Um mês depois, Sophia estava sentada outra vez na cozinha, enquanto Josh usava uma pequena serrinha circular que trouxera da oficina para cortar o gesso em seu braço esquerdo. Quando terminou, ele pediu para que a garota mexesse o membro.
- Dói?
Não doía, embora parecesse haver mais gesso dentro do seu braço. Os músculos e tendões estavam tão duros que Sophia sequer conseguia esticar o cotovelo. Ela moveu o ombro em pequenos círculos.
- Não está doendo – ela disse. – Mas não dá para mover o braço.
- Não é pra menos – disse Josh. Ele estava ajoelhado à frente dela e se levantou, colocando as mãos na cintura. – Você ficou um mês com o braço imobilizado. Vai demorar um pouco até o movimento voltar. Pelo menos ele não ficou torto.
Sophia encarou-o.
- Havia alguma chance do meu braço ficar torto?
- Pouca. Nada considerável.
- Nada considerável?
- É – ele torceu a boca. – Já consertei coisa pior durante o meu tempo no Exército, Fran. Não se preocupe: seu braço vai ficar bom.
Ela mexeu devagar os dedos. Sua mão parecia estranhamente desacoplada de seu braço endurecido. Quase um membro fantasma.
- Se voltar a doer, me avise – Josh disse. – Vou deixar que a Lizzy retire suas ataduras. Sabe como fazer isso, não sabe, garota?
E Lizzy, cuja barriga crescera de modo assustador nos últimos 30 dias, desencostou-se da pia e empurrou o pai para fora da cozinha.
- Claro que sei. Deixe as meninas a sós, papa.
Josh saiu do cômodo com um resmungo, indo para a sala, e Lizzy fechou a porta da cozinha antes de voltar-se para Sophia.
- Não está com medo, está? Meu pai me ensinou bem – disse Lizzy.
- Não estou com medo – Sophia arrancou a blusa, ficando nua da cintura para cima. Todo o seu dorso estava envolvido por ataduras brancas e limpas.
- Ainda bem, porque não precisa. Nós tínhamos um cachorrinho há alguns anos. Ele se chamava Jack, como no filme O Estranho Mundo de Jack, sabe. Dei esse nome para ele porque eu o ganhei no Natal, de presente do meu pai. Um dia, ele foi atacado por um gato selvagem e quase morreu. Ficou cheio desses cortes medonhos por todo o corpo. Papai me ensinou a cuidar dele. Tenho experiência.
Bom, agora Sophia estava com medo. Não é porque você cuidou da porra de um cachorro que vai saber o que fazer na hora de cuidar de uma pessoa, mas ficou calada enquanto Lizzy desenrolava as ataduras que a envolviam.
- Erga os braços – Lizzy pediu.
Ela ergueu, e Lizzy terminou de tirar as ataduras, depois ficou parada atrás de Sophia, observando suas costas. Sophia escutava a língua da garota estalar, e estremeceu quando um dedo frio encostou na pele entre suas omoplatas. Lizzy subiu e desceu devagar com as mãos, indo da base da coluna até o ombro direito de Sophia.
- Meu Deus, isso foi bem feio – ela comentou.
Sophia lembrou-se do lobo negro e cego de um olho saltando em cima dela, as presas amarelas à mostra e as garras prontas para retalhar.
- Foi – ela disse. – E então? Como está?
- Está seco. E com casquinha. Vou retirar os pontos, mas você vai ficar com uma bela cicatriz. Bom, com mais uma cicatriz. Você tem outra bem aqui – Lizzy tocou a pele dura que marcava o lugar onde Abukcheech golpeara Sophia com a adaga. – Você foi... esfaqueada?
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Voz da Escuridão.
Paranormal[Obra registrada na Biblioteca Nacional.] Um garoto de 8 anos é sequestrado e morto na pequena cidade de Fallpound, no interior dos Estados Unidos: o primeiro de uma série de assassinatos que assolou a região em 2009, cometida por uma seita satâ...