A Última Semana

314 42 50
                                    


Yuri girava a caneta próximo da boca enquanto lia um texto de Teoria Geral do Processo. Estava deitado de bruços na cama de Jenifer, com os cotovelos apoiados no colchão. A filha de Sol estava lendo um livro da mesma disciplina bem ao lado dele, encostada na cabeceira.

— E então? — Ela perguntou, de repente, olhando-o sobre o livro de capa amarela.

— O quê?

— O que achou do assunto?

— Complexo. —Yuri respondeu, dando um sorriso para a amiga. A verdade é que pouca coisa havia entrado em sua cabeça.

Jenifer fechou o livro, abandonou-o na mesa de cabeceira e se deitou ao lado de Yuri.

— Amigo, você anda muito distraído. Se tiver rolado alguma coisa e você quiser alguém pra desabafar, eu estou aqui pra escutar.

Ele respondeu com outra pergunta:

— Você vai me contar sobre o Hugo? — Jenifer torceu o lábio para o lado e ficou repentinamente tímida. — Eu e Tatá vimos vocês dois se beijando no baile.

Ela pareceu surpresa e envergonhada.

— Viram? Meu Deus... Como ele reagiu?

— Mal. — Yuri revelou, abandonando a apostila. — Ele ainda acredita que vocês têm uma chance de voltar.

Jenifer ficou em silêncio, pensativa.

— Vocês têm?

Ela virou, deitando de costas para o colchão.

— Nenhuma chance. Eu estou em paz agora. Um dia ele vai entender isso.

Yuri suspirou, deitando-se de barriga pra cima ao lado da amiga.

— Você parecia apaixonadinha mesmo... — provocou, em tom de brincadeira.

Jenifer riu sem graça.

— Eu jamais pensei em me envolver com alguém como o Hugo, mas agora... eu sinto que ele está mudando, e eu também. Estamos crescendo juntos.

— E o Rafa?

— É meu irmão. — respondeu, com firmeza. — Foi um pecado abominável tudo isso que aconteceu entre nós. Só de lembrar, meu estômago se revira inteiro.

— Vocês não sabiam de nada — Yuri minimizou.

— Agora a gente sabe. Também não importa mais. Hugo está sendo minha cura — disse ela, derretendo-se. — Mas vou precisar de um tempo para poder entender isso tudo e contar para minha mãe, pra minha avó, para o Ben...

— Eu entendo.

E então Jenifer se sentou, encostando novamente na cabeceira, de onde encarava Yuri.

— E você, não vai me contar mesmo o que está rolando? É algum problema com Fernando?

— Não. — Yuri respondeu, de imediato. Depois pensou melhor no assunto e voltou atrás. — Quer dizer, é mais ou menos.

Por alguns segundos, Yuri se perguntou se deveria desabafar ou não, achou que seria mais sensato que não, mas sua língua estava coçando para contar. No fim, o ímpeto pela fofoca foi mais forte do que a prudência.

— Ontem a noite, antes de você e o Hugo aparecerem, o Fred meio que... me beijou — revelou. Jenifer franziu o cenho, fitando-o com estranheza. Yuri esperava uma reação mais chocante vindo dela. Por fim, entendeu que a amiga queria ouvir mais, e então continuou a falar: — E agora eu tô aqui puto. Foi uma bobagem, eu sei, mas por quê ele fez isso? Daí fico nessa agonia, irritado, pensando em como esse playboy tem o dom de estragar tudo.

Jenifer soltou um suspiro.

— E se eu te disser que não estou tão surpresa assim? Em outros tempos, sim, seria uma grande notícia, mas hoje, de alguma forma, isso parece fazer sentido pra mim. — Yuri não entendeu onde ela quis chegar, mas decidiu não investigar. — E Fernando? Você vai contar pra ele?

Yuri fechou os olhos e levou as duas mãos ao rosto, esfregando-o.

— Eu deveria, né? Mas foi apenas mais uma bobagem do Fred. Não quero estressá-lo e nem arranjar mais problemas pra mim. Melhor me concentrar nessas avaliações finais. O que você acha?

Jenifer esboçou um sorriso enigmático.

— Amigo, eu acho que você deveria se perguntar o seguinte... se não foi nada, como você tá me dizendo agora, por que é que você tá tão aborrecido desse jeito?


***


A semana passou depressa, mesmo assim foi uma tortura. Yuri quase não pregou o olho estudando e fazendo trabalhos. A vida acadêmica roubara quase todo o seu tempo e isso foi bem conveniente para evitar Fernando. O quase graduado incentivou o estudante do terceiro período a focar nos estudos, como o bom parceiro que era, isso só o fez se sentir sujo, culpado, como se tivesse estragado uma coisa preciosa. E toda vez que se sentia dessa forma, amaldiçoava Fred em pensamento.

O playboy também não falou com ele além do necessário, procurando saber como estava se saindo, se estava conseguindo dormir, que não era pra ficar em nenhuma reavaliação para não estragar "nossos planos pras férias".



Na sexta à noite, último dia de aula para a maioria, todos se reuniram no Simas para celebrar. Yuri dividia a mesa com Fernando, Bela e Jenifer. Estavam relembrando sobre as dificuldades desse período e o que farão no próximo, então começaram a falar sobre os planos para as férias.

Fred chegou nesse instante, acompanhado de Tatá e Rafa. Ele acenou para todos da mesa de Yuri e se sentou em uma das mesas vazias.

— E você, Yuri? — perguntou Bela.

— Eu o quê? — distraiu-se com a chegada dos colegas e perdera o rumo da prosa.

— O que vai fazer nas férias, já sabe? — continuou. — Eu tô voltando pra Minas, pra casa de minha mãe.

— Ah...

— Eu o convidei pra vir passear em São Paulo comigo, mas esse amigo de vocês é cabeça dura, não quis nem saber — Fernando o atravessou.

— Ah, pois se fosse comigo, eu iria fácil — Bela brincou.

E então Yuri notou algo estranho e aproveitou-se disso para desviar o assunto.

— Ué, ali não é a Kate?

A vizinha de Jeni se juntou à mesa dos meninos, sentando-se entre Fred e Rafa.

— Você sabia que ela vinha? — Yuri perguntou a Jenifer.

— Não fazia ideia — a filha de Sol respondeu.


***


Bela estava no balcão em um papo animado com Bia e Alice, Fernando tinha ido ao banheiro, sobrando apenas Yuri e Jenifer na mesa.

— Deixa eu adivinhar, você não contou a ele sobre... aquele incidente, certo? — ela perguntou, com discrição. Estava falando sobre o baile, Yuri sabia.

— Não vou estragar as férias dele com besteira. Já passou, melhor esquecer.


***


Yuri estava saindo do banheiro do bar quando esbarrou com Fred.

— E aí, deu tudo certo? — o playboy perguntou.

O bolsista respondeu que sim com a cabeça.

— Pois então faça as malas que domingo eu passo para te pegar.

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora