Caminho Sem Volta

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— Eu já falei para o seu pai, deve ser alguma outra pessoa. Não é isso, filho? — Dona Edileuza perguntou, tocando o ombro de Yuri e olhando para ele com os olhos aflitos de uma mãe.

Yuri não conseguia se mover. Fora arrastado para o fundo do mar outra vez, afundando lentamente na imensidão profunda, como uma âncora velha e pesada. As palavras não conseguiam subir através de sua garganta, todas que tentaram, acabaram sendo sufocadas pela água.

— Deixa de ser cega, mulher! Não está vendo não? São as mesmas roupas... É pra você ver o que teu filho anda aprontando nessa faculdade — disse o dono da casa, com a voz carregada de desprezo. — Ele nunca devia ter entrado nesse negócio de faculdade, eu disse a você.

— Não, não. Yuri. Yuri, filho. Diga a seu pai que ele está errado, vamos — a mulher pediu, sacudindo o ombro de Yuri em desespero. Lágrimas desciam através de seus olhos avermelhados.

O patriarca se levantou da cadeira, puxou o celular das mãos do rapaz e esbarrou nele enquanto ia para a sala.

— Vai ficar aí calado? Coragem para fazer essas nojeira no meio da rua você tem, agora pra falar com teu pai, perde a língua.

— Não fale assim com ele. É o nosso filho! — desafiou a dona da casa, afastando-se de Yuri e indo até o marido.

— Seu filho não é santo, Edileuza. Até macho pra dentro dessa casa ele já trouxe, e fez nós dois de palhaço. Quando penso no tipo de coisa que ele fez embaixo do MEU teto... — o homem ia de um lado a outro da sala, com os olhos vermelhos e as mãos agitadas.

De repente, o patriarca da família parou de andar. Virou em direção de Yuri e foi até ele, tocando em seu rosto de forma firme. De alguma forma, isso trouxe Yuri de volta a si. Ele encarou o olhar do pai, sua face havia mudado, dando lugar a um semblante esperançoso e alegre.

— Ainda há um jeito, meu menino. Você vai largar essa faculdade de lado e voltar para igreja. É isso, esqueça todas essas porcarias que te ensinaram. Isso não é você, não, não, não. — ele acariciou o rosto de Yuri com delicadeza — Dona Valeria havia me alertado sobre essa coisa de faculdade estragar a mente dos jovens, eu devia ter prestado mais atenção nas palavras dela.

Edileuza ficou animada. Após limpar as lágrimas com as costas das mãos, a mulher se aproximou do marido e do filho.

— Escute teu pai, Yuri. A gente vai encontrar um jeito de sair dessa juntos, como sempre fizemos.

Depois de minutos de profunda agonia, Yuri finalmente conseguiu falar algumas palavras:

— Eu... não vou largar a faculdade.

O semblante do patriarca mudou no mesmo instante em que ouvira aquilo. Yuri viu de perto o olhar esperançoso do pai cedendo lugar para um que era apenas desprezo. Aquilo o destruiu por dentro, mas ele não conseguia mais recuar, não mais, sentia que era a hora de finalmente deixar o casulo. 

— Esse sou eu, pai — Yuri continuou, sentindo as lágrimas subindo-lhe aos olhos. O velho retirou a mão do rosto do filho como se tocá-lo houvesse se tornado insuportável. — Sempre fui eu e sempre serei eu.

O dono da casa deu dois passos para trás, desgostoso, e então fez um comunicado:

— Pois então vá procurar os teus machos, que nessa casa não aceitamos esse tipo de abominação.

— NÃO! — Dona Edileuza protestou, chorando desesperadamente. — Você não pode fazer isso comigo. Ele é meu filho. O único que me resta! — Ela suplicou, ajoelhando-se agarrada ao marido. — Por favor, meu amor. Não. Não faça isso.

E foi então que o pai de Yuri falou algo que ele jamais iria esquecer, palavras afiadas como navalhas, que penetraram em sua pele até chegar aos ossos:

— Como pode Deus ter nos levado o filho errado? 


Com a cabeça baixa, escondendo o rosto úmido pelas lágrimas, Yuri atravessou a sala e foi até o cômodo que antes chamava de quarto. Fazia as malas com a maior rapidez que conseguia, tentando levar apenas o que julgara necessário. Ele sabia que provavelmente iria esquecer alguma coisa, mas não se importava. Seu único desejo era correr para bem longe dali. De alguma forma, passou a se sentir sufocado pelo lugar que sempre enxergara como lar, sentiu que a cada segundo que passava ali, sua vida estava sendo drenada.

— Pra onde você vai, meu filho? — Dona Edileuza perguntou, sem parar de chorar.

— Eu vou dar meu jeito, mãe — Yuri prometeu, fungando. — Não se preocupe comigo.

— Seu pai está nervoso. As coisas vão melhor, você vai ver. Fique aqui, eu vou falar mais um pouco com ele.

Yuri pôs a mochila cheia nas costas e se virou para a mulher antes que ela deixasse o quarto.

— Não, mãe. Ele já disse o que tinha que dizer.

Mãe e filho se abraçaram emocionados, talvez pela última vez. Dona Edileuza tirou um rolo de dinheiro e entregou na mão de Yuri.

— Tome, fique com isso pra você.

— É o que a senhora estava juntando para comprar uma máquina... — Yuri constatou, ainda segurando o dinheiro.

— Agora você vai precisar mais do que eu, meu amor.

Yuri desejou muito rejeitar a oferta, mas precisava daquilo. Após dar mais um abraço e um beijo na mãe, ele olhou por uma última vez para o lugar vazio do irmão naquele quarto e partiu, passando pela sala sem olhar para trás. Quando pisou na rua e olhou para os lados, deu-se contra de que não sabia pra onde ir. 

Do I make you cringe? (Fred & Yuri)Onde histórias criam vida. Descubra agora