19: Diário de bordo

11 2 0
                                    

  
Allan Schneider

    Martin me levou as acomodações dos funcionários e me mostrou a cama que ficaria pelas próximas indefinidas semanas, eu me sentei na beirada pensando... não poderia existir duas pessoas iguais a menos que fossem gêmeas, mas mesmo assim, depois de tantos anos... era mais que natural que ela tivesse envelhecido, esse era o destino de todos e tudo fora disso era antinatural, sobrenatural... iria contra os princípios da vida e da natureza.
    Começo, meio e fim... nascer, viver, envelhecer e morrer, essa era a lei natural de todas as coisas, mas ao que parecia não a afetava. Naqueles primeiros segundos tentei reviver o passado, buscando alguma coisa, qualquer coisa que explicasse aquele momento... mas não havia nada lá, a não ser que ela fosse... não eu não me permitiria aquele pensamento... era quente... teria percebido se ela fosse uma coisa diferente.
-Escuta... você é fotógrafo ou alguma coisa assim?. Perguntou o garoto, eu me dei conta de que ele ainda estava ali comigo e sacudi a cabeça para espantar de vez o choque.
-Não profissionalmente é mais um hobby. Falei colocando minha bagagem debaixo da cama e pegando meu equipamento tentando parar de pensar no assunto mas eu me conhecia bem, sabia que quando uma coisa me chamava atenção era impossível me desviar.
-Ouça Martin aquela senhorita... quem ela é?. Perguntei, ele me olhou com inocência e não com desconfiança como certamente alguém um pouco mais velho e mais experiente pensaria.
-Ninguém sabe, está conosco... bom não exatamente, ela passa mais tempo com o capitão e o morador do porão, mas ela está aqui a uma semana, viajando com a gente. Disse ele enquanto limpava a lente da câmera.
-Morador do porão?. Perguntei parando com o pano.
-Vai descobrir hoje noite. Disse ele olhando a câmera em minhas mãos.
-Sabe usar?. Perguntei, seus ombros arriaram.
-Nunca peguei em uma dessas. Disse ele, os olhos brilhando com desejo, eu ri e lhe passei a câmera.
-Não deveria estar na escola garoto?. Perguntei, ele olhava admirando o artefato tecnológico ultra-avançado em suas mãos tal como um homem na idade da pedra descobre o fogo
-Talvez. Disse ele dando de ombros.
-O que seus pais diriam disso?
-Se eles estivessem vivos diriam... Martin você está atrasado para a aula. Disse ele, eu parei outra vez.
-Sinto muito.
-Não esquenta já superei... desde que fugi do orfanato e o capitão Black me trouxe para cá, como funciona?. Perguntou ele, eu assenti e liguei a câmera para ele... os orfanatos por aquelas bandas do mundo não todos mas a maioria não deveria ser o melhor lugar do mundo para se estar, não me surpreendia que ele tivesse fugido.
     Mais tarde no almoço fomos até a cozinha, Martin me contara enquanto seguiamos caminho como tinha sido sua vida até ali... desde a morte dos pais, assassinados por uma gangue de saqueadores que invadiram as casas do viralejo que morava com a família, os tempos de fome e de pobreza nas ruas, a captura por agentes do governo que recolheram dezenas de outros jovens como ele para os abrigos, as agressões a que sofria lá até o dia que decidira fugir e voltar as ruas onde o capitão Black o salvou de ter a mão amputada por roubar um pão... a realidade não era para qualquer um, poucos como Martin tinham força para suportar seus desafios.

A Presença Onde histórias criam vida. Descubra agora