VINTE E CINCO

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AZRIEL

O corpo dela em meus braços.

A fêmea mais forte que eu conhecia tremia com a cabeça apoiada em meu peito.

Tanto ódio se despertou dentro de mim, ainda que eu seja especialista em ódio, um tipo mais forte e desconhecido estava ali, porque eu nunca mais permitiria que alguém a deixasse dessa forma.

Voei até nossa casa.

Nossa casa.

Essa combinação de palavras ainda era tão nova em meus ouvidos que pensar nela causava algum estranhamento.

Quando pousei na torre, o som do tilintar dos cristais se unindo a ventania, não deixei que ela caminhasse até o quarto, mas desci as escadas com ela ainda aninhada no colo, meus braços em torno de seu corpo ainda trêmulo.

Fui até o quarto e me sentei com as costas apoiadas na parede, ela tremia muito, e eu gostaria de doar toda a felicidade que poderia existir dentro de mim para que ela ficasse ao menos um pouco melhor, se sentisse mais feliz.

Então ela começou a chorar. As lágrimas molhavam minha jaqueta e as mãos geladas agora tremiam em meu pescoço. Me senti tão desesperado para que ela se sentisse melhor, que estivesse feliz.

Mas eu sabia que a dor era tão necessária quanto a alegria para forjar as convicções dentro da mente.

Então deixei que chorasse, deixei que suas lágrimas desesperadas corressem em meu peito e que seu corpo tão lindo e cheiroso tremesse contra mim, tudo bem, tudo ficaria bem. Eu a protegeria, cuidaria dela, estaria ali para sempre, enquanto eu existisse, eu sabia.

- Ela me disse... – Athera murmurou entre soluços – que ele iria matar ela, ele iria matar ela, Az. – Ela dizia, tremendo contra mim.

Eu acariciei seus cabelos com a mão livre, o polegar em seu rosto, um toque em sua pele era capaz de acalmar meu pânico, tranquilizar meu corpo e meu ódio.

Aquela fêmea tão pequena contra mim era meu universo, minha parceira, a única coisa capaz de me manter vivo no mundo a partir do momento que o laço nos uniu.

- Quantas fêmeas se sentem assim? Pela mãe, eu... se eu não conseguir... – Ela ainda falava, com soluços altos e agudos.

Levantei seu rosto levemente com a ponta dos dedos, ela virou os olhos inchados e vermelhos para mim e eu me senti tão sortudo.

Quem diria que um bastardo illyriano seria digno da glória de pertencer a alguém como ela?

- Você vai conseguir – eu disse, a voz firme, mas suave – nós vamos, eu, você, Cassian, Feyre... Estamos todos juntos nisso. – Eu prometi, ainda acariciando sua bochecha molhada com o polegar.

Abaixei um pouco a cabeça e encostei minha testa na dela, inalando seu cheiro, ainda que misturado ao suor, o mais delicioso de todo o mundo.

- Eu vou estar ao seu lado, Athera – eu prometi, a testa ainda unida a dela – ainda que as estrelas caiam do céu, eu irei estar contigo e proteger você, deixar que elas caiam em minhas costas, e se proteger e ensinar a essas fêmeas é a sua aspiração de vida, então eu darei a minha para fazermos isso. – Eu sussurrei.

Ela então deu um sorriso tão leve e tão lindo, se moldando ao rosto inchado e ao corpo ainda trêmulo que eu sabia que nada mais fazia sentido.

As sombras em meu corpo tremeluziam e viajavam nesse sentimento tão profundo de gratidão em mim, nem eu nem elas erámos acostumados a isso.

Eu as enviei silenciosamente ao acampamento, para observar as fêmeas.

- Eu não sei o que eu fiz para merecer você. – Ela sussurrou.

E eu jamais ouvi coisa tão absurda assim. Ela existe. Tão poderosa, linda e sensível, irônica, deliciosamente inteligente, perspicaz, sarcástica, divertida.

Levantei seu corpo um pouco mais estável e lavei cada parte dele com água morna e esponja, adorando sua pele e seus ossos enquanto esfregava sua carne, seu rosto adornado de beleza, seus cabelos grossos e longos boiando como se fossem flores e plantas, uma náiade, uma deusa, mais do que qualquer um dentro do mundo merecia ela era, e eu a tinha.

Ela já cochilava exausta quando eu carreguei em meus braços até a cama e me deitei ao seu lado, acariciando seu rosto, suas bochechas, seu nariz arrebitado, os lábios desenhados e grossos, os olhos fechados com uma expressão deliciosa de paz, a respiração estável e o som incrível do poder em seu peito pulsando vida.

O corpo sensual e delicioso moldado ao colchão macio, as coxas grossas se estendendo entre os lençóis, o quadril largo e a curvatura de sua barriga, nada nela era menos que perfeito, os pelos claros no meio de suas pernas que ficavam tão bem com meus dedos, quando eu estimulava seu prazer ao máximo que poderia chegar, as panturrilhas e o tornozelo desenhado, seus pés claros e macios, as mãos suaves e fortes com unhas grandes escuras.

Os seios fartos estavam tão perfeitamente empinados para cima, as cicatrizes de seus braços, a curva entre seu pescoço e seus ombros estreitos, agora marcados pela minha falta de delicadeza na noite anterior, as orelhas tão vermelhas nas pontas longas, os dedos que repousavam sobre o travesseiro, as marcas ao redor de sua cintura e quadril, as sobrancelhas cheias e desenhadas e os lábios vermelhos, desenhados e tão espessos.

Os longos cabelos que moldavam a cama, claros e dourados caindo como cascatas.

Nada nela era pouco, ou medíocre, ou menos que perfeito e excepcional. E eu amava cada parte de seu corpo com a minha vida.

Ela dormia profundamente em um ritmo lento e sutil enquanto eu enchia seus cabelos com carinhos ritmados, não prestando atenção em mais nada no universo que não fosse sua existência, como as estrelas que brilhavam muito fracas no céu a essa hora, ou as sombras enroscadas em meus braços, ou a luz que brilhava enquanto ela dormia.

Athera se virou e enroscou as pernas nas minhas e a cabeça em meu peito, eu apoiei a cabeça na mão e continuei observando sua figura calma.

Eu nunca pensei que sentiria algo mais forte do que a potência do meu ódio e do meu desejo por vingança, até amar cada vinco e cicatriz, cada lufada de ar e respiração dessa fêmea.

Na qual cada toque é uma música e cada vez que digo seu nome, uma oração.

Poderia a luz brilhar dentro das sombras mais complexas e enevoadas? Porque a luz lunar de seu corpo agora se enroscava com a minha névoa sombria e afiada, em pura harmonia, como as duas criaturas mais e menos parecidas ao mesmo tempo, como o céu se estendia e penetrava na água como se fossem um na rebentação.

O nosso lar era esse pequeno espaço, essa pequena cúpula de dois em um que se uniam e se misturavam, como uma corte de luz e sombras.

Eu sorri novamente pra mim mesmo com a minha sorte.

A Corte de Luz e Sombras (FINALIZADA)Onde histórias criam vida. Descubra agora