Pesadelo

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Estava afundando. Não conseguia respirar. Seu coração batia forte no peito e a água negra entrava em sua boca, salgada, amarga, mortal. Eu vou morrer, pensou, em desespero, fechando os olhos e cerrando os lábios, desejando que alguém o tirasse dali. Mas ninguém apareceu para salvá-lo. Bateu os pés e as mãos, estava subindo. Via a lua cheia na superfície, chamando por ele. É noite, isso está errado. Não foi assim. E então, quando chegou próximo da salvação, começou a perder a força, pensou que iria afundar novamente, Não! De repente, duas mãos fortes atravessaram a água, segurando-o pelos ombros e puxando-o até a superfície.

Yuri debateu-se contra a água, abrindo a boca para que o ar preenchesse seus pulmões. Quando se acalmou, viu o irmão sobre uma superfície que boiava no mar, agitando-se com a movimentação das ondas. Ele tá salvo, estamos salvos, constatou, mas uma voz muito baixa falava distante: "Não foi assim".

— Urinho — Marcos chamou, com um sorriso branco nos lábios. — Urinho.

O irmão mais velho segurou nos ombros de Yuri, que sorriu emocionado.

— Você me matou — Marcos acusou, de repente. O sorriso desapareceu dos lábios dele, dando lugar a uma expressão de ódio. — Você nunca será igual a mim. Assassino!

Não, por favor, meu irmão, o rapaz desejava dizer, mas nenhuma palavra saíra de sua boca. Também não teve tempo, Marcos empurrou-o para baixo, afogando-o na profundeza escura.



Yuri acordou de sobressalto. Não estava conseguindo respirar, seu corpo tinha espasmos, suas mãos tremiam, sua boca tinha um gosto amargo. Ele sentou-se sobre o colchão, ofegante, com a vista escura, estava molhado de suor. Ouviu uma voz chamar por ele, "Yuri? Yuri?", Marcos?... Não, era a voz de Fred. O que ele estava fazendo ali? Ah, o baile...

— Cara, você quer que eu chame a Jeni? — perguntou, com um tom de voz preocupado. Estava ajoelhado em frente a Yuri, com uma das mãos sobre o seu ombro e a outra segurando o seu rosto.

Ele ameaçou levantar, mas Yuri agarrou-o pelo braço, deslizando até encontrar uma mão.

— Não!

— Tá legal, mano. Eu não vou sair de perto de ti, prometo — ele apertou a mão de Yuri. Sua voz era tão suave... quando foi que ficou assim? O mais novo estava confuso — Só respira. Vai passar. Confia em mim?

E Yuri decidiu confiar. Fred sentou-se ao lado de Yuri, a princípio com a mão segurando a sua, depois se soltou para envolvê-lo no braço dele, apertando com firmeza o seu ombro.

— Puxa o ar. Foi um pesadelo, só isso — Fred orientava.

Aos poucos, os músculos de Yuri se tornaram menos tensos, e ele foi amolecendo. Lembra-se de ter encostado a cabeça no ombro do amigo, de ouvir o som da respiração dele, do barulho de chuva lá fora. Depois, apagou.



A primeira coisa que Yuri viu ao abrir os olhos foi o rosto de Fred. Estava dormindo tranquilamente virado para ele. Primeiro, Yuri se perguntou como foi que aconteceu, depois se lembrou de ter acordado no meio da noite, que aquilo não havia sido um sonho. Que vergonha, meu Deus!, lamentou, constrangido. E então olhou novamente para o amigo, e a primeira coisa que sentiu foi uma urgência em tocá-lo. Resistiu ao impulso e levantou, com cuidado para não despertá-lo.


***


Todos tinham saído cedo para a igreja, o café estava pronto, então Yuri não teve muito o que fazer. Fez ovos mexidos para comer com o pão fresquinho comprado por Dona Marlene na padaria da esquina. Estava comendo quando Fred apareceu, com a cara amassada, esfregando os olhos.

— Bom dia — ele cumprimentou, dirigindo-se a uma das cadeiras vazias.

— Bom dia. Quer alguma coisa? Tem café, manteiga, pão, ovos, bolo... — Yuri ofereceu.

Fred fez uma careta e gemeu.

— To sem fome — respondeu, depois ficaram em silêncio. — Vou aceitar um café.

O visitante perguntou sobre as mulheres da casa, Yuri explicou que tinham ido à igreja e eles engataram uma conversar sobre isso por um tempo. Até que ficaram em silêncio novamente.

— Sobre ontem a noite... — Fred, que ainda estava sentado tomando o seu café, começou a dizer.

— Não precisa se explicar... — atravessou Yuri, que estava na pia lavando a louça suja. — Você bebeu demais e estava carente... por causa do término do namoro. E como sabe que eu gosto de caras, veio me beijar. Esse é você... agindo primeiro e pensando depois. Nada de anormal. Certo? — virou-se para o amigo, com um sorriso de canto de boca.

Fred pareceu estar confuso.

— Eu ia falar sobre o pesadelo, mas já que entrou nesse assunto... Foi mal, de verdade. Eu errei, me deixei levar por... um impulso idiota que não sei de onde veio, mas passou e não vai mais se repetir... prometo. Não vamos deixar que nossa amizade seja prejudicada por essa bobagem... Aliás, valeu por ter se importado comigo, eu não devia ter insistido em dirigir — pediu.

Yuri estudou o rosto de Fred por alguns segundos, tendo a impressão de que ele estava incomodado com alguma coisa, ou escondendo algo. A verdade é que talvez apenas estivesse se projetando no amigo, pois ele mesmo estava mentindo. Mentia pra Fred na esperança de que o seu coração aceitasse essas palavras como verdade.

— É isso... Já esqueci. Jogo que segue — Yuri forçou um sorriso. — Foi mal por ter te acordado de madrugada. É que...

Fred soltou uma gargalhada.

— Mano você meteu um chutão em minha cara — contou, com bom humor.

Yuri também riu, constrangido.

— Mas sério agora. Você tem planos pras férias? — Fred perguntou. Yuri fez que não com a cabeça. — Pois então eu sei quem pode te ajudar com esses pesadelos. Quando terminar o período, vou te levar lá. 

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora