112º Capitulo

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112 capitulo

Porém...
Mesmo com os espinhos, a rosa amarela foi ferida.

Espinhos recém-nascidos não são tão fortes, é sabido.

Seu caule começa a envergar, suas pétalas agredidas caíam, espalhadas ao seu redor como cacos de vidro que carregavam pedaços da rosa refletidos. Nem mesmo a camada de proteção que tinha desde que nascera podia suportar.

Mas o sorriso dele aboliu a escuridão; o doce orvalho aprisionado por sua bondade. Ele surgiu e afugentou a sombra.

E ainda que o horror estivesse fazendo a rosa amarela tremer e espalhar seus espinhos sobre ele, o ferindo, ele continuava a sorrir, e usava o próprio sangue para grudar as pétalas caídas de volta aos seus lugares, sozinho.

A rosa amarela tinha que agradecer ao orvalho aprisionado. Tinha que aceitar o amor que ele lhe dava, porque era exatamente o que ela mais precisava, mesmo sabendo que estava apenas em um intervalo onde a luz floria.

Pois não tardaria a crepuscular.

E a escuridão voltaria.

Ela estava lá: parada, pálida. Um grande hematoma esverdeado no antebraço, os dedos negros estampados no pescoço e as palmas das mãos feridas...seus olhos azuis encontraram os meus e só senti a lágrima escorrer quando percebi que ela, meu reflexo no espelho, tinhas os olhos marejados ao perscrutar as marcas de violência no corpo. Forcei-me a encarar por mais um instante o que expunha, era como se eu pudesse sentir a vergonha irradiando dos meus poros, ainda que eu não devesse sentir...As marcas me deixavam suja. Maculada.

Você venceu. O homem que fez isso está preso, a mulher que tentou te matar está morta. Você venceu.

Mas ainda que tentasse me enganar com as palavras( ainda que eu quisesse ser enganada por palavras), meu corpo sabia a verdade e não seria convencido. Eu estava bem, eu sabia, estava junto da minha mãe e estava junto dos meus amigos e isso é mais do que muita gente tem, e ainda assim, bastava eu fechar os olhos, e ninguém estava por perto, somente ele estava ali, livre pra terminar o que começou...quase dava pra sentir seu peso sobre mim novamente, me derrubando, me soterrando sobre seu corpo nojento e petrificante, me prendendo com as mãos gordurosas e tentando me tocar, e quando eu gritava sob ele, já era como se eu estivesse gritando ao ver minha mãe se colocar na frente da arma, ou quando Shonda disparou sobre o policial, ou sobre quando deslizou o cano da arma sobre minha cabeça...quando Jem se colocou na frente...ou como sentir a ânsia de quando o cheiro do cérebro de Shonda se espalhou na sala...

E lá estava eu, tremendo, diante do espelho. Todos os dias vou ter que passar por isso?

Seguei meu rosto, me vesti, e comecei a espalhar o pó branco sobre minha pele, tentando esconder as marcas. Até que me lembrei de que ontem, enquanto eu passava por tudo isso, Troy fez mais do seu jogo diabólico, que usou a morte da mãe de Agnes contra a turma...e só podia sentir raiva. Ele busca nossas fraquezas e eu já fui fraca o suficiente.
Encarei os hematomas mais uma vez.

Peguei lenços e limpei o pó de meu pescoço e braço, as manchas voltaram negras esverdeadas, mas já não me assustavam, já não me lembravam da minha fraqueza. Me lembrava da minha força. Eu estou com elas porque venci. Não estava tudo bem, não era fácil vê-las, mas não me sabotaria por isso. Essas são as marcas da luta que venci e não tenho que ter medo de nada.
Era isso que esperava que ele percebesse quando nos visse. Terminei de me arrumar e desci para o café com minha mãe. Ela me esperava na cozinha da casa de Agnes e embora o lugar fosse estranho e soubéssemos o que tinha acontecido bem ali naquela cozinha, me senti reconfortada por vê-la. A abracei e tomamos nosso café, ela dizendo sobre o noticiário da tv do que tinha acontecido...que tivera que dar algumas informações e que tirara a participação de Jem de tudo.
A assassina suicida.
Eram como estavam chamando. Não aguentei ver o noticiário na madrugada de ontem...pelo menos Jem fora poupado. As imagens mostravam a nossa casa, nós enquanto saíamos do hospital...e informações sobre o contexto de tudo. A bissexualidade da minha mãe exposta. Ela parecia bem com tudo, abatida, esgotada, mas bem. E não tínhamos repórteres nem nada do tipo, esse fora apenas mais uma tragédia pra manchete. Depois de acabar o sanduiche, me levantei e a abracei. Era surreal que eu estivesse a caminho da escola para mais um dia normal, depois de tudo, mas se não fosse assim, só estaria perdendo tempo e me entregando as tragédias. E não me entrego mais a coisas ruins que me acontecem, não depois de conhecer Kate e os outros.

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