era muito maior que o Simas, suas paredes eram vermelhas e um longo balcão cortava toda a estrutura, de onde serviam diretamente as bebidas. Algumas pessoas estavam sentadas nas cadeiras junto ao balcão, outras apenas sendo atendidas em pé. Procurou por um espaço e foi logo atendido por uma simpática atendente, que lhe entregou a cerveja que havia pedido.

Tomou o primeiro gole e em seguida chegou as mensagens do celular. Nenhuma atualização. Será que vou levar outro bolo?, começou a ficar preocupado, mas ao ver a hora se tranquilizou mais; ainda não havia dado o horário em que marcaram de se encontrar. Ele deve tá chegando, calma.

Pior que tem muita gente aqui, pensou enquanto dava outra golada em sua gelada, Pelo menos não vou ser morto. E então deu alguns passos pelo salão, dando-se conta de que não sabia onde deveria ir.

LoboCurioso não marcou em nenhum lugar em específico, disse apenas que viria falar com Yuri assim que o visse. Ao contrário dele, o estudante do ICAES sempre permitiu com que o amigo virtual visse suas fotos e até mandou suas redes sociais para ele, na esperança que este lhe adicionasse. Nunca aconteceu, mas ele com certeza saberia reconhecê-lo se o visse.

Espero que não demore, disse a si mesmo, com as mãos frias, não sabia dizer se pela ansiedade ou pelo contato com a cerveja. Enquanto seguia bebendo, tentava, mais uma vez, imaginar como seu amigo virtual era. Seria bonito? Em sua cabeça ele era, mas o que isso deveria importar? Somos só amigos.

Quando chegou na entrada do bar, ficando com a visão para a calçada, seus olhos encontraram, entre muitos estranhos, um rosto conhecido olhando fixamente para ele.

Não pode ser.

Ele não.

Yuri? — Não ouviu a voz de Fernando, mas conseguiu ler os lábios dele.

Seria essa a sensação de broxar? A comparação passou pela sua cabeça enquanto tentava lidar com a descoberta.

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora