🏠 Conflitos de casa

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Depois de um dia exaustivo de trabalho e enfrentar o transporte público lotado, chego em minha residência. Moro com meus pais e minha irmã Vera, a grande passista da escola de samba do bairro. Tenho um irmão mais velho chamado Douglas, eles são os diamantes da minha mãe Dona Márcia. Eles são tudo para ela. Eu sou apenas a filha do meio.

Giro a chave na fechadura, anunciando minha chegada. O aroma de comida toma conta da casa, misturando-se ao cansaço que me acompanha como um fardo inabalável. Mais um dia na guerra contra o tempo, entre as travessuras dos pequenos e a impaciência dos pais. Deixo a mochila e bolsa no degrau da escada.

Com passos lentos, arrasto-me até a cozinha. Lá encontro mamãe, envolta em seu roupão florido, mexendo as panelas com um sorriso cansado. Seus olhos, antes brilhantes e cheios de vida, agora carregam o peso da fibromialgia, uma dor constante que a aprisiona em seu próprio corpo.

- Filha, que bom que você chegou! A janta está quase pronta. Senta-se, você deve estar exausta, diz ela, com a voz rouca pela dor.

Sento-me à mesa, observando o vapor que sobe do fogão. A fome se mistura com à exaustão, criando um nó em meu estômago. Fecho os olhos por alguns instantes, tentando recuperar as energias perdidas no dia.

- Roberta, você precisa se cuidar mais, a voz de mamãe me tira do torpor. Está cada vez mais gorda, assim não vai encontrar um bom homem.

💭 Vai começar a ladainha sobre beleza e homem.

Suas palavras são como flechas em meu coração. Já ouvi isso tantas vezes que quase me acostumei. A comparação com minha irmã,Vera, a beldade da família, sempre me acompanha como uma sombra.

- Mas mamãe, estou cansada, respondo, com a voz fraca. Trabalho o dia todo, cuido da casa, encontro um tempo para mim? Retruco.

Tempo para fofocar no celular, você tem né, Roberta! Para de ficar lamentando, aproveita e vai para academia com sua irmã, você precisa emagrecer, se cuidar e ficar bonita como ela. Só assim você será feliz.

💭 Ela se cuida, porque não cuida de nada em casa.

Lágrimas brotam em meus olhos, ameaçando transbordar. A doença dela, a pressão do trabalho, a comparação constante com minha irmã... tudo parece se acumular em um único momento, sufocando-me. Levanto-me da mesa, incapaz de suportar mais.

- Eu já disse, mamãe, não sou a Vera. Sou Roberta. E estou feliz do meu jeito.

- Depois limpa a cozinha. Seu irmão vai passar aqui, então teremos mais louça. Minhas mãos estão doendo demais.

- Sim, senhora! Vou tomar um banho.

Subo as escadas, refugiando-me no meu quarto. Fecho a porta e me jogo na cama, deixando as lágrimas rolarem livremente.

Naquele momento, me sinto sozinha. Sozinha com meu corpo, com meus sonhos, com minhas dores. Mas, no fundo, sei que não estou sozinha. Tenho as palavras da minha recém falecida avó Dona Soso:

"Você é muito especial! Lembre que Cristo deu a vida por ti, Betinha!"

Minha avó foi a única pessoa que me admirava e incentivava. Meu pai, senhor Alcides, tem um pequeno sacolão na frente de casa, depois de trabalhar muitos anos na feira. Ele pagou a faculdade do Douglas para ciências contábeis e da Vera para design de interiores, mas tive que contar com meus próprios esforços para custear minha faculdade de pedagogia, com meu salário minúsculo de início de carreira. Depois de tomar banho, retorno à cozinha para jantar. Encontro Douglas e Vera jantando juntamente com meus pais.

- Boa noite. Secamente digo. Pego meu prato, me sirvo.

- Boa noite, Betinha. Como foi no trabalho hoje. Meu pai pergunta.

- Foi bem, tudo dentro do normal. Me sento.

Meu irmão se casou, mas todos os dias passa aqui em casa para ver nossos pais, mas ele não percebe que munição para minha mãe falar de Luana. Quando estamos terminando, Vera me solta.

- Betinha, sabe aquelas compras que fez no seu cartão, não vou conseguir te dar o dinheiro. Este mês não sobrou nada do meu salário. Você pode cobrir para mim, mana? Respondo jogando o talher no prato.

- Você está brincando, Vera! Tu sempre faz isso, compra e me ferra não pagando o que comprou. Minha mãe grita.

- Não fala assim com sua irmã mais nova, você deveria ter aguardado o valor para cobrir.

- Qual é, mãe! Ela pediu o cartão emprestado para comprar roupa, é tenho que guardar o dinheiro, acaso não pague? Não sou mãe dela, isso é injusto! A senhora sempre concorda com as coisas erradas que seu bibelô faz.

- Você me respeita, Roberta! O cartão é seu. Faça o que achar melhor. Não é meu nome. Estou em choque.

- A senhora tem razão. Eu sou muito idiota, de achar que tenho uma mãe justa. A senhora sempre defendendo seus preferidos e me ferrando. Deve ser difícil ter me gerado. Ela me dá um tapa no rosto. Meus irmãos ficaram assustados.

- Mãe! Não precisava agir assim! Vera tenta me consolar.

- Tira a mão de mim, princesa. Largo o prato e saio de casa. Caminho pelas ruas sem rumo. A um ano atrás iria para casa da minha avó, mas agora estou sentando no banco da praça.

Meu amor de gizOnde histórias criam vida. Descubra agora