53: Nas Sombras

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        Agonia em auto mar, quebra ossos.
        Matthew Stanley

        






           Eu sentia muito frio lá ou melhor aqui onde estou na escuridão, o pior frio que já senti na vida, não era só o medo, eu estava congelando em meu próprio inverno em uma sala fria e escura de paredes de metal... como se estivesse no fim do mundo, nas temperaturas mais baixas do planeta, congelando vivo no gelo mas às vezes era tão estranho era como se eu estivesse pegando fogo e não ao contrário com todo aquele frio que parecia queimar, me perguntei se era assim que acontecia com aqueles malucos radicais em busca de uma aventura congelante escalando montanhas frias como o Everest, se era assim que acontecia quando o frio era demais a mente criasse a ilusão do fogo escaldante fazendo-os tirarem as próprias roupas e se atirarem do pico acho que eu vi isso uma vez em um filme mas para mim não era a mesma coisa nunca chega o fim, onde espero que não sentisse mais nada após a morte, eu não estou morrendo e esse o problema, continuo congelando mais vivo do que nunca estive, não há dor mas é como se milhares de agulhas fossem cravadas em minha pele, era a mesma dormência mas mil vezes pior, às vezes quase não consigo sentir meu próprio corpo como se a massa que me envolve tivesse virado gelatina, deve ser o frio...
          A febre que causa isso como a voz me disse para me acalmar, eu não estou morrendo mas parece ser pior do que a própria morte... meu inferno é frio mas certamente não é "o" pior era do que a dor, ah sim a dor insuportável de ranger os dentes, de querer fazer qualquer para poder parar, até mesmo rasgar a própria carne com as unhas se isso me fizesse sentir melhor, se fizesse parar... mas a voz não me deixava fazer isso, ela me prendia e eu me contorcia com a dor... como se algo acontecesse dentro de mim em meu corpo.
        Abrindo... partindo... estalando... lenta e dolorosamente, eu me contorcia e depois começava tudo de novo, a dor era indescritível. Abrindo... partindo e estalando enquanto me contorcia com ela... meus ossos, eu sabia que eram meus ossos porque nada podia doer mais do que uma fratura no osso, eu já quebrei o braço uma vez, em dois lugares, foi a dor mais angustiante e intensa que já senti na minha vida, mas aquilo ali era mil vezes pior, pior do que o frio, sentir quebrar várias e várias vezes... era como ser atropelando por um caminhão mas estando consciente em todo o processo de dor, várias e várias vezes, a dor se prolongava por longos períodos e quando parecia ficar suportável meu corpo dolorido latejava com os espasmos, não pude ignorar o pensamento de que meu corpo estivesse se preparando para alguma coisa se eu não estava morrendo o que estava acontecendo?... minha capacidade de raciocinar tinha sido prejudicada, em momentos como esse eu só conseguia ver e sentir dor, a dor latejante prosseguia eu estava quebrando... abrindo, partindo, estalando...
        Eu não estou morto queria estar mais não estou, eu sei disso porque sei que não estou completamente só, havia alguém lá comigo, ela a voz sempre está lá quando acordo, ela me dizia que era a febre que dava aquela sensação de que eu estava a beira de ser o mais parecido o possível com um cubo de gelo gigante, um iceberg, era loucura minha aquele frio insano, meu corpo está pegando fogo mas minha mente encarava aquilo como um frio devastador, era confuso mas ela disse que me contaria mais quando eu estivesse realmente acordado, ela dizia que não demoraria muito para que tudo terminasse mas eu não morreria quando acabasse, ela nunca me diz o que está acontecendo de verdade porque eu estou doente daquela forma, era algo que ela procurava evitar falar em meus breves vislumbres de consciência quando eu podia pensar. Ela me contara que minha vida jamais seria como antes, há algo em mim que mudaria tudo, e eu acreditei nela, me sinto estranho, não sou mais eu mesmo, eu me perdi no caminho, eu acredito na voz... naquela estranha, porque alguma coisa aqui, dentro de mim, diz que a voz está certa...
        De algum modo, naquele último instante a não sei quanto tempo atrás, eu soube que o destino pior não seria a morte, porque eu não estou morto, não houve um suicídio, eu não me matei porque faria isso se eu estava feliz com minha vida? Não havia porque... mas eu quase morri, fui atacado por algo que eu não sei o que era, não tinha um nome para aquilo, nunca tinha visto algo assim antes, me parecia um animal... mas com aqueles olhos opacos, terríveis, duas esferas cor de gelo naquela careta estranha de dentes espalhados na boca arreganhada, eu sonhei como isso alguma vezes e aquela coisa ainda me perseguia nas sombras, correndo quando corro, parando quando paro de correr... eu não morri, mas então o que aconteceu afinal?

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