Eduardo - Capítulo 30

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"Sabe quando você está em um balanço e quando você chega lá em cima, você fecha os olhos e sente aquela coisa de estar nas nuvens, só que ai você acaba perdendo o controle e quando vê já caiu no chão e se machucou? Então, acordar para a realidade é a mesma coisa."


Eu estava segurando o choro, não queria demonstrar fraqueza. Meu pai estava acabado e meu tio não estava diferente. Estávamos esperando o avião que resolveu demorar mais do que o esperado, fazendo com que perguntas surgissem... Por que ele tinha que ir tão cedo? Ele tinha alguns problemas no coração mas por que Deus não o curou? Será que ele não merecia? Esse motivo não foi, porque ele merecia isso e muito mais. Passei onze anos da minha vida o tendo como pai e não que eu não goste do meu pai, pelo contrário, eu entendo que ele tinha que trabalhar para nos sustentar, mas foi o meu avô que esteve lá nas reuniões do colégio, foi ele quem me aconselhou quando tive minha primeira briga no colégio. Eu não sei lidar com essa parada de perder alguém. Meus pensamentos foram interrompidos quando senti alguns tapas em meu ombro.

- Ele merece paz, coisa que esse mundo não trás. - disse meu tio e por algum motivo o que ele disse me marcou.

- Mas não é fácil. - falei.

- Quem disse que seria? - perguntou e eu baixei a cabeça. - Ele era meu pai e sei que o considerava assim também, então estamos sentindo a mesma dor.

- Meu pai parece estar pior do que a gente. - falei estranhando.

- É porque ele não se dava muito bem com seu avô. - disse e eu entendi.

- Vou falar com ele. - avisei.

Me aproximei e seu rosto estava completamente transtornado, ele me olhou e baixou a cabeça.

- Relaxa, altos e baixos entre pai e filho a gente entende muito bem e sabemos que depois de cada briga, a mágoa não existe, só a vontade de fazer dar certo. - falei sem saber de onde aquelas palavras estavam surgindo.

- É, filho... mas a vontade continuou sendo apenas vontade. - disse e seus olhos lacrimejaram.

Eu não tinha mais ideia do que falar, então o abracei e nunca havia sentido meu pai tão perto como estava sentindo naquele momento. Choramos igual duas crianças.

- Maricas. - disse, meu tio e o encaramos.

- Olha só quem fala, está há mais de semanas com a gata da minha sogra e até agora, nada! - falei zombando e ele ficou sério.

- Ela acabou de perder o marido. - disse.

- Isso não é desculpa, é ai que você tem que chegar e fazer a diferença. - disse meu pai piscando e eu o olhei, rimos.

- Continuam sendo maricas. - disse afinando a voz e eu ri.

Eu sabia o porquê ele estava fazendo isso, sempre foi o palhaço da família e nunca admitiu que alguém chorasse por muito tempo. Anunciaram o nosso vôo, joguei a mochila nas costas e embarcamos. Tanta coisa se passou pela minha cabeça nas 4h33min de vôo. Uma parte de mim parecia se fortalecer ao lembrar que eu tinha uma namorada me esperando e a outra se enfraquecia por saber que outras percas viriam. Nunca fui de sofrer antecipadamente, mas quando se perde pela primeira vez, já tem que ficar atento para a segunda.

Chegamos ao nosso destino. Goiânia. Pegamos um táxi rapidamente e depois, 15min a pé, já que estávamos sem carro e táxi nenhum passaria naquela estrada. Era o sítio onde meu avô passou a vida toda. Aquele lugar nunca pareceu tão sem vida, foi então que cheguei a conclusão de que era o meu avô quem dava vida para aquele lugar.

Entramos e havia uma enfermeira preparando uma dose de remédio. Pensei um pouco antes de entrar, quando meu pai passou por mim e pousou sua mão sobre meu ombro.

- Preciso que entre comigo. - pediu.

- Vamos. - falei tentando ter força por nós dois.

Entramos e ele estava acordado, a TV ligada no canal de cultura. Me aproximei e beijei sua cabeça que continha alguns fios brancos, seu rosto estava palido e sua estatura estava mais magra que o normal.

- Vô. - falei e seus olhos já estavam marejados.

- Filho. - disse fazendo sinal e eu me agachei. - Não fraqueje agora.

- Como não? - perguntei e ele segurava minha mão com o restante de forças que lhe restou.

- sempre disse que é marmanjo forte e essa é a hora de provar isso. - disse e deu uma gargalhada.

Será que ele não sabia que estava morrendo? Pois seu bom humor continuava o mesmo.

- Não me olhe assim, eu sei que partirei e é por isso que quero que seja forte. - disse e um sorriso surgiu em meus lábios.

- Como consegue ser tão forte? - perguntei.

- Porque desde novinho sou marmanjo forte assim, que nem . - disse e nós rimos.

- Você continua tão bem. - falei.

- E ficarei ainda mió, creio em Deus e tinha que crê também. - disse e eu concordei.

- Eu te amo, vô e você parte desse mundo, mas não parte do meu coração. - falei e o vi segurar as lágrimas.

- O vô também te ama, mas não seja tão marica. - disse e eu ri.

- Qual é, sou marmanjo forte! - exclamei e nós rimos.

- Cuide bem de dona Gabriela. - disse e eu assenti.

- Pode deixar. - falei e lhe dei outro beijo na cabeça.

- Você vai longe, filho, guarde bem isso! - disse sorrindo.

Meu pai se aproximou e eu me retirei, tinha que deixar eles terem esse momento de pai e filho. Fiquei sentado no sofá e aquele lugar parecia receber um outro tipo de brilho, acho que por meu avô estar tão bem, o lugar também ficou. Observei a sala que continha porta-retrato em todos os cantos, inclusive quadros nas paredes com fotos minhas e de Gabriela. Nós o consideramos pai porque ele nos considerou filhos primeiro. Vi meu tio entrar e os três ficaram por um bom tempo. Vi meu pai sair chorando, o olhei e entendi o que havia acontecido. Deus o levou.


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