Capítulo 35: Dia de Folga

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Narrado por Ian:

A madrugada se arrastava como um denso nevoeiro, e eu lutava contra a insônia que me perseguia. As preocupações giravam na minha mente, e a revolta queimava dentro de mim. Quando Isabele me disse que estava fora da cidade, sozinha e desprotegida, um turbilhão de sentimentos me invadiu. "Ela poderia ter me avisado", pensei, sentindo a frustração crescer. Como ela não confiou em mim durante a recuperação? Os dois meses que viriam seriam tortuosos, e eu me perguntava incessantemente onde havia falhado.

Na manhã seguinte, os gritos de Iago cortaram o silêncio da casa, trazendo-me de volta à realidade. Esfreguei os olhos, ainda sonolento, e peguei o celular. Para a minha surpresa, uma mensagem de bom dia da Isa iluminou a tela. Levantei-me, fui ao banheiro e, enquanto me ensaboava, lembrei da barba que ela detestava, sempre reclamando que arranhava seu rosto. Pronto, desci as escadas apressado, depositando um leve tapa na nuca de Iago e um beijo carinhoso na bochecha de dona Maria, que sempre se esforçava para manter a casa em ordem e o estômago de todos sempre cheio.

— Qual é, Ian? Chegou agora e já quer dominar o jogo? — Iago protestou, seu olhar furioso revelando a frustração de quem estava em meio a uma batalha virtual.

— Se não fossem seus gritos de derrota, eu teria dormido mais. — respondi, sorrindo.

— Esse hiena está gritando desde as sete horas da manhã! — Dona Maria interveio, balançando a cabeça enquanto limpava os móveis.

— Mas o duelo começou às sete! — Iago defendeu-se, tentando recuperar o controle. — Eu prefiro acordar cedo do que ficar jogando até de madrugada!

— E você não comeu nada! — Maria exclamou, arqueando uma sobrancelha. — Quando seus pais souberem, ficarão furiosos.

— Problema resolvido! — desliguei a TV, provocando um grito de indignação de Iago. — Vamos tomar café primeiro.

Enquanto nos dirigíamos à cozinha, uma brincadeira começou: empurrei Iago, que revidou com risadas. Dona Maria, irritada, mandou-nos parar. Ela era como uma mãe para nós, sempre disposta a ajudar nas dificuldades, muito mais do que nossos próprios pais.

— Querem que eu prepare o lanche de vocês? — Dona Maria perguntou, suas mãos já se movendo em direção aos ingredientes.

— Pode ser, minha Mariazinha! — Iago respondeu, acariciando os cabelos dela, que o empurrou brincando, fazendo-o gargalhar.

— Eu quero aquele cappuccino que só a senhora sabe fazer! — pedi, mal sabia eu que o amor dela por nós era disfarçado em xingamentos carinhosos. Conhecia-a há quase vinte anos, antes mesmo de Iago nascer.

Como hoje não teria que trabalhar na empresa de meu pai, decidi aproveitar a folga. Enquanto tomava café da manhã no quarto, fugindo dos olhares críticos de dona Maria, liguei a TV e assisti a um jogo de futebol. Mas o sono logo me venceu, e ao acordar, o relógio já marcava meio-dia. A voz da minha mãe me trouxe de volta ao presente, e ao descer, vi-a abraçando Iago com um sorriso largo.

Sentamos à mesa, e uma ausência me incomodou: meu pai, sempre tão presente, não estava. As reuniões e o trabalho tinham tomado seu tempo, mas a folga que recebi me surpreendia. O almoço, uma delícia, era saudável e ninguém se atrevia a recusar a comida de dona Maria.

Logo após a refeição, decidi ligar para a minha princesa, já sentindo sua falta.

Ligação on:

— Oi, Isa! — digo assim que ela atendeu, minha voz cheia de saudade.

— Oi! — ela respondeu, com um tom frio que eu já conhecia.

— Como estão você e o bebê?

— Estamos bem, protegidos.

A palavra "protegidos" ecoou estranha em mim. "Hoje era dia de ficarmos juntos", pensei. O desejo de estar ao lado dela queimava dentro de mim.

— Estou de folga, mas preferia trabalhar do que ficar longe de você.

— Ah, eu também... Mas a vida nos impõe escolhas, às vezes as mais difíceis que não há como fugir.

— Difíceis como...?

— Eu preciso desligar. Me liga mais tarde, tá?

Ligação off.

O silêncio que se seguiu foi pesado. Algo estava errado, e uma inquietação começou a crescer em meu peito. Eu não tinha planos para o resto do dia, exceto recuperar o carregador do celular que havia esquecido dentro do carro.

Ao abrir a porta, o sol brilhava intensamente sobre o condomínio. Destranquei o carro e, ao procurar o carregador, notei uma garrafinha vazia. Quando me virei para sair, avistei a Duda, que me fitava com um sorriso que eu não queria ver. O que ela poderia querer? A raiva ressurgiu, lembrando-me do papel dela na separação de Isabele. O dia estava apenas começando, mas a tensão já pesava no ar.

De Repente GrávidaOnde histórias criam vida. Descubra agora