Nem sempre a minha vida foi assim, sabe? Ela já foi ruim, já foi péssima, mas o César me tirou de casa, me tratou como uma rainha e me fez acreditar que tudo seria uma maravilha, até o dia que eu morresse, mas não foi bem isso o que aconteceu.
Vou começar a contar do início, de quando eu tinha 14 pra 15 anos e descobri o câncer da minha mãe.
Minha mãe e eu sempre fomos uma pela outra, ela sempre trabalhou pra me dar o melhor, eu sempre estudei e desde os 13 anos, eu tomava conta da filha de uma amiga dela. Todo o dinheiro que eu ganhava, que não era muito, eu dava na mão da minha mãe pra inteirar na luz ou no mercado. Sério, eu me sentia a pessoa mais feliz do mundo em poder ajudá-la.
O meu único problema com a minha mãe sempre foi o meu padrasto, ele bebia muito, não queria nada com a vida e ficava o dia inteiro em casa, coçando, sem lavar nem o copo dele.
Eu tinha pavor dele, desde os meus 10 anos, quando ele foi morar com a minha mãe e tocou no meu corpo pela primeira vez. Na época, cheguei a ficar doente por não saber como dizer aquilo pra minha mãe, até porque ele me ameaçou e, na minha cabeça, ela nunca acreditaria em mim.
Meu inferno começou aí. Eu passava mais tempo na casa das minhas amiguinhas do que em casa, até porque esse era o único jeito de fugir das coisas que ele fazia comigo, principalmente quando estava bêbado.
Passei por muitas situações horríveis na mão dele. Eu sempre era ameaçada com uma faca ou algum objeto cortante, ele dizia que ia matar minha mãe enquanto ela dormia, e o meu maior medo sempre foi esse.
A melhor fase foi quando eles se separaram, mas não durou muito, em menos de 1 ano, ele já estava na minha casa de novo e parecia estar pior. Eu não tinha paz, eu não podia entrar no banheiro, não podia ir pro quarto, não podia fazer absolutamente nada.
Até que, com os meus 14 anos, eu conheci o César. Na época, eu não era de baile, ia uma vez ou outra com a Roberta, mas sempre ficava de cantinho, morria de medo de apanhar na rua. Sempre fui muito cagona.
Era um baile normal, só com equipe, quando ele passou por mim na ronda. Ficamos nos encarando por um tempo, ele sorriu e eu correspondi, no automático. Pronto, perdi tudo.
Depois disso, eu batia de frente com ele em todos os lugares que eu ia na favela. Quando ia levar a bebê que eu tomava conta na pracinha, lá estava ele. Passava na quadra, indo pra casa da Roberta e lá estava ele. Sempre sorrindo pra mim e eu correspondendo, até o dia que ele me cercou na curva do meu beco.