75: Nas Sombras

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Enfrentando uma loura raivosa... mas o que foi que eu fiz?
Matthew Stanley







-Matt?... Matt acorda cara. Chamou alguém distante de mim, eu me virei, alguém sacudia meu braço com um copo de café fumegante na mão apenas por um segundo não reconheci aquele monstro em meu quarto até o dia de ontem e a lembrança incômoda de como seu cheiro era ruim me invadiu por completo, era o Zé Colméia, Laurence... cara, Ai que merda não foi um sonho, a aceitação caiu sobre mim como um balde de água fria... eu estava deitado em uma cama pequena demais para mim, meus pés estavam no chão... olhei o quarto minúsculo desorientado, não era meu quarto... droga, o que foi que aconteceu mesmo? Não consigo me lembrar... eu nunca consigo me lembrar do que acontecia durante a noite.
-Acorda Bela adormecida já dormiu demais... estamos atrasados uma hora, eu fui um cara legal e deixei você dormir mais um pouco agora levanta é sério. Disse ele, eu me sentei na cama dando um bocejo animal.
-Que bafo dos infernos cara! Vira essa boca pra lá. Disse Laurence, eu me levantei tonto e meio molenga como um zumbi, parecia que eu tinha levado uma surra.
-Cadê o banheiro? Onde é que eu estou? Como eu vim parar aqui. Que horas são?. Perguntei virando para a janela, respirei fundo... era dia graças a Deus!
-Está atrás de você, está na minha... bom agora nossa casa, eu carreguei você e são seis da manhã. Disse ele enquanto eu pegava uma toalha em cima do que parecia ser uma cômoda e entrei em um banheiro... olhei minha cara no espelho, depois olhei para baixo... a camisa e a calça que eu estava ontem já era, onde foram parar minhas roupas?... eu pulei para o lado enquanto Laurence ria, escondendo atrás da parede.
-O que houve com as minhas roupas?. Perguntei com o corpo escondido atrás da parede do banheiro, eu estava nu meu Deus como isso foi acontecer?!
-Você mesmo tirou... com a transformação viraram retalhos.
-Nenhuma garota me viu assim não é?. Perguntei, Laurence sorriu com malícia.
-Você se acostuma com a nudez... Ah e não queria te deixar chateado logo cedo mais você deve saber que tem um espelho atrás de você. Disse ele, eu virei para o lado olhei meu reflexo e puxei a porta.
-Não demore... temos muitas coisas para fazer antes da aula e eu vejo você em dez minutos.
-Você não é minha mãe.
-Mas eu posso ser pior do que ela... apresse-se. Disse Laurence, eu tomei o banho mais rápido do mundo e lavei o cabelo com xampu por que parecia que eu tinha rolado na área... que coisa estranha não se lembrar de nada... depois que eu me vesti, uma calça e uma blusa encontradas no armário calcei um par de botas de trilha que estava ao pé da cama e desci às escadas daquela casinha... Laurence me esperava na mesa posta para o café, comecei a comer tudo que tinha pela frente.
-Oh que romântico você fez um café para nós dois.
-Não deveria falar de romance comigo no café da manhã depois de eu tê-lo visto nu... eu vou ter uma indigestão. Disse ele, eu ri.
-Como foi que eu fui parar na cama?. Perguntei desnorteado, ele bebia café enquanto lia algum livro que não consegui ver a capa.
-Eu carreguei você... sou sua babá lembra?
-Ah que ótimo. Murmurei com desdém de boca cheia... caramba, eu estou com tanta fome que poderia roer até o pé da mesa, eu me levantei e peguei uma caneca no armário e enchi de água na torneira, entornei o copo na boca e me sentei para continuar comendo... Laurence fechou o livro me olhando comer e começou a falar olhando a janela.
-Algumas das regalias que temos aqui são água encanada potável de uma fonte mineral próxima, sistema de esgoto, temos energia elétrica com o auxílio de um gerador, mas Internet e celulares não pegam por aqui, não tem sinal... os engenheiros instalaram uma torre aqui uma vez mas o sinal não pega... a Ilha fica dentro de um portal, o portal de outra dimensão, o sinal é bloqueado porque não estamos mais do Lado de Fora, no mundo real... e o diretor achou que fosse melhor não manter contato com o Lado de Fora enquanto estamos por aqui, receber notícias boas ou ruins deixa o pessoal meio agitado... tirando isso vivemos bem.
-Então estamos no escuro. Falei, sem internet... que maravilha, minha vida acabou.
-Vamos. Disse Laurence ficando de pé, eu peguei mais um pãozinho e empurrei para dentro com café e leite, saímos para fora, a rua principal estava tranquila parecia que não havia mais ninguém além de nós na Ilha.
-Está cedo demais, não acha?
-Para quem costuma acordar depois que a mamãe faz o almoço... sim. Zombou ele, eu suspirei recapitulando o que ele tinha falado a pouco, eu estou preso e totalmente incomunicável no meio do nada... que ótimo, bom ja que eu estava morto mesmo, para quem ligaria se fosse possível? Para a mamãe? Ela teria um troço se eu fizesse isso, até pensaria que estava recebendo alguma espécie de mensagem do além... pensando bem era melhor assim, mas se algum dia eu ligasse só queria ouvir sua voz de novo, sua voz amável que sempre fazia com que eu me sentisse melhor... e eu nunca mais poderei ouvi-la... com que cara eu diria a ela que ainda estava vivo? Ela jamais me perdoaria pelo que eu fiz.
        Respirei fundo inalando o ar da manhã com tristeza, tudo se mexia, tudo se ouvia... era um som tranquilizador, esse da Ilha... até as coisas mais insignificantes como formigas trabalhando em um mutirão isso me distraía do que sou do que fiz com a mamãe mas também era uma prova contundente de que eu não era mais normal, humano.
-O que aconteceu ontem? O que eu fiz?
-Tenho a impressão de que você vai descobrir isso agora. Disse ele, eu abri os olhos sem entender e comecei a olhar a meu redor procurando por rastros de destruição... não tinha nada.
-Não estou vendo nada.
-Você não destruiu nada mas foi um calo no pé dela. Disse laurence olhando para frente, ele olhava a garota loura, Samantha, eu suspirei quando a vi, feliz em vê-la... ela vestia um casaco amarelo ridículo e estava com as mãos na cintura batendo um dos pés no chão... ela era encantadora mesmo com raiva, porque ela estava com raiva? Ah droga! Eu fiz merda não fiz?
-Agora ela te ama. Disse Laurence, eu engoli em seco olhando o rosto de Samantha.
-O que foi que eu fiz?
-Você ficou atrás dela a noite toda como um cachorro babão, perdeu toda a dignidade, sério... quando ela corria para um lado você ia junto, eu acho que eu tive a impressão que seu rabo estava abanando. Sussurrou ele, eu engoli em seco de novo ficando lívido... humilhante, não poderia ficar pior do que isso, Ah não espere... era só olhar para ela que poderia sim ficar bem pior, parecia que ela queria pular em cima de mim... um péssimo começo Matt, parabéns.
-Foi tão ruim assim?.
-Ela está preparada para dar a resposta ela mesma.
-Porque está cochichando se ela está ouvido?. Perguntei incrédulo, ele deu de ombros e eu tentei ensaiar um sorriso mas não deu muito certo, eu devia estar em pânico... eu parei a sua frente, ainda a certa distância, tive a forte impressão de que ela pularia no meu pescoço e recuei um pouco mais erguendo as duas mãos procurando palavras para explicar... a cara dela não era muito boa... se eu ao menos me lembra-se.
-Oi eu...
-Escuta bem o que eu vou dizer garoto, vê se grava no seu subconsciente para não ter erro tá legal?... da próxima vez que me perseguir daquela forma de novo eu vou machucar você de um jeito que quando procurar seu nariz na frente do espelho não vai encontra-lo mais porque ele vai parar do outro lado da sua cabeça... e se me encontrar durante o dia mude de direção! E da próxima vez que você me deixar plantada esperando para fazer uma coisa que somos obrigados a fazer juntos eu posso fazer pior do que só esmagar seu nariz idiota! Você me fez perder duas horas da minha vida hoje! Tudo porque o príncipe quis dormir mais um pouquinho, esse lugar não é a casa da sua mãe onde você faz o que quer! Filhinho da mamãe! Se não percebeu isso ainda trate de perceber logo porque da próxima...
-Sei, sei porque da próxima vez você vai me dar um hiper soco que eu vou ter que criar guelras para poder respirar. Disse, ela me encarava como se fosse explodir, o dedo apontado para mim... ela tremia de raiva, fascinante.
-Ótimo já que entendeu... tem mais uma coisa não me dirija mais a palavra. Disse ela seriamente, ela rosnava ao enfatizar cada palavra, eu apenas balancei a cabeça sorrindo... eu tive que admitir ela mexia comigo em um nível jamais visto... e onde está o bobalhão do Ted? Porque não está com ela?
-Seja mais compreensível Samantha... é o primeiro dia dele.
-Não se meta Laurence. Disse ela voltando ao trabalho rebolando, balançando os quadris de irritação, era hipnótico.
-Tem uma explicação científica para o porque que eu fiquei atrás dela a noite toda?. Perguntei procurando por uma explicação enquanto a via trabalhar junto a um grupo de pessoas que me olhava mas ninguém ria... eu teria morrido de rir de mim mesmo, eu queria rir.
-Geralmente coisas que vimos durante o período de consciência influenciam o subconsciente... ficou pensando nela ontem o dia todo?
-O que Ted acha disso?. Perguntei sentindo uma expectativa aflitiva ao pensar em Ted, eu queria mesmo socar a cara dele... pela garota? Me indaguei, sim, é provável que sim, meu sangue fervia só de pensar na maneira bruta e grosseria com que ele a tratou.
-Vocês dois brigaram por causa disso ontem.
-E quem venceu?
-Você é forte mas Ted é esperto... deu empate. Disse Laurence seguindo para os fundos do estábulo, eu o segui.
-E a propósito cadê ele?. Perguntei, ele me olhou por um curto segundo antes de responder.
-Por aí em algum lugar com seus amiguinhos.
-E porque ele não está com Samantha?
-É uma boa pergunta... agora, esqueça a garota Matt... ok?. Perguntou ele de saco cheio, eu suspirei olhando a minha volta... cadê você Ted?
-Eu fiquei a noite toda naquela forma? Como lobisomem?
-Tivemos que dar um tranquilizante a você. Respondeu ele, eu pisquei olhando Laurence pegar quatro baldes grandes, ele entregou dois a mim e seguiu até um poço... minha curiosidade sobre minha nova vida mais forte e estranha aumentava conforme minha fixação por Samantha me distraía de vez em quando... a via passar a minha frente fingindo que eu não existia.
-Vocês ficam nessa forma a noite toda? Como não ficam cansados?. Perguntei, enchemos os baldes de água para reabastecer o bebedouro dos animais.
-Não ficamos cansados na forma de lobisomem, podemos passar dias, semanas, até meses sem comer, sem dormir e não sentir falta de nada contanto que você se transforme não precisa de nada disso a menos que queira, o corpo humano tem essas necessidades comida, sono, são para os humanos mas os monstros não dormem, não comem... você só não se deu conta disso ainda porque pensa e age como um humano... você prefere ficar na cama por doze horas? Ou não ficar cansado por doze horas e ter energia o suficiente para fazer o que quiser?. Perguntou ele retoricamente.
-Droga perdi toda a diversão. Zombei tirando o excremento do meu amigo porco enquanto ele rolava na lama, Laurence não parecia cansado mas mesmo assim fez uma pausa e se encostou ao lado do cercado acimentado dos porcos.
-Vocês dois não parecem tão diferentes, não é? Ontem eu pensei que você estivesse com sarna. Disse ele, eu ergui a cabeça para olha-lo... tá explicado o motivo de eu achar que talvez tenha sido enterrado na areia hoje de manhã.
-Então era por isso que eu estava com areia no cabelo todo... somos iguais a cachorros é?
-Não, só estava tirando onda com a sua cara mesmo.
-Hilário... então alguém enterrou minha cabeça na areia?. Perguntei pensando em Ted "ursinho de pelúcia"... se foi ele então ótimo adoraria descontar isso depois.
-Samantha fez isso com o maior prazer para o diretor aplicar o tranquilizante em você.
-Ela enfiou minha cabeça na areia?. Parei o serviço erguendo a cabeça para vê-la ir embora, sem um único olhar para trás andando apressada de volta ao vilarejo.
-Ficou contente? Oh como amor é lindo... vamos garoto hora de estudar, flor do campo. Disse Laurence, eu o encarei e suspirei, feliz por largar aquela merda toda e o porco também ficou feliz... caí dentro amiguinho, mas aí Samantha olhou de repente por sobre o ombro, olhou direto para mim, os olhos estreitos.
-Quer saber acho que prefiro ficar com os porcos mesmo.
-É vocês tem o mesmo cheiro... vai precisar de outro banho. Avisou Laurence, eu franzi o nariz e enrijeci quando ele passou por mim.
-Acho que você também florzinha. Disse, ele riu alto e eu sorri levemente e com um suspiro voltei a me concentrar nos meus problemas... qual era a real relação entre Ted e Samantha? Além do mentor cruel e possessivo e a interna perigosamente bonita e furiosa comigo, eles eram mais do que mentor e interna? Acho que não, Samantha parecia querer fugir dele... mas e Ted qual era a daquele cara? E o mais importante o que iria ser da minha vida ali naquele lugar?

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