Bird Set Free

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“Você gritou pra que eu me calasse mas eu revidei cantando mais alto”

Eu tinha todos os motivos para odiar a vida e desconfiar das pessoas a minha volta. Mas também tinha todos os motivos para amar a vida e confiar nas pessoas que eu amava.
Após o ocorrido, eu pude finalmente provar a minha liberdade. Eu não era uma assassina, as gravações e os depoimentos de Amber foram o suficiente para me inocentar. Levou algumas semanas para tudo ser comprovado e finalizado, mas valeu a pena cada minuto.
Após me revistar a policial me pediu para segui-la, mancando obedeci. Talvez nunca mais voltasse a andar com elegância ou pudesse dançar novamente em uma barra de pole dance, o corte de Amber acertou meu musculo causando danos irreparáveis, teria que fazer fisioterapia mas nunca mais teria 100% da mobilidade de minha perna, e mesmo sabendo disso, eu estava aqui de frente para ela que usava uma camisa de força e tinha círculos escuros ao redor dos olhos, olheiras fundas. Os olhos azuis estavam vazios resultados de longas horas dormindo graças a medicamentos.
-Ouvi dizer que você é uma que mais dá trabalho aqui – comentei mas ela continuou me encarando, ou encarando o vazio. – é assim mesmo, está no nosso sangue. Nunca fomos mulheres fáceis, ou de gênio dóceis.
Me calei um instante, ela continuou calada encarando o vazio e eu suspirei.
-Não deve ser fácil ficar dopada o tempo todo – continuei – não tenho ódio de você, Amber. Você poderia ter sido uma mulher extraordinária se nossa mãe não tivesse bagunçado sua cabeça! Teríamos sido amigas, eu teria sido sua irmã mais velha, teríamos compartilhado nossas roupas, segredos, brigado como irmãs e nos defendido como irmãs. Lamento não ter tido isso com você, mas lamento muito mais saber que você cresceu a mercê de uma mulher lunática 
Fechei os olhos alguns segundos imaginando todo aquele cenário que criei na minha cabeça. Era uma pena Amber ter crescido como um alvo frágil, uma terra fértil onde Donna, Margareth, pôde plantar toda insegurança, medo, trauma, pôde até mesmo criar uma personalidade que não era dela. Ela nunca cuidou de Amber de fato, a abandonou, assim como fez comigo. A diferença foi continuar na cabeça dela.
-Eu lamento muito tudo isso, Amber – minha voz saiu fraca e foi respondida com apenas um soluço que ela deu quase babando a minha frente. O hospital psiquiátrico em que ela estava era do governo, destinado apenas para prisioneiros criminosos. Hospital psiquiátrico penitenciário da Califórnia. Era assim que se chamava e era ali que minha irmã iria viver para sempre após ter sido julgada e condenada pela morte de Leo e Donna, além de sequestro e formação de quadrilha. Grande parte da pena era por ter irritado Jared a ponto de faze-lo subornar o juiz. Eu estava internada quando aconteceu o julgamento, Jared me prometeu que Amber não iria morrer mas iria desejar estar morta.
Eu não a odiava, não como ele fazia mas não pude ir contra a decisão dele de vingança e justiça. Ele matou Angelina por mim, e eu sabia que ele mataria qualquer outro.
-Não sei se voltarei algum dia, mas queria que você soubesse disso. Adeus Amber! – concluí me levantando daquela cadeira fria de metal dando as costas para a mulher sedada presa a uma camisa de força que provavelmente não percebera o que aconteceu, que tem a mente escondida dentro de um poço de sedativos afim de controlar distúrbios criados pela própria mãe.
Manquei para fora daquele lugar triste, mórbido e assustador. Deixando as paredes cinzas para trás em direção ao carro parado na frente, à minha espera.
-E então, como foi? – Lauren disse ligando o carro, ela tentou não soar tão invasiva.
Suspirei tirando a pressão que estava em meu peito. Foi horrível, achei que ver ela ali condenada iria me trazer algum consolo, algum tipo de satisfação vingativa pelas coisas horríveis que ela fez a mim e as pessoas que eu amo, mas estava enganada. Ver ela daquela forma só me fez se sentir péssima e eu não consegui ao certo decifrar o porquê. Ela era a minha irmã mas eu não a amava, muito pelo contrário. Então por quê me senti horrível?
-Ela está onde deve estar. – respondi tentando não prolongar o assunto – é melhor irmos, ou quem acabara louca é Cara.
Kristen e Lauren sorriram amigáveis mas não quiseram dizer mais nada sobre o assunto. Elas sabiam que não era tão confortável falar do que aconteceu, por mais que tudo tenha acabado bem não era fácil narrar aquela história sem sentir um peso enorme em meus ombros. E aliás, elas já tinham o próprio peso para se preocuparem.
O carro parou em frente a casa de Constance, em santa Mônica. Desci do carro com um pouco de dificuldade mas as mãos finas de Kristen me ajudaram. Olhei para a casa e depois para as duas, paradas ao lado do carro.
-Vocês tem mesmo que ir? – perguntei fazendo uma carinha triste.
-Você sabe que sim. Nem todas nós somos realmente inocentes mas eu não vou voltar para a cadeia. – Kristen disse com aquela expressão debochada de sempre, Lauren deu uma risadinha por entre os lábios quando eu fiz um biquinho.
-Eu posso arrumar uma nova identidade para vocês, vocês podem trabalhar comigo! – sugeri tentando convence-las a ficarem mas eu sabia que era inútil e também perigoso.
-Qual é, Mag, isso não é um adeus! – Lauren finalmente disse se aproximando de mim – Nós nos veremos em breve, mas agora vou aproveitar minha “liberdade" e ir atrás do que realmente me faz feliz.
Ela fez aspas com os dedos mas estava mais animada do que de costume, feliz até.
-Minha missão aqui foi concluída, Angelina está morta, cumpri minha palavra agora preciso cumprir outra. – Seus pensamentos divagaram por um breve segundo que pude ver por seus olhos verdes.
-Isso tem a ver com uma garota Cubana? – perguntei sorrindo, e os dentinhos de coelhos apareceram também em um sorriso confirmando – vou aguardar ansiosamente vocês fazerem contato.
As duas me abraçaram fortemente, não houve lágrimas, éramos três ex prisioneiras duronas mas ficou claro ali para qualquer um que éramos amigas. Lauren entrou no carro pelo lado esquerdo, Kristen jogou o cabelo ruivo para trás e acendeu um cigarro antes de tomar o assento ao lado direito.
-Vai mesmo seguir ela até Cuba atrás de uma outra garota? – perguntei e ela tragou o cigarro 
-Fazer o quê, tenho que manter ela longe de confusão – tentou soar engraçada.
-Precisa dizer a ela o que sente – ela franziu as sobrancelhas tragando novamente.
-E você precisa cuidar da sua vida!
Eu gargalhei.
-Vou sentir falta do seu mal humor.
Ela sorriu.
-Vou sentir falta das suas ordens, patricinha.
Empurrei seu ombro ainda rindo. Ela entrou no carro.
-Vão logo!
E com um sorriso Lauren deu partida e acelerou o carro me deixando para trás.

A acompanhante (CONCLUÍDA) Onde histórias criam vida. Descubra agora