Allan Schneider
Rapidamente, eu virei e entrei no aposento do capitão a meu lado, fechei a porta de ferro e me escondi atrás no canto olhando o visor circular no alto, bem no meio da porta, tinha alguma coisa lá fora como pude ver pela escotilha no teto, a chuva tinha parado e as nuvens negras do céu abriam caminho para uma lua cheia tão pálida quanto osso como se eu já não estivesse tão apavorado vi através daquela abertura na porta o monstro que Rose me avisara enquanto a luz pálida tornava aquela figura mais grotesca e perturbadora como se os pesadelos precisassem da escuridão para existir...
A criatura, um espécime que já ouvira tanto falar nas histórias fictícias finalmente entendendo o que ela dissera não era somente um animal era algo mais... pude perceber isso vendo as roupas rasgadas em seu corpo descomunal... um ser híbrido entre homem e fera, olhando ao redor como se procurasse por algo farejando o ar, eu vi os olhos brancos era pior do que fitar os olhos acinzentados de outra criatura tão sombria quanto, era nos olhos que se encontrava o espírito, a alma que nos prende a carne e que ainda sim nos torna mais próximos do criador, do divino como explicara um clérigo a mim certa vez, era a alma que nos dava direito de escolha, que nos tornava humanos a semelhança do bem mas aquela criatura era como se não houvesse nada ali... absolutamente nada... estava vazio como uma concha... podia se ouvir os ecos da vida que um dia existira ali e mais nada...
Algo chamava sua atenção, talvez por isso ele estivesse parado ali farejando o ar, talvez soubesse que eu estava ali e isso não me trouxe segurança alguma, ele estava perto da porta, o vidro embaçado por sua respiração me dizia que estava, os olhos apagados... ele lambeu o vidro quando ambos ouvimos os ecos de alguém procurando por mim e Martin, essa não!
A besta se voltou para o corredor e seguiu pelo caminho que eu tinha entrado, para o convés... onde todos aqueles pobres inocentes seriam dizimados, massacrados como em a noite do pesadelo, eu me perguntei onde Rose estava, a guardiã da criatura, se o monstro tivesse voltado contra seu criador... ela precisava de ajuda. Procurei qualquer coisa que pudesse iluminar o caminho e encontrei uma lanterna então saí para fora e corri para a escuridão rumo ao porão... Martin, ou que restara dele, tinha sido espalhado ao longo do caminho mas eu não parei para olhar, desci as escadas e encontrei uma porta vermelha com uma inscrição dizendo "cargas" entreaberta... empurrei a porta e a vi caída ali no chão, a trouxe para meus braços dando tapinhas em seu rosto de pêssego.
-Por favor acorde. Pedi, se ela era a única que sabia controla-lo de alguma forma, ela podia impedir a desgraça... se não fosse tarde demais, eu toquei seus lábios sem cor com desespero, vendo-a ali em meus braços... recordando de um momento como aquele a quatro décadas quando tinha perdido meu primeiro amor... exatamente daquela forma em meus braços.
-Por favor... você não pode ir assim, não como um dia a deixei e parti sem dizer adeus, não sabe como lamento por ter ido embora... me perdoe. Falei trazendo seus lábios para os meus brevemente e a abraçando enquanto ouvia o pânico lá em cima.
-Ainda continua achando que sou nova demais para você?. Perguntou ela em um sussurro... eu a afastei de mim para ver seus olhos brilhando, eram tão lindos e apavorantes.
-Sua despedida foi mesmo lamentável e não estou dizendo isso para que haja uma próxima porque não quero que se repita.
-Eu não posso viver para sempre... um dia terei que dizer adeus.
-E talvez eu desanime quando você for embora definitivamente... mas não prometo nada. Disse ela me abraçando outra vez mas aquele momento não poderia ser prolongado por mais tempo...
-Eu não queria interrompe-la mas... seu convidado. Disse, ela se afastou de uma única só vez e se colocou de pé, olhou para mim seriamente.
-Você fica aqui.
-Não... eu não vou me esconder aqui como um covarde. Falei decididamente, eu não podia deixá-la ir sozinha e ficar ali sentado esperando que ela voltasse com vida... mesmo que ela pudesse impedir que as coisas saíssem do controle, ainda não sabia se conseguia acreditar que ela poderia ser... que ela era...
-Não é covardia temer pela própria vida. Disse ela, eu peguei sua mão decidido... ela suspirou.
-Não cometa idiotices então e fique atrás de mim. Disse ela, eu assenti e segurei a porta para ela.
-Primeiro as damas. Falei, ela sorriu tocando meu queixo.
-Bom garoto. Disse ela passando por mim, segurando o vestido longo para subir as escadas banhadas de sangue.
-Mas o que aconteceu? Você estava desacordada quando a encontrei, ele atacou você?. Perguntei, ela parou para refletir e continuou.
-Não sei bem o que aconteceu... acredite ele não é agressivo, mas alguma coisa está errada, tem alguma coisa muito errada aqui. Disse ela com aflição, eu pensei com pesar no desaparecimento misterioso de Bobby olhando a tragédia de destroços humanos do pobre Martin... ele era tão jovem ainda!
-Bobby, um dos funcionários de Black desapareceu a alguns dias... talvez seu convidado tenha...
-Black também me perguntou a mesma coisa mas posso garantir que ele não saiu do porão nem uma vez desde que embarcamos... ele está com medo... apavorado, nem imagina como isso é difícil no começo mas não foi ele. Disse ela, eu pensei nisso, se não fora o obscuro morador do porão... o que aconteceu com o enfermeiro Bobby afinal? Uma pessoa não desaparecia assim sem deixar pistas ainda mais dentro de um navio.
-Nem posso dizer o quanto estou magoada comigo mesma por isso... ele não vai me perdoar se souber. Disse ela olhando os membros espalhados com desgosto quando paramos... encontrando alguém no corredor, as luzes tinham firmado e clareavam o ambiente o suficiente para que se pudesse ver a silhueta de alguém, eu parei observando com receio a figura se aproximar, muitas das lâmpadas não estavam funcionando do outro lado do corredor, eu temi que fosse a criatura outra vez e quando enfim vimos quem era...
-Martin... como você?. Perguntei quando pude ver seu rosto próximo a nós, seu olhar era perturbado e ele carregava uma espécie de espeto de ferro na mão com a ponta afiada... eu toquei seu rosto frio, o garoto tremia.
-Eu me escondi no depósito... vocês viram aquilo?. Perguntou ele assustado, eu assenti.
-Espere. Disse ela, olhei para trás.
-O que foi?
-Esse sangue... tem um cheiro estranho. Disse ela passando um dedo no chão e o levando até o nariz.
-Não é humano... droga. Disse ela olhando alguma coisa se mexer a frente, as luzes ficavam mais firmes a cada instante, ainda estavam fracas e eu mal pude distinguir o que se mexia naquele canto, que se arrastava quando cheguei mais perto, era um membro, a parte de um braço arrastando-se no chão... procurando outras partes suas para si unirem outra vez e reconstruir o corpo dilacerado... outros menbros também se mexiam por ali convergindo para as outras... eu olhei para ela.
-Meu Deus. Ouvi Martin dizer, Rose estava procurando por algo no chão quando parou a frente do tronco do cadáver... pegou das mãos de Martin a barra de ferro fina e pontiaguda usada para mexer a lenha na lareira... eu vi o peito do morto subindo e descendo quando ela sem hesitar desceu a ponta afiada no peito dele, acertando seu coração... o tórax se recontorceu com a estocada e parou de se movimentar como as outras partes do corpo.
-Ele não vai conseguir se juntar... mas como ele veio parar aqui? E como não consegui perceber isso?. Perguntou ela a si mesma meio com raiva, frustrada.
Desde pequeno sempre tive crença que coisas assim existiam, como em Deus ou no Diabo, eu acreditava que existiam obscuridades incompreendidas e inexploradas no mundo, e isso era fascinante para mim, desde o começo minha paixão por ficção me fizera questionar se estávamos realmente sozinhos nesse mundo ou no universo inteiro, descobrir que um mundo a parte daquele que conhecia existia tinha sido meu proposito de vida... tanto que podia se chamar de obsessão, amor e ódio.
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A Presença
RandomLivro II Bella encontrou seu verdadeiro amor, a metade que lhe faltava e que sem ela sua vida seria uma desilusão emoldurada pela tristeza, com a nova chance de viver a paixão que foi antes interrompida pela morte da moça, onde puderam recomeçar de...