Do The Evolution

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Portland, Oregon. 1993. (Atualidade).
...

-Sabe, nesses momentos eu só queria ter direito a ir para um show da Nirvana e cantar Smells Like Teen Spirit até ficar rouca -Charlotte reclamava, enquanto se jogava na cama de Kai e observava ele continuar mexendo em alguns grimórios.

Ele olhou para Charlotte por cima do seu grimório, então acabou sorrindo dela.

-Eles estão em uma turnê, parece que foram para outro país, duvido que vão vir para Portland tão cedo -Kai comentou, virando uma página amarelada do livro.

-Provavelmente eles ficariam desanimados por verem você com a cara enfiada em livros -ela comentou ironicamente, e jogava uma bolinha de papel em Kai.

Kai pegou aquele pedaço amassado de papel e olhou para a garota. Ele fechou o grimório, o colocando sobre o próprio colo.

-Eu quero matar toda a minha família e de brinde virar um herege, eu tenho que saber controlar minha magia -ele dizia, gesticulando de forma sarcástica. -E você devia fazer o mesmo, duvido que você consiga controlar a sua magia tão bem.

Ele ergueu a mão, jogando a bola de papel na direção de Charlotte.

-Phasmatos Incendia! -ela disse com firmeza, fazendo a bola de papel se reduzir a cinzas no ar. -Bom... Eu consigo estripar e colocar fogo em quem eu quiser, acho que isso já serve.

-Tá bom, você ganhou -Kai levantou as mãos, como um irônico sinal de rendição. -Eu adoro sair com você, mas nós precisamos inovar. Nós saímos, cantamos karaokê, matamos alguém e voltamos ao nosso doce tédio.

-Nós também transamos -acrescentou Charlotte de forma natural.

-Verdade, e é muito bom, por acaso -respondeu Kai com a mesma naturalidade. -Mas eu quero uma coisa pra trazer adrenalina, algo diferente.

A garota ergueu um pouco o seu corpo, ficando sentada sobre a cama. Ela pegou o grimório do colo de Kai e começou a folhear as páginas, seus olhos lendo rapidamente os feitiços que estavam escritos.

-Uh, isso parece legal -ela comenta com seu olhar fixo em uma determinada página.

Charlotte se arrastou para a beirada da cama, ficando frente a frente com Kai, apontando um trecho do livro com o dedo indicador.

-Olha isso, é um feitiço mental. Já ouviu falar?

-Um feitiço para ver as memórias de outra pessoa... -Kai sorriu, seus olhos fixos naquela página. Ele voltou a olhar para Charlotte. -E aí, quem vai ser a nossa cobaia?

-Qualquer um -ela deu de ombros, de forma brincalhona, e acabou rindo. -Josette, Lauren... Algum idiota que nós vamos matar futuramente.

-E você acha que eu ia conseguir? -o olhar de Kai se voltou para o livro, enquanto ele lia mentalmente os comandos escritos.

-Tenta fazer comigo, acho que vai ser interessante você saber como eram os anos 60 -o tom de Charlotte era o típico irônico descontraído, junto com um breve sorriso desenhado em seu rosto.

Ele sorriu, observando a garota.
Kai colocou as mãos sobre o rosto dela, absorvendo um pouco de sua magia. Já havia virado um costume entre eles dividirem a magia um com o outro.

-Então, me leve para a época de Elvis, amor -Kai comentou com ironia.

Ele fechou os olhos, se concentrando totalmente no feitiço.
Em poucos segundos, Kai conseguiu entrar nas memórias de Charlotte. Ela estava colaborando com aquilo, deixando sua mente livre e sem obstáculos.
Kai sentia como se tivesse saído de seu corpo e estar passando por um filme. Era interessante ver a história de Charlotte estando diretamente na mente dela, sujeito a todos os detalhes e emoções.
Algumas memórias eram rápidas, como pequenos flash's.
Anos 70. Anos 50. Anos 30.

Quando de repente... 1854?

As memórias ruins aparentavam serem as mais nítidas na mente de Charlotte, e agora Kai sabia sobre aquilo.
Tinha muito sangue, mas dessa vez não era sangue das vítimas de Charlotte, era o sangue dela mesma.
Ele viu a jovem garota com os hematomas causados pela mãe.
Ele conseguiu ver a noite que Charlotte percebeu quem seu pai era.
Conseguiu sentir toda dor e angústia, como se fosse ele que estivesse com ela naqueles momentos.
E ele viu Katherine arrancando o coração dela para transformá-la em uma vampira.
Os olhos de Charlotte continuavam os mesmos desde 1854, mas eles estavam mais castigados. Carregavam mais dor e agora mais frieza do que a Charlotte de 17 anos.

Kai foi puxado para longe dessas memórias quando Charlotte bloqueou sua mente.
Ele voltou a realidade, ainda tentando digerir tudo que havia visto. Ele sentiu Charlotte tirar, cuidadosamente, suas mãos do rosto dela.
Conforme seus olhos se abriram, ele pôde observar Charlotte. Uma Charlotte diferente das memórias. Ela era mais forte, evidentemente mais bonita. Ela tinha mais confiança em poder, mas acima de tudo independência e maldade que brilhavam em seus olhos.

-Acho que você pulou de 1960 para 1854 -a garota comentou com o olhar voltado para um canto. Sua voz saiu sem emoção, mas com uma pitada de ironia para ocultar suas emoções.

-Isso aconteceu com você em 1854? -questionou Kai, logo acrescentando. -Não precisa responder, se não quiser.

Ela ficou em silêncio por alguns segundos.
Sua confiança com Kai era total, mas certo traumas são difíceis de serem ditos em voz alta, mesmo após um século.

-Eu tinha 17 anos -aos poucos Charlotte voltou seu olhar para Kai. Ela se esforçava para manter um tom firme. -Por isso nunca quis falar sobre meu pai, não é bem uma lembrança em que eu goste de falar ou relembrar. E eu não quero ser rude, mas não vou ser aquela garota fragilizada e não vou te pedir desculpas por nunca ter falado com você sobre isso.

-Eu nunca pensaria que você teria que se desculpar por isso.

Ele respondeu com calma, enquanto tirava uma mecha de cabelo que estava sobre o rosto pálido de Charlotte e observava cada detalhe de seu belo rosto.

-E eu nunca vou pensar nada ruim sobre você, sabe por quê? -ele perguntou retoricamente, passando sutilmente o polegar sobre a bochecha de Charlotte. -Porque eu amo você. Apenas você e para sempre você.

Charlotte o olhou no mesmo instante. Ela se sentiu surpresa por ter ouvido aquilo.
Kai não podia negar ter sentido um pouco de ansiedade no instante que as palavras saíram de sua boca, com receio da reação da garota.
Mas esse medo passou quando viu Charlotte sorrir, aquele sorriso espontâneo e verdadeiro.
Ele segurou o rosto de Kai em suas mãos, e depositou um beijo rápido em seus lábios.

-Eu também amo você.

Ambos eram tão parecidos. Não se importavam com mais ninguém além deles mesmos.
Não se importavam com sangue derramando. E apenas queriam a grandeza
Mas juntos eles eram os únicos cicatrizantes um do outro.
Kai ofereceu a Charlotte seu primeiro "Eu te amo".
E Charlotte ofereceu a Kai seu primeiro "Eu te amo" verdadeiro.

Talvez almas gêmeas não existem, mas sabemos que duas almas quebradas podem se completar.

A Devil RomanceOnde histórias criam vida. Descubra agora