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Funerais ainda eram confusos, não só para Arina, mas para a maioria da população. Na verdade, por muitos anos a Rússia tentou passar a imagem de um país que assim como o México, entendia a morte e a festejava, mas com o passar do tempo isso foi se perdendo e os ritos necessários para que alguém partisse em paz, tornaram-se confusos.

Vonda e Hugh, escolheram fazer algo tradicional, levaram o corpo de Dária a uma capela, para que a família pudesse se despedir.

Arina foi a primeiras dentre os filhos mais velhos a chegar, acompanhada dos meninos,que fizeram questão de apoiá-la. A capela era pequena, por fora parecia um mini castelo, com um muro de tijolos a cercando, completamente pintada de vermelho e branco, com uma cruz no topo e degraus na entrada.

Por dentro tinha o chão feito de madeira, bancos típicos de igrejas, uma cruz no altar,vitrais pequenos e coloridos com desenhos de anjos... Era estranho está ali, membro mais "religioso" de sua família era seu pai, que não rezava ou falava de Deus ou qualquer entidade com frequência, e por isso, ninguém nunca se importou com o que ela acreditava ou não.  Sua fé era limitada, na verdade nem ela sabia se deveria crê em algo, mas agora, naquele instante significativo a qual andava até o caixão de sua irmã que estava no altar, ela esperava que houvesse um paraíso a espera de sua doce menina

—Capitã... —Disse Hugh ao abraçá-la

Desde o dia anterior quando foi a enfermaria, seu pai parecia ter fingido que a conversa no estacionamento não tinha existido e para não questioná-lo, ela fez o mesmo.

—Onde estão os outros?

—Olga não vem, Hera está trazendo as crianças e o Lev está lá fora com sua mãe —Apontou para a porta lateral antes da escada que levava ao altar

Ivan se aproximou e apertou a mão de Hugh—Meus pêsames!—Disse com um olhar triste. Pietro fez o mesmo que ele, mas em completo silêncio

—Acho um absurdo Olga não vir! —Disse Hugh—Acabamos de perder... Nossa família não será mais a de antes, nunca mais! —o homem coçou a barba grisalha e chorou

Arina olhou para os meninos e apontou com a sobrancelha para os bancos, pedindo que se afastassem.

Pietro encostou o cotovelo no braço de Ivan para que ele atendesse o pedido e o acompanhasse ao ultimo banco da fileira a sua direita, aquele ar de tristeza e morte foi bem diferente do que aconteceu quando seu pai faleceu.

—As crianças chegaram... —Disse Ivan ao olhar para trás

Viu Lana com os cabelos presos, uma calça cintura alta e uma blusa preta,ela acenou com a cabeça para eles,enquanto seguia de mãos dadas com os gêmeos, que pareciam ainda mais idênticos com o mesmo casaco preto.

Todos correram até Arina que ainda consolava o pai.

—Não acha injusto? —Pietro perguntou

Ivan o olhou sem entender, estava observando Hera, parada na porta da capela, tentando puxar Igor.

—Ela não pode nem chorar na frente deles! —Disse Pietro, vendo Arina sentar com Nicol no colo.

—Ela é forte! —Disse Ivan—E eles dependem dela! —Ele olhou para trás e viu Hera entrar sozinha após um desdenhoso dar de ombros

Pietro cruzou os braços —Eu sei que ela é, mas ainda assim, é injusto!

Ivan pensou um pouco enquanto observava a namorada, Arina estava de mãos dadas com a mãe e com o Nicol no colo enquanto conversava com o pai, realmente era muito para ela

—Talvez eles a suguem um pouco, mas ela foi criada assim, não tem muito o que fazer, ela daria a vida por eles! —Disse Ivan—É por isso que nos ter aqui é ruim,para a face mais forte dela!

Pietro iria responder, mas ouviu o telefone tocar, tirou o celular do bolso recebendo olhares da família de Arina e o desligou, logo após ver que a ligação era de Dmitry

—Não vai atender?

Ele negou—Serão só eles?

—O padre vai rezar quando os padrinhos da Daria chegarem, eles ficavam ela no hospital de vez em quando

Antes que Pietro pudesse devolver o celular para o bolso, o viu acender e antes que o aparelho gritasse o toque padrão ele atendeu e levantou do banco

—Já volto —Disse a Ivan antes sair da capela—O que você quer? —Falou ao ouvir o "Alô " de Dmitry do outro lado da linha

—Esperava que fosse mais receptivo, não terminamos amigavelmente?

Pietro revirou os olhos e desceu o último degrau que o separava do chão de perdas

—Eu não posso falar, estou em uma situação difícil! —Afirmou Pietro

Dmitry pigarreou—Algo sério?

—Dmitry,eu não te devo mais, por que está me ligando?—Pietro disse de forma cansada, andou lentamente em direção ao  muro de tijolos vermelhos e tocou nele

—Preciso falar com você!

—Hoje não! —Disse Pietro ao desligar o telefone e o colocar no silencioso, virou-se em direção a capelinha e só então notou Igor, sentado no segundo degrau, apertando o dedo indicador de sua prótese, ele estava desolado como todos de sua família.

—Não vai entrar? —Perguntou ao menino que levantou o olhar e deu de ombros, Pietro se aproximou e sentou-se ao lado dele —Você precisa dizer tchau.

—Olga disse que ela não está mais lá.  E eu concordo, ela não irá me ouvir ou saber que não entrei!

Pietro pensou no que dizer —Olga tem razão, ela não te escutará. Mas a Dária virou uma estrela e toda noite ela vai está lá, olhando para sua família e...

—Não precisa fingir estrelas não são pessoas! —Disse Igor ao interrompê-lo—Estrelas são esferas de plasma!

Pietro notou que ele era inteligente demais para mentiras

—Quer ouvir a verdade?  Ninguém sabe o que acontece depois que morremos e sinceramente, ninguém quer descobrir e é por isso que devemos honrar nossa vida e quiçá, ter um pouco de esperança em coisas fantásticas.—Tocou a prótese do menino —Entenda uma coisa, essa é a última vez que você poderá ver a sua irmã e por mais que ela não seja uma estrela ou qualquer outra coisa, se não vê-la agora para se despedir, pode se sentir mal depois, daqui há muito tempo. Li uma vez que velórios são para os vivos e não para os mortos.

Igor parecia pensar. Pietro o encarou e pôs-se de pé

—Espera! —Disse o menino

Pietro olhou para ele e o viu levantar

—Obrigado! —Disse Igor ao esticar a mão como adulto, Pietro o admirou pela maturidade e após soltar a mão dele, o viu entrar.

Pietro sorriu de forma triste e voltou a Capela, onde sentou ao lado de Ivan

—Então? —Ivan perguntou

—Acho que tenho jeito com crianças! —Disse Pietro, ao notar que Igor estava junto com os outros, havia um ar forte e diferente nele assim como existia em Arina. Estava sério e ao invés de ser consolado por um dos gêmeos -que Pietro não conseguiu distinguir por estarem de costas - era ele quem consolava.

—Você é gentil! Por isso gostam de você!—Afirmou Ivan ao olhar para a porta da capela e ver uma figura conhecida —É o Chaban?

Pietro olhou para trás e reconheceu o homem imediatamente




Os Traidores - Série Crianças de MoscouOnde histórias criam vida. Descubra agora