2: Um Vale de Esperança

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Final de Março de 2019...


Bella

     Ele calçou as sapatilhas em meus pés com delicadeza, as mãos sempre muito gentis, incapaz de ser indelicado com a mais frágil flor a mais ásperas das rochas, beijou meus joelhos com ternura e afagou a protuberância esférica, ainda pequena, que era minha barriga de quase três meses... ainda não dava para notar mas Adam a beijou demoradamente com carinho, depois se sentou a meu lado na cama e tomou a escova de minha mão e começou a escovar meu cabelo.
-Sabe que sou perfeitamente capaz de fazer isso sozinha... não sou inválida. Falei enquanto ele deslizava delicadamente a escova nas mechas, queria ter visto uma nota de humor em minhas palavras mas aquele não era um dia muito feliz...
     Olhando o dia infeliz inundar o quarto com sombras de desesperança através das janelas altas ele ainda parecia, não mais feliz do que eu em vista da tragédia, sua alegria era suave, dosada, na medida em que houvesse algo a mais para sorrir como ele insistia... eu e o bebê estávamos bem e ele se sentia grato por isso. E eu também estava feliz mas não era suficiente para aplacar... diminuir a magnitude do que eu sentia.
-Mas essa é a melhor parte de meu dia... cuidar de vocês. Sussurrou ele tocando a lateral de meu rosto com as costas dos dedos reconfortando-me e voltando ao trabalho...
     Eu revirei os olhos em meu humor sombrio... vendo-o ali, tão cuidadoso e protetor ainda que fosse mais humano do que ele sonhava era um imortal, transbordando juventude, congelado no tempo, vendo-o ao meu lado me fez pensar na fragilidade e brevidade da vida e no temido vazio de seu fim, a morte, não havia como lidar com nenhuma das duas, com o sofrimento que estavam sujeitas... só as pequenas e grandes coisas é que faziam dessa brincadeira de viver ter sentido... como o amor e as pessoas amadas, isso era significação, importância.
Em meio as grandes intempéries saber que não está sozinho é como um bote salva-vidas, uma salvação.
     Com Adam a meu lado eu tinha segurança para sorrir em meio a tristeza, ele era um vale de esperança, um oásis em meio a desolação do deserto, pensar nele e em tudo que vivemos me trazia tanta comoção, a gravidez era como pólvora no fogo de minhas emoções à flor da pele, eu chorava por tudo, tanto que ele nem se incomodava mais em ficar assustado ou preocupado, só me abraçava, isso me fez lembrar de como foi quando contei a ele que seria pai, o que me fazia chorar baldes até hoje.

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