Azriel, 14 anos.
O garoto que tinha as sombras como melhores amigas respirou fundo e encostou a bochecha no sofá da tenda do rapaz de olhos violeta.
Uma fresta de tecido grosso e denso estava aberta e o ar entrava periodicamente, conforme os ventos sopravam. Os cabelos escuros na testa do garoto iam e vinham, ele gostava da sensação, os fios lhe tocavam a pele e era como um carinho oferecido pela natureza. Ele ouviu o ressonar alto do garoto de cabelos longos, sorriu.
Ele tinha amigos. Pela primeira vez em sua vida.
O cheiro de terra molhada chegou, bem como o som do gotejar de encontro a superfície dura e áspera que servia como teto. O som o acalmava, mas ainda assim, ele não conseguia dormir. Tinha pesadelos com os anos nas paredes de pedra e cheiros fétidos. Algumas vezes os rapazes o ouviram grunhir em seus sonhos perturbados e por isso ele dormia o mínimo possível. Não queria mostrar o que temia.
Por isso, ele fechou os olhos e sentiu o vento movendo seus cabelos, o cheiro gentil da chuva e o gotejar suave. Ele sorriu suavemente. Ele estava quase dormindo, os olhos estavam pesados e o corpo tão relaxado. Mas um som mais forte, uma rajada de vento assoprou as bordas da tenda e ele abriu os olhos. Levantou-se, esticou as asas, que já cresciam maiores que a de todos os garotos de sua idade no acampamento. Sentiu o chão frio nos pés e caminhou ainda sonolento, abriu de leve a porta.
A lua estava enorme. Redonda e brilhante, adornada por estrelas como um pescoço se adorna com colares de diamantes. Ele sorriu, o vento tocou seu rosto e as gotas de água se acumularam em seus cílios.
''Azriel...''.
Ele quase conseguia ouvir ela chamar seu nome. Por algum motivo, ele não pôde mais dormir. Sentou-se onde o corpo ainda estava protegido e observou o astro e sua canção densa e enevoada até que ela se fosse o sol nascesse.
Meu corpo pesava toneladas.
A sensação de todas as dores em todos os lugares me atingiu e eu choraminguei. Mas a dor dentro de mim era maior e mais forte que qualquer outra.
Em silêncio, o cheiro salgado do mar e o som das ondas quebrando no casco de madeira escura do barco me resguardavam. Com as duas mãos estendidas no colo de Azriel, enquanto ele limpava as sujeiras e passava uma mistura de ervas medicinais para acalmar a dor na pele.
Nem todo unguento do mundo limparia a dor dentro de mim.
Ele não me deixou sozinha por nenhum segundo sequer. Não desistiu quando eu pedi para me transportar até Apollo, nem quando eu o bati, ou quando chorei em seus braços. Ele continuou ali, em silêncio ou cantarolando canções suaves e baixas. Eu não consegui dormir. Como poderia?
Mas ele ficou ao meu lado. Insistiu até eu deixar ele limpar minhas mãos destruídas. Eu não as quis curar. Não poderia. Eu queria todas as cicatrizes, todas as marcas. Lembretes que ela foi real. Que Aurora foi real.
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A Corte de Luz e Sombras (FINALIZADA)
FantasyAthera nunca quis mais do que uma vida tranquila ao lado de sua família, e agora, depois do fim da guerra que deixou traumas, marcas e cicatrizes, ela decide finalmente tentar. A imediata do grão-senhor mais poderoso do país vai em busca de liberda...