Capítulo 8: O Veneno de Ameixa

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Maomao acordou com o chilrear dos pardais. Ela se sentou em sua cama simples, o odor característico de remédio sendo preparado picando seu nariz.

"Bom dia," disse uma voz calma de avó. Era de seu pai.

Está certo... estou de volta em casa, pensou ela. Esta era sua primeira viagem de volta desde que começou a trabalhar na corte externa. Normalmente, as servas em sua posição não tinham férias para falar. Claro que não: mesmo se seu amo tirasse um dia de folga do trabalho, não era como se ele parasse de viver sua vida. A maioria dessas pessoas tinha mais de um ou dois servos, deixando um pouco de margem para que um deles tirasse folga. Mas as coisas eram diferentes com Jinshi; ele tinha tão poucos atendentes.

Não acredito que ela tenha agüentado tanto tempo sozinha... Maomao só podia tirar o chapéu proverbial para a atendente de Jinshi, Suiren, cuja indulgência era a única razão pela qual ela havia conseguido tirar essa folga. Embora Maomao tenha pago por isso: pelo resto do tempo, Suiren a trabalhava implacavelmente.

Maomao saiu da cama e sentou-se em uma cadeira rude. Seu pai trouxe-lhe um pouco de mingau quente em uma tigela lascada. Ela tomou um gole: precisava de sal, mas seu pai pelo menos deu um bom sabor forte misturando algumas ervas perfumadas. Maomao adicionou algumas gotas de vinagre e mexeu.

"Lave o rosto", disse o pai.

"Sim, assim que eu comer."

Maomao continuou mexendo o mingau com a colher enquanto seu pai preparava os ingredientes para o remédio que ele estava misturando. "O que você planeja fazer hoje?" ele perguntou.

Maomao olhou para ele, quase confusa. "Nada de especial", disse ela.

"Nesse caso, talvez você pudesse ir até a Casa Verdete para mim."

Teve uma pausa antes de Maomao dizer: "Claro. Tudo bem." Ela adicionou outra pitada generosa de vinagre ao mingau.

A farmácia de seu pai ficava dentro da Casa Verdete, mas quando ele a pedia para "ir" lá, ele tinha outra coisa em mente. Quando Maomao chegou, ela cumprimentou o criado do lado de fora com um olá familiar e entrou. Passou pelo átrio elegante do hall de entrada, depois seguiu por uma passarela coberta para um lado. O pátio central era tão bom quanto o de qualquer mansão aristocrática, e à noite era iluminado por lanternas acesas. Era mantido em ordem suficiente para impressionar aqueles que ocasionalmente vinham tomar chá durante o dia.

Maomao não parou no pátio, porém, mas continuou até um pequeno anexo solitário. Este não era lugar para clientes. Uma vez lá dentro, o fedor de doença encheu suas narinas.

"Bom dia."

Uma mulher dormia lá dentro, o cabelo despenteado. Ela parecia um esqueleto particularmente desagradável.

"Eu trouxe seu remédio," Maomao continuou. A mulher, porém, não falou. Quase se poderia suspeitar que ela havia se esquecido há muito tempo. Ela costumava expulsar Maomao, aparentemente por puro ódio, mas nos últimos anos perdeu a energia até para isso.

Maomao foi até onde a mulher estava deitada indolentemente de costas e a ajudou a engolir o pó que trouxera. Era o que seu pai usava no lugar de mercúrio ou arsênico. Menos venenoso, ele disse, e mais eficaz, mas no momento nem mesmo servia para sedar a mulher. Ainda assim, eles não tinham outra maneira de tratá-la a não ser dar-lhe este pó.

A mulher sem nariz tinha quase quarenta anos agora, mas já havia sido celebrada como uma borboleta, festejada como uma flor. A Casa Verdete era um estabelecimento de prestígio suficiente para escolher seus clientes agora, mas nem sempre foi assim. Nos anos após o nascimento de Maomao, houve um tempo em que o lugar mal tinha mais do que uma placa salpicada de lama em seu nome. Foi nessa época que esta mulher era uma cortesã que atendia clientes e, para seu infortúnio, contraiu sífilis, conhecida na língua de Maomao como "Veneno da Ameixa".

Kusuriya no Hitorigoto - "The Apothecary Diaries"Onde histórias criam vida. Descubra agora