DCE

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Enquanto dois grupos de calouros faziam uma disputa de corda, Yuri conversava com Jenifer alheios a toda movimentação.

— Você acha que ela vai se incomodar? — ele perguntou, referindo-se a reação de Bela quando descobrisse o que estava acontecendo entre ele e Fred.

Jenifer fez uma expressão pensativa.

— Pode ser que não. Mas é estranho, eles tiveram algo muito forte, quase viraram noivos. Pode ser que ainda haja um sentimento... — Alguma coisa em sua expressão deve ter incomodado a filha de Sol, pois ela rapidamente se corrigiu: — da parte dela. Você entende.

Yuri soltou um suspiro derrotado de quem esperava por uma resposta diferente. No fundo, porém, sabia que a amiga estava certa.

— Tudo que eu não queria era criar uma situação ruim entre a gente — confessou, aborrecido.

— E pode sobrar pra mim que vou ficar no meio de vocês — Jenifer riu para aliviar a tensão. — Mas Yuri, você não pode fugir do que está sentindo por medo de magoar os outros. Bela pode sofrer no começo, mas ela vai entender. Nossa amiga é uma mulher madura e, no fundo, ela já sabia que sua história com Fred não levaria a lugar nenhum, caso contrário teria dito sim a proposta. Nós, mulheres, no fundo sempre sabemos.

E nós, homens, não?, Yuri indagou-se. Estava com o coração apertado desde a conversa com Simone, pensando em todos os problemas que essa questão do DCE deve trazer para eles. Por um momento, em meio aos seus tradicionais pensamentos autossabotadores, chegou a cogitar um cenário em que Fred se aproximou dele apenas para usá-lo nas eleições, convencendo-se logo em seguida de que o playboy não iria tão longe... mas será que não iria mesmo? Até onde o conhecia de verdade?

— Você tá certa... — ele fez uma breve pausa. — Jenifer... e sobre o Hugo, como você se sente?

— Hugo é um milagre de Deus. Eu fico emocionada vendo o progresso que ele fez e sinto cada vez mais que é a pessoa certa para mim — ela respondeu, seus olhos brilhavam e o sorriso que se desenhara em seus lábios era a coisa mais linda de se ver.

Yuri engoliu em seco. Era emocionante ver a amiga feliz depois de tudo que passou no último ano, mas a que custo? Hugo desejava sair do movimento mas o movimento não deseja que ele saia. E se eu puder mesmo ajudar?, sabia que isso poderia acabar mal, mas sentia cada vez mais que devia isso a Jenifer.

Um dos grupos de calouro venceu a disputa e todos vibraram em comemoração. Jenifer foi até Bela e Vicente, e Yuri seguiu até uma das colegas de Fred que estava sozinha, acendendo um cigarro.

— Bia, posso te perguntar algo?

Com o cigarro na boca, ela ofereceu a carteira para ele.

— Não, obrigado. Eu não fumo.

A moça fez uma expressão de decepção e depois guardou seus cigarros no bolso da calça jeans.

— Diz — ordenou, soltando a fumaça para cima, o que não evitou que o cheiro invadisse as narinas do mais novo.

— Você sabe se o Simas tá contratando?

Bia fez uma careta.

— Eu não tô mais com o Simas, se você não sabe.

— Eu sei, mas agora ele tá com a... sua mãe — Yuri falou, o tom de voz diminuindo a cada palavra.

A estagiária de Lumiar revirou os olhos e depois deu um novo trago no cigarro.

— Eu não te aconselharia a trabalhar lá. Simas explora os funcionários, dica de amiga.

— E que patrão não faz isso? — Yuri respondeu como se fosse um grande militante do movimento proletário, deixando escapar um risinho. — Mas eu pensei que se ele tivesse um lugar que eu pudesse ficar, o bar é perto da faculdade, então...

Bia franziu o cenho enquanto soltava a fumaça.

— Olha, eu não sei se ele aceitaria isso, mas tem um depósito onde ele guarda as bebidas, talvez se colocar um colchão ali, um ventilador...

Aquilo seria o suficiente. Distante da convivência com Piedade, ele se manteria alienado ao que estivesse acontecendo por lá. Talvez fosse a solução mais canalha e egoísta que poderia adotar, além de que sentiria muita falta de toda a família de Dona Sol, mesmo assim precisava manter essa rota de fuga em aberto, pois sabia que se continuasse morando lá, cedo ou tarde acabaria aceitando a proposta de Hugo.

De repente, Mateus veio até eles, abraçando Bia e pedindo um cigarro para ela.

— Com licença — Yuri falou.

— Ah, vai sair por que eu cheguei? — o intruso provocou, em seguida barrou o vento com a mão para poder acender o cigarro.

— Vocês se conhecem? — Bia perguntou, olhando para os dois com confusão.

— É uma looonga história — respondeu o rapaz, dando um sorriso sarcástico.

— Podem contar que eu adoro uma fofoca... — Bia brincou. Mas não tiveram tempo, Alice e Guiga gritaram por ela de longe, ela acenou de volta e fez um gesto para que esperassem. — Eu já volto... — despediu-se. Quando e se voltasse, Yuri não pretendia estar lá a sua espera.

Mateus soprou uma nuvem de fumaça.

— Pelo visto, Nando não voltou ainda.

— Me diz você, aposto que ainda tem falado com ele — retrucou Yuri, com pouca paciência.

O mais alto deu de ombros.

— Você nem imagina o tanto — e então deu uma gargalhada, escorando-se na parede. Yuri balançou a cabeça, começando a ficar realmente irritado. — Ai Yuri, eu tava te observando de longe... não sei o que ele viu em você, sabia? Nunca vi alguém mais entediante, chocho, ranzinza...

— Boa noite, Mateus — limitou-se a falar, cortando o assunto e deixando o rapaz para trás. 

Yuri seguiu passando por vários rostos conhecidos e desconhecidos em busca de Jenifer e Bela, foi quando avistou Fred e Vini conversando num canto. Os dois parecem ter percebido que ele estava lá, pois olhavam em sua direção como se ele fosse o assunto. Resolveu, então, se aproximar.

— Yuri cola aqui pra gente esclarecer uma coisa — Fred chamou antes mesmo que ele chegasse até eles. 

Fez o que foi solicitado. Fred o segurou pelo ombro, colocando-se ao seu lado. Percebeu certa tensão nas linhas do rosto de Vinicius.

— Fiquei sabendo que você vai competir em duas chapas pras eleições, é verdade? — o presidente do DCE perguntou, em um tom de voz irônico.

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora