🏠 Quem deveria amar

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Roberta Antunes

O elevador descia lentamente, aprisionando-nos em um espaço metálico que amplificava cada batida do meu coração. Diego e eu estávamos cara a cara, a tensão entre nós palpável como um raio prestes a cair.

Você não merece ser pai deles, Diego! Minha voz saiu mais alta do que pretendia, ecoando pelas paredes frias do elevador.

Eles me contaram tudo! Como ela os trancava no armário, afogava eles na banheira na hora do banho, apertava a garganta até desmaiarem...As palavras falharam na minha garganta, a imagem na minha mente vendo das minhas crianças sofrendo me sufocando.

Diego me olhou, os olhos arregalados de surpresa e culpa. Ele aperta o botão para o elevador.

- Roberta, calma. Eu sei que está chocada, mas...

- Calma?! Interrompi-o, a raiva me consumiu. Calma? Como você espera que esteja tranquila depois de saber que tudo que sua esposa fez com aquelas crianças ? Que você garantiu que não tinha acontecido? Ele aproxima seu corpo do meu.

- Mas isso preciso ouvir das crianças, porque nunca me relataram. Ele diz com rosto com raiva.

- Porque ela os ameaçava dizendo que se você ficasse sabendo, iria matá-lo, essa é a mulher que tanto defende. Ele vira rosto, coloca a mão na cabeça e grita:

- Juro que não sabia. Nunca permitiria que isso acontecesse com eles. Vira rosto para minha direção.

- Infelizmente permitiu. Vamos até sua casa para ouvir diretamente deles. Aperto o botão é libero o elevador.

O elevador voltou a se movimentar, mas nenhum de nós se moveu, ficamos nos olhando. As portas se abriram, revelando o corredor iluminado, mas para mim, era como se estivéssemos em um túnel escuro e sem fim.

Estamos caminhando juntos até o estacionamento. Eduardo está aguardando. Eu queria gritar, queria quebrar algo, queria que a dor que me consumia se dissipasse.

- Você está totalmente cego, senhor Ribas. Ele me olha.

- Roberta, não vou mais discutir, vamos para casa. Quero conversar com as crianças. Entro no carro.

Enquanto estou sentada no banco de trás. O Senhor Ribas está ao lado. Minha mente retornou algumas horas atrás.

Horas atrás...

O sol da tarde filtrava pelas folhas da velha árvore, pintando o gramado com manchas douradas. Sentada em um cobertor, rodeada por Caio e Elie, observava a felicidade nos rostos das minhas crianças, parece que os conheço a tanto tempo, que me dá o direito de referir-me dessa forma. Estávamos fazendo várias frutas e legumes, nossos dedos moldando a matéria-prima em formas fantásticas, as massinhas de várias cores. Elie acabou passando a mão suja na minha roupa. Arregalou os olhos e imediatamente se justificou.

- Betinha, me desculpa, minha massinha estava um pouco molhada. Eu aperto sua bochecha e respondo.

- Estamos brincando, vamos nos sujar, querida. Estava pensando que tal a gente brincar com argila, fazendo uma aula de cerâmica? Abro o sorriso.

- O que é cerâmica, Betinha? Caio pergunta enquanto tenta fazer uma moto com massinha azul.

- Hum, sabe as xícaras, pratos e aquele jarro que enfeita a mesa da sala, então são peças de cerâmicas. Para fazê-los usamos argila. Vocês topam?

- Eu aceito. Quero começar logo, Betinha. Caio respondeu. Elie diz.

- Vou ter que lavar as mãos várias vezes como Brigitte fez comigo no dia que sujei com massinha? Seus olhinhos estavam cheios de medo.

- Não, vamos nos limpar depois de usar a criatividade para produzir uma peça. Respondo sorrindo. Então com empolgação ela respondeu.

- Adoraria! - exclamou, batendo palmas toda suja de água e massinha rosa. A gente poderia fazer vasos, pratos, tudo do jeitinho que a gente quisesse!

A ideia os encantou. As crianças sempre demonstraram uma habilidade e interesse especial para a arte, e a cerâmica seria uma forma maravilhosa de estimular sua criatividade.

- É uma ótima ideia! - respondi, sorrindo. Vamos procurar um curso para vocês.

Enquanto misturávamos farinha com água, fazendo massinha caseira, Elie me olhou com um brilho estranho nos olhos.

- Betinha, sabe no dia que sujei o vestido de Brigitte, ela ficou muito brava e me fez lavar as mãos várias vezes, ela esfregava com escova de dente e apertava meus dedos e gritava: " garota estúpida".

Achei estranho ela voltar a falar sobre aquele episódio. Fico intrigada com a situação, resolve aguçar. Caio estava observando tudo em silêncio.

- Elie, porque você ficou muito tempo sem falar? Espero ouvir uma resposta que não seja abuso.

- Não fala! A bruxa vai ficar brava. Caio começa a fazer xixi na roupa.

- É segredo, ninguém pode saber se não a bruxa vai voltar e machucar o nosso pai. Estou assustada com a conversa. Caio corre e me abraça.

Não, ela vai ficar brava. Vai apertar meu pescoço e vai afogar a minha irmã na banheira. Meu coração está acelerado .

- Calma, Caio, ninguém vai machucar vocês, não vou permitir. Isso não é segredo. Precisamos contar para seu pai.

💭 Aquele homem garantiu que não foram agredidas.

- Eu tenho medo da Brigitte. Ela falou que vai cortar minha língua, machucar meu irmão e meu pai. Elie mordeu o lábio inferior.

- Ela afagou minha irmã várias vezes, enquanto dava banho na gente. Ela é muito malvada como uma bruxa. Caio tremia no meu colo.

Elie também me abraçou, estava molhada. As palavras ecoam em meus ouvidos como um trovão. Senti o mundo girar ao meu redor. A imagem da mulher que deveria amá-los e protegê-los, era um monstro cruel e calculista.

- Por que guardaram isso tudo para vocês? Porque não pediram ajuda?perguntei, as lágrimas brotando nos meus olhos.

- Por que ela dizia que iria matar nosso papai. Elie responde. Caio olhou nos meus olhos e tremendo seu corpo.

- Ela vai voltar, Betinha. Não conta, por favor. Digo olhando para eles.

Nada vai acontecer, vou proteger vocês, eu prometo!

Aquele dia, a felicidade que eu havia sentido no jardim se transformou em um profundo pesar. A descoberta dos segredos de Elie e Caio me fez perceber que havia vivido em uma mentira por muito tempo. A mulher em que eles deveriam confiar havia causado tanto sofrimento e trauma. E agora, eu precisava encontrar uma forma de protegê-las. Escuto a voz do senhor Ribas.

- Roberta! Saio do transe.

- Sim, estou ouvindo. Continuo olhando para a janela do carro.

- Não, me pareceu. Ele também olha para fora do veículo.

- Vai falar ou ficar resmungando? Diga logo, senhor Ribas. Ele olha para mim e eu para ele.

- Ela machucou muito eles? Neste momento, ele chora.

- Sim. Infelizmente machucou o corpo e o coração deles. Ele vira rosto para janela novamente.

Eduardo todo tempo olhava pelo retrovisor. Quando chegamos na residência Ribas. Encontramos as crianças na sala de Televisão. Diego entra afrouxando a gravata, as crianças ao perceber a presença do pai ficaram tensas, olharam para mim.

- Seu papai quer ouvir de vocês o segredo que me contaram mais cedo. Pode confiar, ele vai protegê-los. Vou deixá-los sozinhos.

Meu amor de gizOnde histórias criam vida. Descubra agora