A luz do sol atravessou as cortinas brancas do apartamento e caiu em cheio nos olhos fechados de Sophia Manning. Ela gemeu, incomodada, e apertou as pálpebras com força para espantar a brancura intrusa, saindo aos poucos do sono. Estava dormindo no chão, em cima de um lençol e coberta por outro, nua da cabeça aos pés, com o piso duro e frio debaixo de si. Não sabia direito como adormecera ali, mas sentia a ressaca de todas as ressacas se instalar em sua cabeça, o gosto de álcool e cigarros enchendo-lhe a boca.
Barulhos vinham da cozinha, o que fez com que Sophia despertasse de vez, apreensiva. Uma ruiva alta e bonita, não usando nada além de uma calcinha de renda vermelha que combinava de uma maneira engraçada com a cor dos seus cabelos, mexia na cafeteira. Sophia estudou-a por uns bons segundos.
- Oi – chamou. Foi monossilábica porque não fazia ideia do nome da garota.
A ruiva voltou para Sophia grandes olhos verdes que serviam para duas coisas: conquistar e quebrar corações. Então lhe deu um sorriso.
- Oi. Dormiu bem?
Sophia murmurou uma concordância e cobriu o rosto com o braço direito, tentando afastar a luz do sol.
- Fiz café – disse a ruiva. – Espero que não se importe.
- Tudo bem – respondeu Sophia. – Desde que você traga um pouco para mim.
A garota sentou-se ao lado dela no chão e estendeu-lhe uma xícara, ainda sorrindo. O cheiro era delicioso. Sophia jogou o lençol de lado e sentou-se também, aceitando o café com um agradecimento. Um bom e longo gole bastou para que sua cabeça começasse a doer um pouco menos.
- Valeu – disse.
- Não precisa agradecer, o café é seu – disse a ruiva. – Foi uma noite divertida, não foi?
Sophia não se lembrava de absolutamente nada da noite, embora não precisasse ser nenhum gênio para entender o que acontecera ali. Mesmo assim, concordou:
- Uhum – fez, e estalou um beijo nos lábios da ruiva. – Com certeza, gata.
Parecendo meio sem graça, a ruiva bebericou o café.
- Você não lembra meu nome, lembra?
Não, Sophia nem imaginava, mas puxou o nome da cabeça da ruiva. Era como pescar com o pensamento.
- É claro que lembro, Melanie – disse Sophia, aprovando a sonoridade daquilo: era um nome que combinava com a ruiva.
- Ora – o sorriso cheio de dentes brancos da ruiva aumentou. – Você lembra mesmo.
- Você tem um nome com seu gosto – disse Sophia, espiando a garota pela borda da xícara de café. – Um nome doce.
Melanie cobriu a mão dela com a sua. Sophia não a afastou, mas também não entrelaçou os dedos com os da ruiva. Ela era linda de morrer e parecia ser bem legal, inteligente e tudo mais, mas Sophia realmente desejava que Melanie fosse embora – não costumava levar gente para casa e já começava a sentir falta da solidão acolhedora, sagrada e segura de seu apartamento.
Enquanto conversavam, tomando o restante do café, Sophia lembrou-se um pouco do que acontecera: era sexta-feira, ela decidira que precisava de uma folga depois de uma semana particularmente estressante na Academia, e saíra para uma das muitas casas noturnas de Boston, onde vivia em seu pequeno – porém bonito – apartamento. E então, dada à dor de cabeça que sentia, decidira beber o bar inteiro. Se Chapman soubesse, Sophia tomaria dele a comida de rabo do século, mas, ora, o que poderia ser pior do que aquela ressaca?
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A Voz da Escuridão.
Paranormal[Obra registrada na Biblioteca Nacional.] Um garoto de 8 anos é sequestrado e morto na pequena cidade de Fallpound, no interior dos Estados Unidos: o primeiro de uma série de assassinatos que assolou a região em 2009, cometida por uma seita satâ...